Comunicação é a aplicação mais básica dos celulares. Não bastasse ser a função original desses aparelhos, a multiplicidade de apps de mensagens e a popularidade deles reafirmam a declaração inicial. Com alguns desses apps ultrapassando a barreira do bilhão de usuários, as empresas enxergam neles oportunidades para expandirem funcionalidades e, com sorte, criarem novos canais de faturamento. A dificuldade, como mostram Apple, Facebook e Microsoft, é acertar o equilíbrio entre novidades e aquela premissa básica, a de simplesmente conversar.
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Parece algo óbvio, mas não tem sido o caso nos últimos anos. O Messenger do Facebook é o caso mais emblemático. Em meados de 2014, a funcionalidade de bate-papo foi removida do app principal do Facebook. Para conversar em tempo real com os amigos pelo celular, os usuários tiveram que instalar o Messenger. Criticada, a estratégia se mostrou acertada do ponto de vista comercial. Hoje com mais de um bilhão de usuários no Messenger, o Facebook conseguiu criar uma plataforma à parte.
Nessa nova plataforma, recursos e comportamentos estão sendo testados. Nos últimos dois anos, pelo menos três grandes atualizações foram feitas lá dentro: a chegada dos robôs, a adequação da plataforma para perfis comerciais e os onipresentes Stories, recurso similar ao lançado pelo Snapchat e que, hoje, está em todos os apps do Facebook.
Acomodar tudo isso em um app de celular não é simples e o reflexo da dificuldade se nota na tela inicial do Messenger. De uma lista simples com as últimas conversas em ordem cronológica inversa, ela se transformou em um amontoado de botões, áreas e conteúdos extras. É tanta coisa que fica difícil encontrar as conversas.
E piora. O Facebook iniciou a liberação de anúncios na plataforma do Messenger. Eles aparecem na tela inicial e ocupam uma porção gigantesca do espaço disponível. A comparação de uma das primeiras versões do app com essa última é assustadora – parecem dois apps absolutamente distintos:
O Facebook pode se dar ao luxo de fazer maluquices com o Messenger porque tem outro app similar com mais de um bilhão de usuários, o WhatsApp. O cuidado com essa plataforma evidencia a estratégia dupla, mais experimental com o primeiro e bastante conservadora com o segundo.
Apesar de ter mudado bastante e recebido muitos recursos desde que foi adquirido pela gigante das redes sociais, o WhatsApp segue simples em sua premissa. É um app de mensagens e apresenta, de maneira frontal e inequívoca, uma lista das conversas recentes com contatos individuais e grupos.
Meta dados derivados do uso do WhatsApp já são usados para refinar o direcionamento de anúncios e outras sugestões no Facebook, e a empresa está testando maneiras de melhorar o contato (e cobrar por ele) entre estabelecimentos comerciais e usuários. Mesmo essas mudanças, porém, não ameaçam acabar com a simplicidade inerente ao app.
Se funciona tão bem com o WhatsApp, por que outros não seguem essa fórmula?
Skype e iMessage
Desde que foi adquirido pela Microsoft por US$ 8,5 bilhões, em 2011, o Skype nunca foi um app que inspira seus usuários. Mas ele é bem estabelecido e, mesmo com problemas pontuais, funciona.
Assim, foi com surpresa que a última grande atualização, no início de junho, foi recebida. O Skype ganhou um modo Stories similar ao do Snapchat e um ar meio… infantilizado? É difícil descrever, mas talvez o vídeo de divulgação ajude:
As reações foram negativas e os efeitos dela já se sentem com apenas um mês no ar. Levantamento do site norte-americano The Verge indicou que a classificação do Skype nas lojas de apps do Android e do iOS ao redor do mundo despencou. Embora não seja o indicador mais confiável, ainda é um relevante, especialmente quando mudanças drásticas ocorrem em um período tão curto.
A Apple, que criou o bem sucedido iMessage, uma plataforma de mensagens atrelada ao iPhone e que usa o SMS como rede de segurança – quando não há conexão com a Internet ou se tenta falar com um dispositivo não-Apple, o SMS entra em ação –, tem tido trabalho para encaixar apps na interface do app.
Introduzidos no iOS 10, os apps, em sua maioria pacotes de figurinhas animadas, são difíceis de serem descobertos e acessados. No iOS 11, eles estarão mais destacados, acessíveis diretamente da tela de conversação e com uma busca interna. Também nessa versão, a Apple tentará estabelecer o iMessage como canal de comunicação entre estabelecimentos comerciais e usuários.
Um app simples, por favor?
A atual leva de apps de mensagens tem todos esses problemas, mas traz virtudes importantíssimas. O WhatsApp e o iMessage, por exemplo, são criptografados de ponta a ponta, o que significa que ninguém, nem Facebook e Apple, conseguem ler as mensagens. O Facebook Messenger, apesar de todos os problemas, em muitos casos é o meio mais fácil ou único disponível para falar com alguém ou uma empresa. E o Skype… não se tem muita escolha.
Para quem preza pela simplicidade, as opções são mais restritas. O WhatsApp é uma delas. O Telegram, sempre lembrado quando o WhatsApp é tirado do ar pela justiça ou tem algum problema técnico, outra. Ele é um bom exemplo de como conciliar funções poderosas como o uso de bots e ferramentas para gerenciar grandes grupos (de até 10 mil pessoas) sem prejudicar o uso mais simples feito pela maioria.
Uma terceira alternativa é o Signal, o mais privado de todos e com recursos hoje considerados básicos como troca de fotos, envio de mensagens de áudio e ligações – tudo, incluindo meta dados, criptografado.
De nada adianta ter essas opções se os contatos estão nos demais apps. Por mais carregados, lentos e distantes da sua função nuclear que sejam, enquanto as pessoas conseguirem se comunicar lá dentro e seguirem os usando, o cenário não tende a mudar.