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Letreiro do Oriental Movie Metropolis . | Qilai Shen/Bloomberg
Letreiro do Oriental Movie Metropolis .| Foto: Qilai Shen/Bloomberg

Quatro gigantescos ideogramas chineses estão alinhados em uma colina com vista para um complexo de cinemas à beira-mar, em referência ao famoso letreiro de Hollywood, o ícone cultural americano em Los Angeles.

Esta é a cidade portuária de Qingdao, no norte da China, onde o Dalian Wanda Group, um conglomerado de imóveis, varejo e entretenimento, está abrindo suas portas para um audacioso centro de produção cinematográfica de US$ 7,9 bilhões chamado Oriental Movie Metropolis.

O projeto tem os maiores estúdios do mundo, um complexo comercial coberto por retratos gigantes de Charlie Chaplin, Marilyn Monroe e Bruce Lee. Há também uma ilha recuperada cheia de hotéis, condomínios, dois teatros e um iate clube.

Tudo isso contribui para o maior e mais chamativo esforço chinês em atrair cineastas de Hollywood para trabalhem sua mágica nos estúdios nacionais de produção cinematográfica — o tipo de movimento que pode aumentar o “soft power” e o alcance cultural da nação no cenário global. Para o presidente bilionário do grupo Wanda, Wang Jianlin, que reafirmou suas ambições de construir um império do entretenimento graças à pressão de dívidas, muita coisa depende do sucesso do complexo.

No final de abril, executivos de grandes estúdios de Hollywood e da China estiveram em Qingdao, cidade mais conhecida por sua cerveja homônima, para a cerimônia de abertura. O conglomerado, que tem sede em Pequim, viu sua sequência de aquisições globais feitas a partir de dívidas ser freada pelo governo chinês.

Wang, de 63 anos, presidiu as festividades e disse que aquele lugar se tornará o novo centro do cinema mundial.

Bruce Lee e Marilyn Monroe.Qilai Shen/Bloomberg

Tornar o complexo um ímã global para a produção de filmes será um desafio, de acordo com Sun Hengqin, assistente da presidência do grupo Wanda e chefe do novo complexo cinematográfico. “Ainda precisamos descobrir uma estratégia clara para atrair Hollywood e outros cineastas estrangeiros”, disse Sun. “Sim, nós adoraríamos que eles viessem filmar aqui, e vamos estudar quais são os fatores que impedem a vinda deles e melhorar nossos serviços de acordo”.

Os estúdios estão parcialmente abertos desde o segundo semestre de 2016 e já abrigaram a produção de dez filmes. Fora o Legendary Entertainment, do próprio grupo Wanda, nenhum grande estúdio de Hollywood produziu um filme em Qingdao. A maioria das produções tem sido de filmes chineses, embora alguns deles com grandes orçamentos, como Feng Shen, uma trilogia de três bilhões de yuan (cerca de R$ 1,7 bilhão) baseada em um antigo romance mitológico chinês.

“Planejamos nos posicionar primeiro para o mercado doméstico antes de ir para o exterior”, disse Sun, ex-funcionário do governo local. Feng Shen, disse ele, ocupará metade dos 30 palcos dos estúdios nos próximos dois anos e que cinco a seis outros filmes chineses se comprometeram a usar as instalações este ano.

Todo o complexo ocupa uma área de 929 hectares, de acordo com um comunicado do Wanda de 2013, quando foi dado início ao projeto com celebridades de Hollywood como Leonardo DiCaprio, Nicole Kidman e o agora escorraçado Harvey Weinstein.

Wang, que já foi o homem mais rico da China, gastou muito em sua tentativa de se tornar um magnata da indústria cinematográfica, começando com suas aquisições da AMC Entertainment e do Legendary. Agora, ele está em modo de contenção de gastos, depois que as dívidas aumentaram e o governo começou a analisar com atenção seu império comercial. Em julho passado, o grupo Wanda vendeu uma participação majoritária na Oriental Movie Metropolis para a Sunac China Holdings, uma incorporadora chinesa, juntamente com 12 parques temáticos em todo o país.

O grupo Wanda ainda mantém os direitos de marca e a gestão para os estúdios de Qingdao e os outros 12 projetos. No entanto, a operação teve sua parcela de contratempos. Os estúdios tiveram sete CEOs diferentes desde 2015 e a maior parte do pessoal de fora, contratado para ajudar a levar as operações no mesmo nível dos padrões hollywoodianos, foi embora, segundo pessoas familiarizadas com o assunto e que pediram para não serem identificadas. Um funcionário do Wanda, que também não quis se identificar, disse que levou tempo até encontrar a equipe certa e que os estúdios de Qingdao estão abertos ao mundo com ou sem funcionários estrangeiros.

Não há falta de trabalho com cinema e TV na China, a segunda maior bilheteria do mundo e a maior produtora mundial de séries de TV. Os estúdios de Qingdao têm uma grande vantagem competitiva: um programa de incentivo de cinco bilhões de yuans (cerca de R$ 2,9 bilhões) financiado pelo grupo Wanda e pelo governo de Qingdao, segundo April Ye, diretora executiva da Film Finance, uma empresa sediada na Califórnia que trabalhou com o Wanda e ajuda cineastas independentes a levantar fundos.

“Esta é a primeira vez na China que as autoridades e o setor privado se unem para investir recursos enormes para o desenvolvimento da indústria cinematográfica”, disse ela. “Há uma grande oportunidade para definir as coisas desde o começo, assim como muitos desafios para chegar lá”.

Outro desenvolvimento positivo: vendas de condomínios residenciais no empreendimento poderiam ter um impulso a partir de um robusto mercado imobiliário local.

Centro de performance no Oriental Movie Metropolis.Qilai Shen/Bloomberg

O programa de incentivo de R$ 2,9 bilhões, financiado em conjunto por Wanda, Sunac e os governos locais, não pagou nenhum dos dez filmes produzidos lá. Sun disse que a primeira leva de abatimentos foi aprovada e que mais de dez milhões de yuans (R$ 5,8 milhões) serão perdoados de The Great Wall, o maior filme coproduzido por estúdios chineses e norte-americanos e cuja produção ocorreu no mesmo lugar que a Oriental Movie Metropolis agora ocupa.

O estúdio espera receber cerca de 100 filmes e produções de TV por ano, segundo um comunicado enviado à imprensa no final de abril.

Guerra fiscal entre as locações

“Os estúdios são enormes e absolutamente de primeira classe”, disse Aaron Shershow, produtor de Pacific Rim: Uprising, do estúdio Legendary, até agora o único grande filme de Hollywood produzido em Qingdao. “Fiquei desapontado ao ver que não houve mais produções estrangeiras e acho que a razão é que eles não fizeram um bom trabalho promovendo o abatimento fiscal”.

Isso significa que Qingdao pode ter dificuldades em concorrer com outros locais populares, como o Canadá, o Reino Unido e vários estados dos EUA, que têm tido programas de incentivos competitivos e vantagens geográficas e legais.

Os filmes de grande orçamento mudaram cada vez mais a produção da Califórnia para outros locais, de acordo com um estudo da Film L.A., o escritório oficial de cinema de Los Angeles. Em vez disso, a Colúmbia Britânica (no Canadá), o Reino Unido e alguns estados dos EUA, como Louisiana e Geórgia, tornaram-se cada vez mais populares para os grandes estúdios de Hollywood, apontam estudos.

“Os incentivos financeiros se tornaram o principal fator determinante à escolha de um local de filmagem”, disse Adrian McDonald, analista de pesquisa do Film L.A. “Os produtores podem ficar muito nervosos se os incentivos não forem totalmente financiados ou arranjados”.

Sun, do grupo Wanda, disse que tanto a empresa chinesa quanto o governo de Qingdao estão comprometidos com o fundo e que estão finalizando os critérios para os subsídios financeiros. Um pré-requisito a ser incluído é garantir uma permissão de liberação teatral na China, disse ele. Isso significa que os filmes terão que tolerar a censura chinesa, algo que torna o desconto “longe de ser garantido”, segundo McDonald. “Isso não vai deixar ninguém feliz em Hollywood”, disse, acrescentando que uma exigência de liberação teatral não é comum entre os incentivos de produção cinematográfica ao redor do mundo.

“Pode demorar um pouco para a comunidade internacional se sentir mais confiante em apostar seus projetos” em Qingdao, de acordo com David Shepheard, comissário de cinema de Vancouver. A cidade canadense ganhou um apelido de “Hollywood do norte” por sua proximidade com os EUA, incentivos fiscais e uma grande base de talentos, disse ele.

O Grand Theater, no Oriental Movie Metropolis.Qilai Shen/Bloomberg

A China concordou em trazer a cada ano pelo menos 34 filmes estrangeiros e compartilhar suas receitas de bilheteria com os estúdios americanos. Mas o país raramente importa além do mínimo, tornando-se uma cota efetiva e uma fonte de queixas dos produtores de Hollywood. O aumento das tensões comerciais entre as duas economias complicou a probabilidade de renegociar os números.

Os cineastas podem contornar isso assegurando um status de “coprodução China-estrangeira” com as autoridades chinesas. As condições incluem filmagens no país, colocando atores chineses em papéis protagonistas, financiando o filme com capital chinês e apresentando substanciais “elementos chineses”. Pacific Rim: Uprising, do Legendary, foi quase adaptado para se encaixar em tais critérios, mas o filme não conseguiu garantir o status de coprodução, ilustrando os desafios em navegar pelas regras estabelecidas pelas autoridades de cinema e propaganda da China.

Fazer pelo menos um filme por ano na China permite que os estúdios de Hollywood mostrem seu apoio à indústria cinematográfica do país. Chame a isso de um ato de “diplomacia cinematográfica”, disse Chris Fenton, curador do Instituto US-Asia, com sede em Washington, e ex-presidente do estúdio DMG Entertainment. Em troca, os estúdios no exterior podem ter mais lançamentos, acesso antecipado para marketing e promoção ou mais tempo em cartaz nos cinemas, disse ele.

Sun disse que está estudando as políticas do governo e planeja fazer roadshows para os EUA, Canadá, Japão, Coréia do Sul e Hong Kong para promover os estúdios. Ele comparou os desafios dos estúdios de Qingdao às dificuldades iniciais da China em atrair investimentos estrangeiros nas décadas de 1980 e 1990. Com o tempo, elas foram superadas.

“O Oriental Movie Metropolis, no momento, é apenas um começo. Em cinco ou dez anos, seremos completamente diferentes”, disse Sun.

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