Paisagens de praias e florestas, closes do cachorro de estimação, detalhes do prato servido no restaurante e flagrantes dos amigos em acampamentos. Tudo devidamente embalado em filtros para tornar as imagens mais intimistas. O perfil no Instagram de Mike Krieger, morador de San Francisco, na California (EUA), dá uma inevitável sensação de déjà-vu. Ele poderia até passar por apenas um usuário a mais da rede social, não fosse um dos próprios criadores do aplicativo que já reúne mais de 300 milhões de pessoas. Outro “detalhe”: o verdadeiro nome de Mike é Michel.
O fato do co-fundador do Instagram ser brasileiro e ter passado a juventude em São Paulo ainda é ignorado por muitos de seus conterrâneos e até por colegas próximos e companheiros de trabalho no campus do Facebook no Vale do Silício – o seu ambiente profissional desde abril de 2012, quando o “Insta” (como é chamado pelos íntimos) foi comprado por Mark Zuckerberg pela bagatela de US$ 1 bilhão.
Ficha
O Clique de 1 Bilhão de Dólares, de Filipe Vilicic
Editora Intrínseca, 240 páginas
R$ 39,90
A trajetória de Michel é contada com detalhes em um livro recém-lançado no Brasil pela editora Intrínseca. O Clique de 1 Bilhão de Dólares, do jornalista Filipe Vilicic, editor de Tecnologia, Vida Digital, Ciência e Ambiente da revista Veja, mostra como o brasileiro virou Mike e, ao lado do amigo Kevin Systrom, criou um negócio que em apenas um ano e meio transformou seus dois fundadores em jovens milionários.
A história da gestação, nascimento e emancipação (entenda-se venda) do Instagram não sofre, diga-se de passagem, das mesmas reviravoltas, conspirações, brigas e casos mal resolvidos de outras empresas de tecnologia que também foram esmiuçadas em livros, como Bilionários por Acaso, de Ben Mezrich (que retrata o surgimento do Facebook), A Eclosão do Twitter, de Nick Bilton, e Steve Jobs, A Biografia, de Walter Isaacson. Falta drama na trajetória do aplicativo, mas sobra oportunismo – no bom sentido.
Filhos do Vale
Michel e Kevin tiveram a sorte de estar no lugar certo, na hora certo e pelos motivos certos. O lugar era o Vale do Silício, mais especificamente a prestigiada Universidade de Stanford, onde ambos estudaram, embora em anos diferentes – e local em que Michel estrategicamente virou Mike, para se aproximar dos novos amigos americanos e evitar confusão com o nome (em inglês, seu nome de batismo soa igual ao feminino “Michelle”).
Geograficamente, a dupla estava no centro de um ecossistema de inovação e empreendedorismo recheado de investidores de alto risco em busca da próxima grande novidade – poucos anos antes haviam surgido por ali empresas como o Facebook e o Twitter. Um dos grandes trunfos de O Clique de 1 Bilhão de Dólares é dedicar muitas páginas para discutir e detalhar o modus operandi do Vale, suas contradições e oportunidades, bem como o efeito quase sobrenatural que desperta em seus jovens moradores startupeiros.
Parecia muito. Não era
A disposição de Mark Zuckerberg em desembolsar US$ 1 bilhão pelo Instagram, em abril de 2012, deixou muita gente intrigada e até apostando que se tratava de um tiro no pé – até porque o aplicativo, apesar de popular, não tinha um modelo de negócios definido e não gerava renda.
Vários analistas e investidores acreditaram que o Instagram havia sido supervalorizado. O valor vultuoso, porém, acabaria sendo pouco perto de outro negócio do Facebook anunciado nem dois anos depois: a compra do aplicativo de mensagens WhatsApp por US$ 16 bilhões (o preço final acabou subindo após o processo de aquisição para US$ 22 bilhões).
A soma, como seria de se esperar, voltou a gerar desconfiança e até falas de que haveria uma “bolha das startups” prestes a estourar. Por enquanto, tanto comprador quanto comprado seguem bem de vida.
Afinal, foi justamente o apetite e abertura de investidores que proporcionou a Kevin, com somente uma ideia na cabeça e o protótipo de um programa de geolocalização criado em HTML 5 (linguagem usada para desenvolver sites), conseguir angariar, durante uma festa em San Francisco, meio milhão de dólares para desenvolver seu projeto. Na época (era início de 2010), o programa ainda era chamado de Burbn e guardava pouca – ou quase nenhuma – similaridade com o que viria a ser o Instagram.
A união
Foi um dos investidores iniciais que recomendou a Kevin que ele encontrasse um sócio para desenvolver o negócio. Ele procurou então, o brasileiro Mike, de 24 anos, que havia conhecido por meio de amigos em comum. O paulistano e egresso de Stanford trabalhava na época na Meebo, uma startup que oferecia um serviço de troca de mensagens instantâneas.
Em um trecho do livro, Vilicic sintetiza bem a dinâmica que envolvia a dupla no início e acabou por se manter ao longo da trajetória da empresa. “Mike tinha o perfil ideal para ser o sócio. Ele e Kevin se completavam em competências. Enquanto o americano era bom de negócios, falava bem sobre o produto, vinha com a ideia e com a grana dos investidores, o brasileiro solucionava os problemas técnicos e de design (...) Mike tinha talento e experiência em design e programação. Não como um segundo trabalho, um quase hobby de fim de semana, como era com Kevin. Ele fazia isso no seu dia a dia. E era bom”, escreve.
Agora trabalhando em conjunto, Kevin e Mike passaram a bater a cabeça para viabilizar o Burbn, que até então funcionava como um programa de compartilhamento de fotos, mensagens e check-ins – funcionalidades que, na típica velocidade do Vale, já estavam virando coisa do passado, por conta do popular aplicativo Foursquare. O projeto passou por uma espécie de reboot, focado no compartilhamento de fotos e a utilização de filtros de imagem.
Em outubro de 2010 nascia, então, exclusivo para iPhones, o Instagram – somente no primeiro dia no ar, 25 mil pessoas se cadastraram no aplicativo. Dois meses em depois, em dezembro, já eram 1 milhão de usuários, marca que, como bem lembra Filicic no livro, o Facebook demorou dez meses para conseguir e o Twitter, dois anos. Seja agindo de forma defensiva ou reconhecendo o potencial do app, Mark Zuckerberg fez o lance que, até então, qualquer pessoa, incluindo os próprios fundadores do Instagram, achava impensável. O Vale do Silício – e o mundo como um todo – inicia uma nova era, a das startups bilionárias.
Startup dream
O Clique de 1 Bilhão de Dólares dá ênfase especial a todo o processo de negociação para a venda do Instagram para o Facebook. Do US$ 1 bilhão, Kevin ficou com 40% e o brasileiro Mike, com 10%, ou US$ 100 milhões – o equivalente a um salário mensal de US$ 5,5 milhões, considerando os 18 meses desde o lançamento do aplicativo.
Mais de três anos depois da venda, o Instagram continua totalmente gratuito para os usuários, embora já estampe anúncios em sua timeline. Segue crescendo e angariando fotógrafos profissionais e amadores. Por dia, são publicadas no app uma média de 70 milhões de fotos, que conquistam nada menos do que 2,5 bilhões de likes a cada 24 horas.
Os dois fundadores continuam à frente da empresa, embora sob a batuta do todo poderoso Zuckerberg. E Mike (ou Michel) segue postando fotos em seu perfil no Instagram. A última imagem, publicada há um dia, mostra um típico entardecer visto de uma colina, com nuvens em tom de vermelho. A legenda: “Sky looks surreal tonight”.
Boicote do agro ameaça abastecimento do Carrefour; bares e restaurantes aderem ao protesto
Cidade dos ricos visitada por Elon Musk no Brasil aposta em locações residenciais
Doações dos EUA para o Fundo Amazônia frustram expectativas e afetam política ambiental de Lula
Painéis solares no telhado: distribuidoras recusam conexão de 25% dos novos sistemas
Reforma tributária promete simplificar impostos, mas Congresso tem nós a desatar
Índia cresce mais que a China: será a nova locomotiva do mundo?
Lula quer resgatar velha Petrobras para tocar projetos de interesse do governo
O que esperar do futuro da Petrobras nas mãos da nova presidente; ouça o podcast