O deputado federal Abelardo Lupion (PFL-PR), que há pouco menos de um mês assumiu a presidência da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento Rural da Câmara dos Deputados, não vê outra saída para a agricultura brasileira que não seja a recuperação do dólar. "Não é de dinheiro que precisamos, mas de dólar competitivo, de preço e de respeito." Na avaliação do parlamentar, o agronegócio do país vive a pior crise dos últimos 40 anos.
Gazeta do Povo Qual sua avaliação sobre o momento díficil enfrentado pelo agronegócio no Brasil?
Abelardo Lupion Estamos passando a maior crise dos últimos 40 anos. É uma situação que não foi criada pelo setor, mas que veio em decorrência de uma política econômica equivocada, onde adotou-se um modelo importador, a exemplo do Japão, esquecendo-se que a vocação do país é de exportador. Tivemos sucesso durante muitos anos em função de um superávit primário, sustentado porque havia um câmbio que nos possibilitava ser competitivos. O que acontece, agora, com essa derrubada do dólar, é que o Brasil virou a Disneylândia dos banqueiros. Hoje o pessoal empresta dinheiro lá fora a 4% ao ano e vem aqui aplicar a 18%, 20% ao ano. Virou um país de agiota. O que nós precisamos, então, é solucionar o problema do câmbio. Sem isso não vamos ter competitividade.
Qual a sua expectativa com a mudança no Ministério da Fazenda, com a saída de Antônio Palocci e a entrada de Guido Mantega? O senhor acredita numa recuperação do dólar?
Não. A mediocridade da política econômica do Brasil vai permanecer. Não acredito que eles tenham a coragem de mexer no dólar, sob pena de perderem completamente o controle da inflação. Eles não têm coragem de fazer os grandes acordos internacionais que precisam ser feitos, para que o Brasil deixe de receber esse capital nocivo que é o do empréstimo , e traga o capital para investimento. Mas não acredito que a mediocridade dos novos ministros irá possibilitar que haja qualquer tipo de mudança.
Nesse contexto de crise, sem perspectiva de mudança no curto prazo, em especial na relação cambial, como o produtor deve proceder?
A única solução para nós chama-se urna. Precisamos eleger alguém que respeite o setor e que no ano que vem faça o que precisa ser feito para que o Brasil volte a ser o grande país exportador de produtos primários do mundo, que é a nossa vocação. E alguém que faça com que o investimento no setor de agregação de valor, como a indústria rural, possa vir a acontecer. O país poderia ter mais 200 indústrias de álcool, milhares de indústrias de beneficiamento de produtos primários e podemos ser a capital do mundo em biodiesel. Temos essa vocação e seria um crime não aproveitar o momento pelo qual passam esses segmentos, para nos impor como o grande país de energia e de alimentos do mundo.
O problema do Brasil está na falta de uma política agrícola que atenda aos interesses do campo, ou na falta de recursos para executar essa política?
Se tivéssemos política agrícola, logicamente que ancorada numa política econômica, nem dinheiro precisaríamos. O setor está maduro, evoluiu muito, está com maioridade e pode fazer com que as empresas que precisam do produtor primário financiem a atividade. A venda da soja verde, do milho verde, ou seja, no mercado futuro virou uma realidade no Brasil. A venda do boi, do frango e do porco, isso também é uma realidade. Isso significa que o produtor pode se autofinanciar. Temos cooperativas e empresas fortes, e não é de dinheiro que precisamos, mas de dólar competitivo, de preço e de respeito.
O pacote agrícola anunciado pelo governo (início de março), para socorrer os produtores, resolve o problema no campo?
É só para prorrogar parte do problema. Mesmo porque, o pacote agrícola não mexeu no Funcafé e não contemplou aqueles que têm Pesa (Programa Especial de Saneamento de Ativos) e secuciritização, que são as grandes dívidas. Isso quer dizer que o produtor vai continuar tendo problemas. Esse pacote só resolve para os adimplentes, aqueles que estão em dia com os bancos. Mas a grande demanda, praticamente 70% da dívida do setor, não é com os bancos, mas com fornecedores, empresas de adubos, defensivos, de máquinas e equipamentos. Então, precisamos ter uma política agrícola condizente com nossa realidade e uma política econômica que respeite o produtor no quesito dólar, para que seja possível voltar a exportar.
Diante desse quadro, na sua gestão quais são as prioridades da Comissão de Agricultura?
Estamos fazendo uma radiografia de todos os segmentos da agricultura e da pecuária e chamando as associações que representam os setores para fazer um levantamento dos problemas e soluções ao produtor. Vamos tirar um grande documento e levar aos candidatos à Presidência da República. Queremos que eles assumam um compromisso com o setor rural brasileiro. Os candidatos terão que assinar um documento para que tenham o apoio da classe. Estamos discutindo nossa sobrevivência e, assim, só podemos trabalhar com aqueles que respeitem aquilo que fazemos.