Em épocas de endividamento em alta, qualquer chance de conseguir um acordo vantajoso ganha ares de luz no fim do túnel para o consumidor. É preciso, porém, cuidado com negociadores de dívidas. Esse mercado cresceu na medida das inquietações dos consumidores nos últimos anos, e se tornou mais complexo: há advogados, cobradores, contadores e consultores oferecendo todo tipo de solução.
A cautela se explica. Há basicamente duas formas de terceiros oferecerem negociação de dívidas: via ação judicial (se houver como comprovar que juros cobrados são abusivos) ou por procuração, para o profissional intermediar o assunto com o credor. Ambos os casos pedem que dados sigilosos sejam compartilhados e não têm garantia de sucesso, apesar do que alardeiam folhetos, sites e cartazes em postes.
Antes, é preciso entender que dívidas simples podem ser resolvidas pessoalmente ou durante oportunidades como mutirões de crédito. "Para quem tem dívidas pequenas (de R$ 500, R$ 1 mil), a recomendação é tentar fazer sozinho para não ter custo extra", explica Miguel Oliveira, diretor-executivo da Associação Nacional de Executivos de Finanças (Anefac).
O intermediador é uma opção para tentar solucionar dívidas complexas que envolvem financiamentos longos, por exemplo. Também pode ser útil no caso de o devedor se sentir inseguro sobre seus direitos. Mesmo assim, o consumidor precisa estar ciente da atuação do negociador, se certificando de resultados anteriores conseguidos por ele e exigindo um contrato detalhado.
O especialista em finanças pessoais Emerson Fabris acredita que as ações sejam o serviço mais comumente oferecido. Independente das promessas, o mais aconselhável é evitar a alternativa. "Pagar adiantado à espera de um serviço é sempre complicado. Você paga esperando por uma decisão que só sairá talvez nos próximos anos", alerta.
Intermediação
A Associação Brasileira do Consumidor (ABC), com sede em São Paulo, é uma entidade que negocia dívidas há cerca de 20 anos, cobrando taxa de R$ 100 para negociação por procuração. O educador financeiro Marcelo Segredo avalia que o mercado está mais competitivo e tem armadilhas a serem evitadas. "Acho muito temerário fazer uma negociação apenas pela internet, por exemplo, sem ter certeza do CNPJ da empresa e sem contrato."
Segredo estima que a ABC recebe cerca de 40 pedidos de clientes por mês. Nem todos são aceitos. "Tem casos em que você bate o olho na fatura e já sabe que não pode ajudar o consumidor como ele quer", diz. O filtro é necessário, afirma, porque a negociação é uma atividade delicada, em que a reputação vale muito. "Quando chego a um banco com propostas incoerentes, posso fechar as minhas portas."
Solução em grupo
Tentar negociar em grupo é melhor? A pergunta divide opiniões. Para o diretor da Anefac Miguel Oliveira, mesmo se o negociador representar um grupo de clientes perante o credor, as propostas levarão em conta apenas a situação de cada devedor. Já Miguel Segredo, da ABC, concorda que a análise individual é definitiva, mas defende que a negociação coletiva exerce maior pressão. "A empresa sabe que se o grupo não encontrar solução, está bem informado e pode processá-lo. E isso gera custos para o credor", diz.
Estratégia online
Startup gaúcha oferece cobrança em que cliente faz proposta
Desde janeiro o site PapaDívidas oferece um serviço de cobrança que segue o ponto de vista da clientela, segundo afirma Marlon Alves, um dos seus criadores. A ideia é que os consumidores que devem para as empresas parceiras da iniciativa até agora, três informem pelo site as condições de pagamento a que estariam dispostos.
O serviço é gratuito, uma vez que a taxa é paga pelas empresas. Para se cadastrar no site, o devedor precisa informar dados pessoais (como CPF) e listar as dívidas em detalhes. Já são 1,2 mil usuários. A proposta é reunir um grupo de devedores para que as empresas possam oferecer condições especiais. Ainda assim, não há garantia de acordo; o cliente recebe a contraproposta e pode aceitá-la ou não.
O desafio da startup com sede em Porto Alegre tem sido aumentar o leque de parceiros. Bancos e varejistas mais tradicionais ainda se mostram reticentes ou inacessíveis. "A estrutura das empresas é muito hierárquica", conta Alves. Por enquanto, a estimativa é de que o site tenha conseguido fechar 140 acordos.