Em um longo texto que se espalhou pelo Vale do Silício no último fim de semana, um engenheiro de software no Google criticou os esforços da empresa para aumentar o número de minorias e mulheres em suas fileiras e posições de liderança.
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O texto, reportado pela Motherboard e publicado na íntegra pelo Gizmodo, foi postado em um fórum interno do Google por um engenheiro de software e intitulado "Câmara de eco ideológica do Google".
O autor não foi identificado publicamente, mas suas palavras provocaram reações. Os críticos dizem que suas opiniões refletem uma cultura de empresa de tecnologia que não é acolhedora ou mesmo hostil para mulheres e minorias. Outro receio é o de que as palavras do engenheiro refletem os pensamentos de muitos outros em uma indústria dominada por homens brancos.
O Google, que anunciou esforços para aumentar a diversidade e está sendo investigado por suspeitas de desigualdade salarial entre gêneros, não respondeu os questionamentos da reportagem. A empresa, porém, abordou o texto em uma carta interna aos funcionários.
Os argumentos
O texto argumenta que o Google deve parar suas campanhas para aumentar a diversidade racial e de gênero e se concentrar em "diversidade ideológica".
Ele diz que o motivo pelo qual as mulheres não compõem metade das posições tecnológicas e de liderança da empresa é por "diferenças genéticas" nas suas preferências e habilidades.
"Essas diferenças podem explicar por que não vemos uma representação igual de mulheres em tecnologia e liderança", escreveu o engenheiro. "Precisamos parar de assumir que as lacunas de gênero implicam sexismo".
O autor afirma que os esforços de diversidade da empresa "criaram uma monocultura politicamente correta que mantém o controle intimidando os dissidentes ao silêncio" e que facilita o enraizamento de "políticas extremista e autoritária".
Ele diz que os esforços do Google para alcançar uma representação mais igualitária de gênero e raça — programas especiais para HBCUs [universidades criadas antes de 1964 com o intuito de servir a comunidade afro-americana], por exemplo, ou acampamentos de programação para meninas — levaram a "práticas discriminatórias", especificamente contra os conservadores.
No texto, o autor diz ter recebido apoio de outros na empresa por "abordar essas questões muito importantes", que outros "nunca teriam a coragem de dizer ou defender por causa de nossa cultura de intimidação e a possibilidade de serem demitidos."
Isso é o que as mulheres e as minorias do Google temem: que atitudes que tratam medidas de inclusão com escárnio sejam mais comuns do que se imagina.
Posicionamento do Google e repercussão
O texto aparece no momento em que a empresa Mountain View, Califórnia, tenta aumentar a percentagem de mulheres e minorias em suas fileiras e é investigada pelo Departamento do Trabalho pela disparidade nos salários de homens e mulheres.
Respondendo ao texto em uma mensagem para os funcionários do Google, Danielle Brown, a nova vice-presidente de diversidade, integridade e governança da empresa, disse que ele "avançou suposições erradas sobre gênero".
"A diversidade e a inclusão são uma parte fundamental de nossos valores e a cultura que continuamos a cultivar", disse Brown. "Nós somos inequívocos em nossa convicção de que a diversidade e a inclusão são fundamentais para o nosso sucesso como uma empresa, e continuaremos a defender isso e a nos comprometermos a longo prazo".
Como Jena McGregor, do Washington Post, escreveu em março, apenas 1% dos funcionários da tecnologia do Google são negros — uma porcentagem que não muda desde 2014.
Para se tornar mais diversa, McGregor escreveu, "a empresa expandiu seu recrutamento para uma ampla gama de escolas, treina seus trabalhadores em ‘vieses implícitos’ e reexamina os currículos para garantir que os recrutadores não negligenciem o talento diverso".
A engenheira do Slack, Echa Baker, a quem a CNBC chamou de "crítica franca do viés sistemático na indústria de tecnologia", disse que a polêmica envolvendo o engenheiro é chocante, mas não surpreende.
"O Google já viu pistas sobre isso no passado, com funcionários compartilhando postagens de blog sobre suas crenças racistas e, lista de discussão interna, perguntas ocasionais e ‘inocentes’ se os negros não são mais propensos à violência", escreveu ela em seu blog no sábado.
"A pergunta mais importante que devemos fazer aos líderes do Google e que eles deveriam estar perguntando a si mesmos é: por que o ambiente no Google é de tal forma que os racistas e os sexistas se sentem apoiados e seguros ao compartilhar esses pontos de vista na empresa?"
Yonatan Zunger, um ex-funcionário do Google, também criticou a postura do engenheiro de software. Ele escreveu no Medium que o texto mostra um mal-entendido sobre o modo como o Google tenta resolver os problemas do mundo:
"Essencialmente, a engenharia é cooperação, colaboração e empatia tanto entre os seus colegas quanto seus clientes. Se alguém lhe disse que a engenharia era um campo onde você conseguia fugir sem lidar com pessoas ou sentimentos, lamento dizer isso, mas você foi enganado.”