Logo do Facebook.| Foto: Bloomberg/Bloomberg

Os acordos do Facebook com a Amazon, Apple, BlackBerry e Samsung, permitindo que seus dispositivos acessem dados dos usuários da rede social, podem resultar em multas e outras penalidades ao Facebook, disseram especialistas.

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A prática — que pode ter ocorrido sem o conhecimento pleno dos usuários — provocou duras críticas na segunda-feira (4) de legisladores norte-americanos, que disseram que o Facebook os enganou sobre a maneira como coleta e troca os dados dos consumidores. Isso pode estimular uma nova investigação da FTC (Federal Trade Commission, órgão norte-americano equivalente ao Cade, no Brasil), que já investiga o Facebook por polêmicas recentes relacionadas à privacidade.

“Acredito que quanto mais [práticas de] compartilhamento não autorizado é divulgado, mais a FTC estará inclinada a impor uma sanção civil significativa ao Facebook”, disse David Vladeck, um funcionário do alto escalão da agência quando o Facebook foi punido, em 2011.

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No Capitólio, o senador Richard Blumenthal, democrata de Connecticut, disse que novos relatórios mostraram que o Facebook “não conseguiu esclarecer ao povo americano sobre a extensão, o escopo e a escala do compartilhamento de dados. Os acordos secretos levantam sérios problemas de credibilidade sobre depoimentos recentes.”

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Posteriormente, o senador da Virgínia, Mark Warner, principal democrata no Comitê de Inteligência do Senado, levantou outra preocupação: se o Facebook já havia permitido que a Huawei e a ZTE, duas empresas de telecomunicações chinesas, acessassem dados dos usuários.

Parte do governo americano acredita que a China pode ter usado a Huawei e a ZTE para espionar os cidadãos norte-americanos — acusações que as empresas negam. Por enquanto, Warner questiona o Facebook sobre possíveis relações, disse uma porta-voz. Até agora, o Facebook se recusou a revelar a lista completa, de cerca de 60 empresas que se beneficiaram do acesso a alguns dados dos usuários.

Consentimento pleno

Entre os parceiros que o Facebook revelou estão Amazon, Apple, BlackBerry, HTC, Microsoft e Samsung. Por meio de uma combinação de acordos legais e software, o Facebook “permitia que as empresas recriassem experiências parecidas com [as d]o Facebook para seus dispositivos individuais ou sistemas operacionais”, reconheceu a gigante social em um post de blog na segunda-feira. O New York Times foi a primeira publicação que revelou o escândalo.

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Um acordo com a Apple, por exemplo, permitia que usuários do Facebook baixassem fotos de perfil dos seus amigos e as usassem em suas listas de contatos do iPhone. A Apple alega que não armazenou os dados em si.

Um aparelho BlackBerry antigo, por sua vez, aparentemente acessava muitas categorias de dados, incluindo mensagens, enquanto capturava dados de amigos e outros perfis, segundo o Times. Em resposta, Usher Lieberman, porta-voz da BlackBerry, disse que a empresa “sempre esteve no negócio de proteger os dados dos clientes”, não no de gerar receita a partir deles.

O Facebook declinou em divulgar a lista completa de fabricantes de dispositivos com os quais havia intermediado tais acordos, mas a empresa disse que eliminou o sistema em abril. Ela reconheceu que os fabricantes de dispositivos podem ter mantido os dados em seus servidores. E o Facebook disse, no post em seu blog oficial, que “não tem conhecimento de nenhum abuso por parte dessas empresas”.

Nos Estados Unidos, o tratamento dado pela gigante de tecnologia das informações sensíveis de seus usuários desencadeou novas questões sobre se o Facebook violou um acordo negociado com a FTC em 2011, devido a um problema de privacidade distinto. No centro desse decreto de consentimento, existe um requisito de que o Facebook seja mais transparente quanto aos dados que coleta dos seus usuários.

A agência já está investigando se o Facebook entrou em conflito com o acordo em outro caso — quando permitiu que uma consultoria política, a Cambridge Analytica, acessasse os dados pessoais de 87 milhões de usuários, incluindo as páginas que eles “curtiram” no site. O potencial de infrações adicionais pode apenas aumentar os problemas legais do Facebook.

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“Essa empresa, pelo que vi, ignorou um decreto de consentimento e se comportou de maneira prejudicial aos interesses dos consumidores”, disse Vladeck. “Você não deveria poder mentir para as pessoas.”

Vladeck disse que penalidades adicionais podem incluir um monitor ordenado pela Justiça das práticas comerciais do Facebook, liminares contra formas específicas de uso dos dados dos consumidores ou um monitoramento mais intenso por parte da FTC.

No Congresso, enquanto isso, alguns legisladores democratas criticaram também o CEO do Facebook, Mark Zuckerberg. Em abril, vários comitês no Capitólio o encheram de perguntas sobre as negociações do Facebook com a Cambridge Analytica. Os legisladores disseram que os novos relatórios apenas aumentaram a necessidade de escrutínio adicional — no Congresso e na FTC —, focado nas práticas de negócios do Facebook.

“O Facebook e outros coletores de dados, incluindo esses fabricantes de dispositivos, devem estar preparados para comparecer ao Congresso para que possamos ter uma melhor compreensão de todo o ecossistema de coleta de dados”, disse o deputado Frank Pallone, democrata do alto escalão do Comitê de Energia e Comércio da Câmara, em comunicado.

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A senadora Amy Klobuchar disse mais tarde, também em comunicado, que o incidente demonstrou a necessidade de aprovar uma legislação abrangente sobre privacidade online, que ela ofereceu no início deste ano. “Estou extremamente preocupada com o fato de que estamos apenas aprendendo que ainda mais dados pessoais dos usuários foram fornecidos sem o consentimento”, disse ela.

O que pode acontecer ao Facebook

Legalmente, o destino do Facebook pode se basear em algumas frases principais.

De acordo com o decreto de 2011 com a FTC, o Facebook precisa obter a permissão antes de compartilhar informações particulares de um usuário com terceiros de uma maneira que exceda as configurações de privacidade existentes do usuário. O acordo define “terceiros” para incluir uma série de outras entidades particulares, potencialmente incluindo anunciantes ou criadores de conteúdo. Mas isenta “provedor(es) de serviço” que ajudam o Facebook a executar funções básicas de seu site.

Para esse fim, o Facebook alega que empresas como Samsung ou BlackBerry, nesses casos, são fornecedores, e não terceiros. Em um post no blog, um executivo da empresa também disse que as informações de “amigos”, como fotos, só eram acessíveis em dispositivos quando as pessoas tomavam a decisão de compartilhar suas informações com esses amigos.

“Esses contratos e parcerias são totalmente consistentes com o decreto de consentimento da FTC do Facebook”, disse Ime Archibong, vice-presidente de parcerias de produtos do Facebook, em um comunicado.

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Vladeck disse que os reguladores podem ver de maneira diferente. “O Facebook não explicou realmente como obteve o consentimento para o compartilhamento desses dados”, disse ele em uma entrevista. “Pode ser que eles vejam [fabricantes de dispositivos] como partes diretas, mas eles claramente não estão sob o decreto de consentimento.”

A FTC se recusou a comentar. Um dos membros democratas da comissão, Rohit Chopra, recusou-se a falar sobre o Facebook, mas disse de maneira mais geral em um comunicado: “Pedidos da FTC não são sugestões. Se uma empresa os viola, pode e deve haver sérias consequências”.

Enquanto isso, em Nova York, a procuradora-geral do Estado, Barbara Underwood, também se comprometeu a investigar o assunto, acrescentando à atual investigação do estado sobre o relacionamento do Facebook com a Cambridge Analytica. “Os consumidores têm o direito de saber como suas informações pessoais estão sendo usadas e as empresas nas quais confiamos nossas informações têm uma responsabilidade crítica de protegê-las”, disse em comunicado.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]