Eleita pelo LinkedIn em 2017 como a sétima empresa onde os brasileiros mais sonham em trabalhar, a Totvs foi a única do setor de tecnologia da informação (TI) e uma das quatro do Brasil a figurar em um ranking global de inovação feito pela consultoria britânica PwC, no fim de 2017, com as mil companhias de capital aberto mais inovadoras do mundo — as outras três nacionais foram Embraer, Petrobras e Vale.
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O reconhecimento, segundo a empresa, é fruto de um forte investimento na área de pesquisa e desenvolvimento (P&D), que, nos últimos cinco anos, já ultrapassou R$ 1,2 bilhão. O montante destinado ao setor de P&D na Totvs varia entre 11% e 14% da receita líquida anual, valor que, em 2016, chegou à casa dos R$ 326,5 milhões, considerando uma receita total de mais de R$ 2,2 bilhões.
Para alcançar números tão expressivos, a Totvs destaca os seus 15 centros de pesquisa, sendo dez no Brasil e cinco no exterior (Estados Unidos, México, Taiwan e Rússia); seus mais de 30 mil clientes em 41 países; e a realização de parcerias com universidades, institutos de pesquisa e incubadoras, que possibilitaram 89 patentes e 110 registros de software em seus 35 anos de fundação —13 deles sob a marca Totvs.
A companhia reúne mais de 10 mil colaboradores em unidades próprias e franquias no Brasil e no exterior. Os cerca de 7.600 funcionários diretos são conhecidos internamente como “totvers” e 40% deles trabalham na nova sede inaugurada em abril de 2017 na capital paulista. A Totvs atende hoje clientes de 11 segmentos, como varejo, agroindústria, construção e projetos, distribuição, logística, jurídico, manufatura, educacional, saúde (gestão hospitalar), serviços e serviços financeiros. Entre seus clientes famosos estão O Boticário, Água de Cheiro, Havanna, Cachaçaria Água Doce, Quiosque Chopp Brahma e Hospital do Coração (HCor).
Em visita à sede da empresa em São Paulo, onde há mais de 120 salas de reunião em dois blocos de prédios no melhor “estilo Google”, chama a atenção o ambiente altamente tecnológico. A catraca da portaria só libera com um QR code e a presença do funcionário que autorizou a entrada da pessoa. Cada andar também tem uma cor e um tema diferente: filmes, pontos turísticos, brincadeiras infantis, estrelas — tudo sugerido pelos totvers. Para contrastar com tanta inovação e modernidade, nos nomes de projetos e no da própria companhia (que significa “tudo” ou "todos” em latim) há várias referências ao mundo e à mitologia greco-romanos.
Inovação que faça sentido
A Totvs ressalta que se preocupa em inovar, mas oferecendo sempre algo que faça sentido às pessoas. “Precisamos conhecer e entender os clientes, saber quais são exatamente seus problemas e necessidades. Para isso, vamos às ruas entrevistar pessoas, coletamos dados, fazemos pesquisas de mercado”, explica Gustavo Oliveira, gerente do UX Lab, a área de design e inovação da Totvs. Ele trabalha há mais de oito anos na empresa e tem formação em design multimídia e desenvolvimento de jogos digitais.
Antes de pensar em sistema, portanto, os totvers buscam soluções. Cada projeto realizado no UX Lab pode durar até dois meses, mas a maioria é concluída em apenas 15 dias. “Se algum deles é muito grande, dividimos em partes menores para entregar mais rápido os resultados ao cliente, que assim vê que o negócio está fluindo”, afirma. Pouco antes do Natal de 2017, a área tocava dez projetos simultaneamente e já havia entregue 82 no ano.
Os times, formados normalmente por até quatro pessoas, mas que podem chegar a 20 dependendo da complexidade do trabalho, reúnem colaboradores de várias áreas, com diferentes habilidades. “Trazemos pessoas que possam agregar conhecimento, como analistas financeiros, de dados, de negócios, gente de business, de saúde, do varejo. Ao juntarmos designers, engenheiros, administradores, economistas e até dentistas, tudo é possível, temos ideias malucas — cerca de uma por minuto quando fazemos brainstorming”, explica Oliveira.
Do primeiro insight à implantação, um projeto ganha até 30 protótipos e fica pronto em um prazo de dois a três meses, no caso do varejo. Já na área da saúde, o processo é um pouco mais lento, por conta da legislação específica. Até que uma proposta vire realidade, são envolvidos em cada iniciativa, além dos funcionários, os clientes, os clientes dos clientes e os consumidores finais.
“Ouvimos continuamente todos os que serão impactados por determinado serviço ou tecnologia. Os clientes vêm à empresa para ver e validar os protótipos. Já idosos, por exemplo, dão ideias ligadas à saúde, e às vezes as soluções sugeridas por eles são muito mais simples do que havíamos pensado”, diz o chefe do UX Lab.
Investimentos no Vale do Silício
É na região do Vale do Silício, na Califórnia (EUA), onde estão as principais empresas de tecnologia do mundo como Apple, Google e Facebook, que a Totvs fundou em 2012 seu centro de inovação, o Totvs Labs.
O local é focado em novos modelos de negócio, áreas e conceitos modernos como computação em nuvem, big data, blockchain, aplicativos para celular, robótica, inteligência artificial (IA), machine learning, experiência do usuário, impressão 3D e realidades virtual e aumentada. No ano passado, o Labs lançou a plataforma de dados e IA Carol, que também funciona como uma assistente virtual, respondendo perguntas e sugerindo ideias.
“Quando fundamos esse centro, a cotação do dólar estava em R$ 2; no ano passado chegou a R$ 4. Mas o investimento da Totvs em P&D é de longo prazo, muito consistente mesmo em momentos de crise. E a gente vem se destacando por isso”, avalia o diretor do Totvs Labs na cidade de Mountain View, o brasileiro formado em sistemas de informação Vicente Goetten. Segundo ele, que coordena cerca de 20 pessoas, a indústria de softwares é altamente dinâmica e competitiva, por isso é preciso investir continuamente, ser criativo e se movimentar rápido. “Esta é uma grande vantagem do brasileiro: conseguimos nos adaptar rapidamente nos momentos de adversidade”, reconhece.
Goetten aponta também que o mercado não compra mais soluções “baunilha”, que são uniformes e servem para todo mundo. “Uma escola não funciona igual a uma fábrica ou a um hospital. Então a forma de atender, vender e implantar um projeto deve ser diferente em cada caso”, afirma. Ele destaca, ainda, que a Totvs tem vários centros de inovação, não apenas o Labs. “Democratizamos o processo de inovação, que não está presente em apenas uma área, mas pulverizada em todos os times. E este é o nosso grande segredo: inovar na empresa inteira, no atendimento, no suporte, nos processos, e não somente na criação de novo produtos”, analisa.
É por causa desse conceito de inovação aberta que a Totvs resolveu instalar-se no Vale do Silício, a fim de identificar potenciais players e startups para novas parcerias e investimentos. Em 2012, diz Goetten, a companhia foi a primeira brasileira a investir em capital de risco na região, o que mostra o pioneirismo dela, de pensar sempre à frente e no longo prazo, diz o executivo.
“O tempo todo ficamos de olho nas tecnologias que devem causar rupturas num futuro próximo e no médio prazo. Para os norte-americanos, nós da América Latina também somos um mercado interessante, por isso temos uma dezena de parceiros por aqui. Investimos, por exemplo, em uma empresa de dados na nuvem chamada GoodData, que tem ainda investidores do Facebook e do Snapchat”, conta.
O chefe do Totvs Labs acredita que tudo melhora quando se aplicam design nos produtos e empatia no relacionamento com os clientes, e acrescenta que a empresa quer democratizar o acesso a dados e à inteligência artificial em 2018. “Logo, não vai mais existir nenhum software que não faça uso de dados e de IA. E este é o ano que vamos levar isso aos nossos clientes, por meio de novos aplicativos e também dentro das atuais soluções”, finaliza Goetten.
Exemplos de inovação da Tovs
Ao chegarmos nas salas de experiências sensoriais da nova sede da Totvs, em São Paulo, vemos que uma delas simula um hospital com uma espécie de prontuário eletrônico. Outras lembram um supermercado, um restaurante, uma loja de vinhos ou de roupas. Nesse ambiente de ideias e pesquisas, um robô chama a atenção: a Rose, batizada assim em homenagem à empregada doméstica homônima do desenho Os Jetsons.
Trata-se de um protótipo de inteligência artificial (IA) que deverá ser usado em breve em “lojas do futuro”, no atendimento a clientes, para reconhecimento facial e realização de pagamentos.
Nas várias telas dispostas nessas salas de experiências, aparecem descrições de produtos, preços e vídeos informativos. Alguns programas são acessados diretamente pelo celular do usuário. E, se é preciso atualizar o estoque ou fazer uma promoção, as informações podem ser corrigidas instantaneamente pela loja, em telas automáticas. Ou seja, adeus às infinitas etiquetas de preços amarelas sobre as brancas, que podem levar horas para ser trocadas e ainda gerar erros.
Assim, segundo a Totvs, é possível mapear clientes e perfis de consumo, permitindo a recomendação certa para cada pessoa, favorecer o autoatendimento e diminuir o número de funcionários à frente do caixa. Isso reduz também o custo fixo das empresas, as filas e o tempo de espera. Com tanta tecnologia envolvida, ainda dá para saber em tempo real quais vendedores estão se saindo melhor — e recompensá-los por isso não apenas localmente, via gerente da loja, mas nacionalmente, direto das mãos do presidente, por exemplo.
Além disso, esses novos conceitos, de acordo com a Totvs, melhoram a experiência dos consumidores e as compras no varejo. No supermercado do futuro, que já é realidade em muitos países desenvolvidos, o autosserviço inclui passar todos os produtos em um leitor de código de barras. Aqui, eles precisam ser pesados em seguida, para garantir que ninguém está tentando burlar o sistema e levar vários produtos iguais para casa. De acordo com a companhia, essa é uma medida de segurança porque o Brasil ainda é um mercado novo no quesito autoatendimento, um exemplo prático de que toda inovação precisa considerar também a maturidade do público e a realidade de cada país.
Se o espelho do futuro terá vida própria como o da Rainha Má da Branca de Neve, com capacidade para nos dizer se uma roupa caiu bem, ficou apertada ou não combina conosco, ainda não sabemos, mas a Totvs já desenvolve um espelho inteligente que está bem perto disso. Ele reflete a imagem do cliente, mas também funciona como uma tela de computador que exibe informações e imagens sobre a peça que está sendo experimentada, por meio de um microchip fixado em cada tecido.
Dessa forma, assim que a tela identifica que uma determinada camisa, bermuda ou vestido entrou no provador, aparecem dados sobre o produto no lado esquerdo do espelho. Dá para ver um álbum de fotos daquele modelo combinando com outros disponíveis na loja — e solicitá-los para compor um look —, qual o tamanho da roupa (P, M ou G) e pedir por ali mesmo uma maior ou menor, com apenas um toque na tela.
O vendedor logo aparece com outra peça, não havendo necessidade de a pessoa se trocar e sair do provador para ir em busca de algo que sirva melhor nela. Além disso, o espelho apresenta diferentes intensidades de luz (dia de sol, entardecer, noite) para que o cliente veja como fica aquela roupa em ambientes com variação de luminosidade, como um passeio ao ar livre ou uma balada.
Esse novo conceito é chamado de “varejo sem atritos”, pois o consumidor não precisa esperar quando chega na loja nem enfrentar fila para pagar. Com toda essa informatização, também é possível saber quantas peças entraram no provador em certo período e quais não foram compradas. Segundo a Totvs, o objetivo é aprimorar tanto a experiência do consumidor quanto a gestão do varejista, com soluções integradas de comércio eletrônico e benefícios como programas de fidelidade.