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O app chinês que vende tudo, tudo mesmo, e já tem 350 milhões de clientes

 | THE NEW YORK TIMES/NYT

Apple, Gucci, Tesla... muitos consumidores chineses amam as marcas famosas. Mas outra grande fatia da população é louca por um par de brincos de US$0,40, um carregador sem fio de smartphone de US$ 1,50 e 50 rolos de papel higiênico por US$ 4,75.

Estes são os compradores do Pinduoduo, um aplicativo chinês que conquistou quase 350 milhões de clientes no ano passado e fez com que sua empresa controladora listasse ações na Nasdaq em 26 de julho, com apenas três anos de existência.

A ascensão relâmpago do Pinduoduo sugere que a China não parou de produzir grandes startups da internet, apesar do vasto alcance de gigantes como o Alibaba. Além disso, ilustra a influência de uma categoria de consumidores chineses mal servidos.

Eles vivem fora das megacidades prósperas do país – em cidades menores, vilarejos e aldeias que mais de um bilhão de chineses chamam de lar. Em geral, são mais velhos e com menos experiência com a internet – e não conseguem resistir a uma pechincha, mesmo que o material que estejam comprando não seja exatamente de alta qualidade.

Na cidade de Foshan, no sul, Li Tianqiang e sua esposa vendem macarrão de arroz e outros alimentos para o café da manhã em um caminhão de três rodas para operários famintos. Nos últimos dois anos, Li, 45 anos, comprou quase US$1 mil em mercadorias do Pinduoduo, o equivalente a cerca de dois meses de sua renda. Entre suas aquisições estão um barco a remo inflável, uma sacola de pesca e um carro motorizado vermelho para sua filha brincar.

Li sabe que é um pouco viciado. E as compras das quais se arrependeu? Há algumas.

Tem as que foram feitas por curiosidade; em outros casos, os itens eram de qualidade tão ruim que ele jogou fora depois que chegaram. Os brinquedos que comprou para a filha – incluindo bonecas, um violino e um teclado – eram, segundo ele, particularmente ordinários.

Porém, tudo é tão barato que afirmou não se importar com eventuais produtos de má qualidade. “Não é nada de mais, realmente”, disse ele sobre seus gastos com o aplicativo.

Por muitos anos, a China foi sinônimo de produtos malfeitos produzidos em larga escala, mas isso está mudando: os salários estão subindo, forçando os fabricantes a competir em termos de qualidade; os líderes do Partido Comunista incentivam marcas conhecidas globalmente por suas inovações; fabricantes de dispositivos, tais como Xiaomi e Huawei, estão investindo pesado no design, em busca de coisas interessantes e atraentes.

Como funciona o Pinduoduo

Comprar no Pinduoduo, é ser lembrado de que muitos consumidores chineses ainda verificam os preços antes de tudo, e que os fornecedores de produtos mais simples ainda são uma grande parte da economia do país. A página principal do aplicativo é inundada de mantimentos, moda rápida, utensílios domésticos e itens eletrônicos, tudo com preços bem improváveis.

Calças elásticas masculinas da marca “Playboy”: menos de US$ 3. Cinco quilos de arroz: US$ 4. Um pacote com quatro cuecas samba-canção estampadas com uma imagem da cabeça de um lobo: US$ 2. Uma chaleira roxa com “lol” escrito no fundo: US$ 3. Um suporte cor-de-rosa para smartphone para ser usado em torno do pescoço para assistir a vídeos deitado: US$ 1. Uma cinta elétrica vibratória que supostamente ajuda a perder a barriga: US$ 6.

A entrega é sempre gratuita.

O Pinduoduo quer que os clientes envolvam seus amigos on-line no processo. As encomendas em grupo recebem descontos. Novos usuários que convencem os outros a se inscrever são recompensados com produtos gratuitos, que podem ser escolhidos de uma seleção. Pequenos pop-ups no aplicativo fornecem atualizações incessantes e em tempo real sobre o que os outros estão comprando, criando um senso de urgência. “Todo mundo está fazendo grandes negócios, menos você.”

Em meio à seleção de produtos delirantemente estranhos, os custos irrisórios, a imensidão de cupons e pechinchas e a facilidade com que as compras são feitas, a experiência lembra mais um videogame. Nos documentos de regulamentação, a empresa chama o aplicativo de “uma combinação de Costco e Disneyland”.

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Como o aplicativo surgiu e seus “pontos fracos”

O Pinduoduo iniciou as operações em 2015, e cresceu rápido o suficiente para atrair apoiadores poderosos, incluindo a empresa de capital de risco Sequoia Capital e o gigante da internet chinesa Tencent. A companhia, com sede em Xangai, esperava levantar US$1,4 bilhão em sua recente oferta de ações, o que lhe garantiria uma avaliação de mais de US$20 bilhões.

Mas, porque oferece coisas muito baratas, o Pinduoduo ainda está muito atrás de seus rivais no valor total de bens vendidos. A empresa, que ainda não deu lucro, disse que seu cliente médio gastou menos de US$ 90 na plataforma no ano passado, o que se traduz em receitas por cliente de pouco mais de US$ 1.

“Essa é a menor qualidade de tráfego que você pode conseguir. E se as pessoas mais velhas estão garantindo a popularidade do Pinduoduo, então as perspectivas de crescimento em longo prazo não são boas”, disse Steven Zhu, analista em Xangai da empresa de pesquisa Pacific Epoch. 

A plataforma também foi acusada de estar inundada de produtos falsificados; em meados de julho, a empresa foi processada por violação de marca registrada nos Estados Unidos.

O Pinduoduo se recusou a comentar, mas em seus documentos de regulamentação referentes ao controle de estoque, a companhia disse que removeu falsificações do aplicativo. E este ano, o fundador da empresa, um ex-engenheiro do Google chamado Colin Huang, descreveu sua filosofia de preço em relação à qualidade para a revista chinesa de negócios Caijing.

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Sua própria mãe se queixou com ele quando duas das nove mangas que comprara por US$ 1,50 pelo aplicativo vieram podres, disse Huang à Caijing. Mesmo assim, ele garante que ela continuou a usar o Pinduoduo. “Se você pode comprar sete mangas boas por US$ 1,50, não está perdendo”, afirmou.

No geral, Kang Xia concorda. Kang, aposentada de 52 anos de idade no sudoeste da cidade de Chengdu, usa o Pinduoduo para comprar sapatos, roupas, bugigangas... “Bastante, embora a qualidade nem sempre seja boa”, disse ela.

Alguns meses atrás, fez duas compras ruins: primeiro foi o guarda-roupa por US$5, com painéis de tecido colorido e estrutura de “madeira de verdade”, mas bastou um toque para perceber que a coisa não era boa. Em seguida, ela comprou uma saia de chiffon com um padrão floral por menos de US$6, incluindo uma camiseta amarela para usar com ela, que chegou com um rasgo na lateral. Kang disse que agora é menos provável que compre coisas no Pinduoduo apenas porque são baratas, mas ainda abre o aplicativo todos os dias.

Para as grandes empresas do comércio eletrônico chinês, não é bem-vinda a notícia de que muita gente compra quase qualquer coisa caso o preço seja justo.

Para manter os clientes e evitar a ira dos reguladores, o Alibaba, que atendeu mais de 500 milhões de compradores no ano passado, tentou controlar as vendas de falsificações em seu mercado Taobao. O varejista JD.com, que tinha cerca de 300 milhões de clientes, vem cortejando marcas sofisticadas e cultivou uma reputação de confiabilidade.

“De vez em quando há novos concorrentes, mas a questão é se eles podem se sustentar. Nós também estamos crescendo”, disse em um evento recente em San Francisco o executivo-chefe do Alibaba, Daniel Zhang. 

Terry Yao vive em Dandong, uma pequena cidade no nordeste da China. Depois de ver alguns tênis no Pinduoduo – que no varejo custariam mais de US$100 e estavam sendo oferecidos por uma fração minúscula desse valor, segundo ele – assumiu uma postura em relação à autenticidade dos produtos da plataforma.

“A China se desenvolveu muito, mas se os residentes dessas cidades menores só puderem usar coisas como o Pinduoduo, isso me parece uma falha grande. Estamos retrocedendo”, disse Yao, 28 anos. 

“Mas o Pinduoduo não precisa se prender à imagem da pechincha para sempre; agora que já usou os preços baixos para atrair tantos usuários, pode fazer como o Alibaba e se sofisticar”, disse Tian X. Hou, fundador da empresa de pesquisa de Pequim T.H. Data Capital.

“Uma vez que você conquista essa confiança, pode se desvencilhar do negócio atual e criar um novo negócio”, disse Hou.

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