Comprar em grandes volumes a fim de economizar não é uma tática nova. No digital, serviços cobrados por assinatura recorrente adaptaram essa abordagem tradicional do comércio através dos planos familiares. Neles, várias pessoas usufruem do serviço a partir de uma conta só, que custa mais caro, porém sai mais em conta do que se fossem assinadas várias contas individuais, separadas. Em alguns casos, o termo “familiar” é levado bastante a sério, o que impede que algumas reuniões de usuários para essa finalidade funcionem.
A economia dos planos familiares é considerável. O do Spotify custa R$ 26,90 e permite até seis pessoas na mesma conta. Seis contas individuais custariam, somadas, R$ 101,40 – cada assinatura nessa modalidade custa R$ 16,90. Na Netflix, o plano padrão, de R$ 22,90, dá direito a duas telas simultâneas. Dividindo a conta com alguém, o gasto mensal fica em R$ 11,45.
Soluções profissionais também podem ser assinadas dessa forma. O Office 365 da Microsoft, que traz os famosos aplicativos de produtividade (Word, Excel, PowerPoint), mais espaço no serviço de armazenamento de dados na nuvem (OneDrive) e minutos para fazer ligações pelo Skype, custa R$ 24 no plano individual e R$ 29 no familiar, que comporta até cinco usuários. Na ponta do lápis, o custo da assinatura diluído por cinco custa R$ 5,80 para cada um.
O problema aos que querem economizar dessa forma é que alguns serviços levam ao pé da letra o “familiar”: eles exigem que os que vão usufruir do plano residam no mesmo endereço.
Spotify e Microsoft declaram explicitamente tal exigência. No serviço de streaming musical, a previsão aparece nos termos de uso, onde se lê que “todos os titulares das contas devem residir no mesmo endereço para serem elegíveis ao Oferta de Plano Premium Familiar.” Já no da Microsoft, o site do Office 365 Home, nome dado ao plano familiar, informa que os benefícios da assinatura podem ser compartilhados “com até quatro pessoas que morem com você.”
O que é família?
O critério de “família” adotado gera algumas incongruências, afinal, nem sempre todos os membros de uma moram no mesmo endereço. Foi o que aconteceu com o engenheiro Felipe Torres, de Macaé-RJ. Ele migrou o plano individual para um familiar a fim de estender as vantagens a pessoas próximas. “A diferença era tão pouca para eu poder colocar alguém comigo que resolvi arcar com os custos,” disse. Assim, ele colocou no plano familiar a mãe, a irmã, a namorada e dois amigos. Nenhum deles reside no mesmo endereço de Torres.
Algum tempo depois, os beneficiados receberam e-mails do Spotify pedindo uma “verificação da conta”. Quatro dias mais tarde, os cinco foram desvinculados do plano familiar e voltaram ao gratuito do Spotify, que não permite escolher a ordem das músicas em dispositivos móveis e insere anúncios publicitários entre as faixas.
Torres disse que tentou restabelecer o acesso das pessoas a quem cedeu espaço em seu plano familiar. Ele pediu à namorada, que mora em Maringá-PR, para que inserisse no sistema o endereço que consta em seu cartão de crédito, usado para pagar a assinatura do Spotify. Não deu certo. Após entrar em contato com o suporte do Spotify, um representante da empresa disse ter feito “alterações nos bastidores” e que seria possível restabelecer o plano familiar. A irmã e namorada de Torres conseguiram voltar ao plano.
Casos como o de Torres são comuns. Clientes que desconhecem a política do Spotify para o plano familiar e se surpreendem com o eventual cancelamento dele quando não está de acordo com os termos de uso, vão às redes sociais reclamar:
O que dizem as empresas
Gazeta do Povo entrou em contato com as assessorias de Adobe (que tem a Creative Cloud, com apps como Photoshop comercializados no modelo de assinatura), Microsof, Netflix e Spotify para saber o posicionamento de cada empresa em relação aos planos familiares que oferecem.
O Spotify disse que “no momento não vai comentar este assunto.” Adobe, Microsoft e Netflix não deram resposta até o fechamento desta matéria.
Aparentemente o serviço mais requisitado pelos que se associam para assinar planos familiares, o Spotify ainda não lucrou desde que foi lançado. Recentemente, a empresa, de origem finlandesa, assinou um contrato mundial com a Universal que prevê a restrição de novos álbuns da gravadora a assinantes pagantes por até duas semanas e uma reformulação na divisão dos lucros. Os detalhes do acordo, porém, não foram revelados, mas analistas veem nele um caminho promissor para que a empresa comece a fechar no azul.