Inovação é a grande chave do crescimento expressivo do Magazine Luiza. Considerada por analistas — e pela própria fundadora Luiza Trajano — uma das empresas brasileiras com maior potencial de competir com a Amazon nacionalmente, a dona da ação MGLU3 teve crescimento impressionante de 510,5% em 2017 graças majoritariamente à desenvoltura ao lidar com público digital e varejo físico tradicional concomitantemente.
Por trás de todo esse sucesso, há o trabalho de muitos nomes essenciais. Entre os destaques está o atual CTO André Fatala, que ajudou a desenvolver a personalidade de startup típica do Vale do Silício em uma gigante brasileira de 60 anos de idade.
Usando óculos de acetato, camiseta ou camisa listrada e um linguajar despojado, repleto de termos que demonstram sua empolgação com a tecnologia, a imagem de Fatala é muito diferente de boa parte dos engravatados que escolhem a ação do Magazine para compor carteiras de investimento de alto desempenho. Isso de forma alguma significa que essas pessoas sequer hesitem reconhecer seu valor.
“Quando conhecemos o LuizaLabs [frente de tecnologia do Magazine] pela primeira vez, em 2015, nos chamou a atenção o seguinte: se a empresa está dando autonomia e espaço pra um cara como o André Fatala, totalmente diferente da cultura de varejo que a gente conhece, é porque de fato entendeu a importância da inovação e tecnologia para o mercado”, diz Henrique Bredda, gestor da Alaska Asset, que investiu nas ações do Magazine Luiza desde 2016 e que ao longo de 2017 tornou-se um dos maiores acionistas individuais da empresa.
“A competência dele, pela formação, pela trajetória, era evidente para nós. E uma companhia tem que ser realmente diferenciada para dar espaço e autonomia para um cara desses, totalmente diferente dos padrões da indústria”, complementa Bredda. “Devem existir outros como o Fatala, mas não os encontramos em outros lugares [no varejo]: quem é o Fatala da Via Varejo? Quem é o Fatala da Guararapes? O laboratório de tecnologia da Hering? Não sei se eles têm, devem estar buscando, querendo copiar, mas ainda não conseguiram”.
Essa confiança em uma figura como o Fatala se mostrou acertada para Bredda e consequentemente para a Alaska: o fundo Alaska Black teve uma das maiores rentabilidades na indústria brasileira em 2016 e 2017, com ganhos de +129,2% e +74,6%, respectivamente, beneficiados principalmente pela forte alta dos papéis MGLU3 neste biênio — 501,5% em 2016 e 510,5% em 2017.
E não é só o mercado financeiro que reconhece o mérito da empresa. Para o diretor de Agilidade Henrique Imbertti, que trabalhou em empresas nascidas na era digital como o Spotify, o Magazine, aos 60 anos de idade, não deixa nada a desejar na comparação com as startups mais inovadoras do mundo. “Aqui você pode errar. Cometemos erros a todo o momento, mas o que a gente faz é parar, resolver e conversar sobre o que causou aquele problema. Usamos todos os canais disponíveis para aprender com as nossas falhas e não cometer o mesmo erro duas vezes”, conta.
Esse ambiente de inovação também permite aos funcionários participar ativamente da criação de novos projetos. O estímulo à criação está inclusive dentro de três pilares repetidos na empresa: sustentação do negócio, metas e inovação. Com 22 mil funcionários que funcionam como cabeças pensantes e 800 lojas para colocar essas ideias em prática, cria-se uma capacidade poderosa. “Uma startup não tem essa escala”, lembra Henrique.
Trajetória
Fatala não entrou na empresa como diretor, mas para integrar uma equipe de TI em 2010, após passar pela Predicta e, antes, pelo Submarino. Naquele ano, muito antes da emergência do chamado “apocalipse do varejo” dos EUA, assumiu o compromisso de reformular o e-commerce da empresa e prepara-la de uma vez por todas para a iminente revolução digital.
“O e-commerce em 2010 já começava a ter um volume de vendas mais relevante para a companhia, mas a parte de inovar era um pouco mais complicada”, relembra Fatala em entrevista concedida no final de 2017. “Naquela época, foi feito um trabalho de base, e em 2010 a gente pegou esse desafio de desenvolver uma base tecnológica para permitir que o cliente pudesse criar inovação em cima”. Isso seria aplicado imediatamente a uma ideia do atual CEO Frederico Trajano, o Magazine Você.
Ao desenvolver esta plataforma em 2011, Fatala demonstrou, além de valor, agilidade. O Magazine Você, que permite aos consumidores vender produtos do Magazine virtualmente ganhando comissão, foi posto no ar em apenas três meses com o trabalho de três pessoas. No quarto mês de funcionamento, ainda em versão beta, mil pessoas já estavam cadastradas, e isso numa época de inclusão digital muito menos significativa, principalmente no Brasil.
“Qual foi a mágica? Pegamos um time multidisciplinar, colocamos em uma sala e demos o prazo para colocar aquilo para funcionar. Não era um desafio simples”, diz Fatala sobre o que considera seu primeiro desafio na transformação digital dentro da empresa. Lançada primeiro em versão de testes, a plataforma se baseou primordialmente no feedback dos primeiros usuários interessados em testá-la. Isso ajudou na demonstração de que a interação frequente com o cliente é uma das armas mais poderosas do Magazine como um todo. “Vamos tentar evitar esse negócio que a gente aqui dentro vai saber quais são as necessidades das pessoas”, disse o diretor.
“Foi muito legal. O cenário otimista dizia que teríamos 10 mil lojas criadas entre setembro e o final de 2012. A gente teve dez mil lojas criadas em três semanas”, relembra Fatala. “Dali, se comprovou muita coisa também”, complementa, como a vantagem de usar tecnologia de nuvem para otimizar o trabalho de poucos desenvolvedores: outra tendência que se poucos anos depois se transformou, em suas palavras, em um “buzz”.
Depois disso, como forma de oficializar o interesse da empresa em novas tecnologias, veio o LuizaLabs, que permitiu a dedicação exclusiva de parte dos funcionários à inovação, um grande diferencial competitivo no varejo nacional. Nascido dentro de uma pequena sala com dois profissionais (“eu e mais um cara, nosso ‘Jesus Geek’”, diz Fatala, em referência ao penteado do colega), o Labs cresceu tanto em tamanho e importância que atualmente lota um escritório próprio a poucos metros da sede do Magazine em São Paulo – além de também possuir operações em Franca.
“Nosso objetivo era desenvolver novas pesquisas, novas tecnologias, e criar produtos a partir disso”, relembra. Dentro da evolução dos produtos móveis, foco absoluto do Labs em seus primeiros meses de vida, um dos primeiros resultados interessantes foi a criação, em apenas 16 horas, do Clube da Lu, um programa de fidelidade que, dentro do app do e-commerce, e oferece descontos temporários e condições exclusivas para os clientes cadastrados.
Este app, desenvolvido a partir do esforço da equipe liderada por Fatala, hoje é considerado pelos executivos do Magazine como o “nosso Prime”, em referência ao serviço de fidelização da Amazon nos Estados Unidos. Em outras palavras, trata-se de uma versão brasileira de uma das maiores tendências do varejo mundial. A própria Amazon usa o Prime como “arma secreta” de crescimento exponencial por observar nos clientes fidelizados tíquetes médios muito maiores do que o geral.
A diferença primordial entre esses dois serviços é simples: a gratuidade da versão brasileira, como o CEO Frederico Trajano fez questão de em uma reunião com analistas e investidores em dezembro de 2017. “A gente não precisa cobrar US$ 99 para fazer esse serviço extra”, disse, na ocasião do lançamento da entrega expressa para compras via aplicativo.
Do LuizaLabs para toda a operação digital
Do ponto de vista de Fatala, o Labs também foi um trampolim: de lá, ele emergiu como responsável por todo o e-commerce como e, com isso, veio o desafio de mudar o modelo de venda online da empresa.
Para garantir a viabilidade de um negócio tão elaborado, times pequenos de funcionários assumiram com dedicação máxima cada pedaço do site. Uma equipe cuida de check-out, outra de atendimento, enfim, funcionários têm atribuições em cada peça da engrenagem do Magazine Online. Isso permite uma especialização e resulta em novas ideias em ritmo avançado. A cada ano, o Labs entrega cerca de 30 projetos estratégicos capazes de melhorar o nível do produto oferecido.
Com esse ritmo, o executivo demonstra entusiasmo com o futuro. Questionado sobre a possibilidade de “estourar uma bolha” das ações do Magazine, Fatala parafraseia seu CEO: “não é o fim da festa, a gente está no meio dela”, diz. “Tem muito mais coisa para a gente entregar, e se você for pensar de novo em um modelo de plataforma, a gente vai ganhando em escala à medida que a gente vai colocando mais gente para usar isso”, explica.
E o investidor, deve buscar uma nova empresa com capacidade de crescimento semelhante ao Magazine? Para Fatala, claro, não. “Pode ficar no Magazine Luiza. Ainda tem muita coisa para vir, e só depende do nosso poder de execução. Se a gente conseguir executar o que a gente planejou, definitivamente tem muito para colher ainda”.
O gestor Bredda, da Alaska, concorda, e acredita em novas altas para a ação, cujo crescimento expresivo, relembra, é também a correção de uma desvalorização de mais de 90% entre 2011 e 2016. Para ele, a Magalu é, de fato, uma das empresas com maior potencial para “bater” na Amazon, até pelo fato de estar mais habituada com Brasil. “Quando os bancos internacionais vieram para o Brasil, apanharam do Itaú e Bradesco; Forever 21, Topshop, não fizeram cócegas na Renner e na Guararapes; a Localiza chegou a comprar a Hertz”, exemplifica, para concluir: “é muito difífil vir um gringo acostumado em trabalhar lá fora e conseguir desbancar os líderes locais”.