Cinco anos após a resolução da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) que permitiu aos consumidores gerarem a própria energia, um estado brasileiro despontou na geração caseira. É nos telhados das residências e estabelecimentos de Minas Gerais que estão instaladas a maior parte das usinas fotovoltaicas do país. São 8.124 unidades e 139 megawatts (MW) de potência de geração distribuída, mais do que o dobro da capacidade do Rio Grande do Sul, segundo colocado. Esse número é a soma de todas as fontes, mas a fotovoltaica predomina.
Sozinho, o estado de Minas responde por quase um terço da capacidade total instalada no país em geração distribuída. Somente de fonte fotovoltaica, no Brasil, são 42.565 mil usinas com potência instalada de 428 MW, o equivalente a uma hidrelétrica de médio porte. Confira no infográfico:
Uma combinação de fatores fez com que o estado de Minas Gerais assumisse a dianteira na geração distribuída do país: tarifa de energia cara, nível de irradiação solar alto, isenção de ICMS para energia gerada em casa e uma concessionária de distribuição predominante no mercado.
O estado tem uma das tarifas de energia mais caras do país, a décima maior entre as 54 principais distribuidoras, segundo Tarcísio Andrade Neves, presidente da Cemig Geração Distribuída. Esse é um dos pontos que motiva os consumidores a gerar a própria energia e torna mais viável o investimento. Além disso, a principal concessionária de distribuição do estado, a Cemig, atende 744 dos 853 municípios mineiros, o que contribui para o aumento do autoconsumo remoto, quando a geração é feita distante do ponto de consumo.
LEIA MAIS >> A complexa equação para recuperar a indústria brasileira
“Quem gera energia na casa de praia e quer abater no consumo do apartamento só pode fazer a compensação dos créditos caso as duas unidades sejam a atendidas pela mesma concessionária”, explica Rodrigo Sauaia, presidente da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar).
Contudo, um dos maiores trampolins da geração distribuída em Minas, foi a isenção do ICMS. Em dezembro de 2015, o estado aderiu ao Convênio ICMS 16/2015 do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), que isenta o pagamento do tributo estadual (ICMS) sobre o excedente de até 1 MW de energia gerada por sistemas de geração distribuída.
Antes disso, porém, o estado já tinha uma legislação estadual para incentivar as energias renováveis com isenção de ICMS desde 2013. Mas o grande salto mesmo veio em 2017, quando Minas criou uma nova lei estadual que ampliou de 1 MW para 5 MW a capacidade das usinas aptas a receber a isenção do tributo, benefício válido para todas as modalidades de compensação: residencial, autoconsumo remoto, geração compartilhada e geração condominial. O estado também isenta o ICMS dos equipamentos para geração fotovoltaica.
Minas é o único estado do país a estender a isenção de ICMS a usinas com capacidade de até 5 MW e tem uma lei estadual que é referência. Hoje, porém, mesmo que outros estados quisessem seguir esse caminho, não poderiam”, diz Sauaia.
No ano passado, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) editou uma medida que impede que os estados criem leis relacionadas ao ICMS sem a autorização do Confaz, para evitar a guerra fiscal entre as unidades da federação, segundo o presidente da Absolar.
Todos estados brasileiros e o Distrito Federal aderiram à isenção do ICMS para energia solar nas modalidades de micro e minigeração. Mas apenas Paraná e Santa Catarina optaram por oferecer o incentivo pelo prazo máximo de 48 meses, podendo revogar a decisão antes desse período.
Um dos últimos estados a aderir ao Convênio ICMS 16/2015, em julho deste ano, o Paraná argumenta que a isenção de 29% do imposto de quem gera a própria energia onera a arrecadação do estado. Hoje, o Paraná é o 5.º estado do país em conexões fotovoltaicas instaladas, com 2.961 mil unidades e 32,8 megawatts de potência instalada. Conforme estimativa do governo, a isenção do imposto representaria a renúncia fiscal de R$ 1,5 milhão em 2018, R$ 4,5 milhões em 2019 e R$ 24 milhões em 2020.
Pela regra do Confaz, quem produz e consome toda a energia produzida não paga o tributo. O ICMS incide quando um imóvel gera mais do que foi consumido e o excedente é injetado na rede, o que se converte em créditos para consumo posterior. É sobre esses créditos que incide o imposto, e sobre os quais é aplicada a isenção.
A multiplicação dos “prosumidores”
O número de sistemas fotovoltaicos cresceu muito rapidamente nos últimos três anos no Brasil, com milhares de clientes assumindo o papel de “prosumidores” e gerando a própria energia. Em outubro de 2016, eram cinco mil brasileiros nessa condição. Três meses depois, em janeiro de 2017, o país tinha 7.504 conexões fotovoltaicas e, em novembro do mesmo ano, o número já havia mais que dobrado, chegando a 16,3 mil conexões domésticas e comerciais. Hoje são 42.701 fotovoltaicas, mas amanhã esse número já será diferente. A cada dia, o número muda no site da Aneel que monitora o avanço da geração distribuída no país.
O presidente da Cemig Geração Distribuída atribuiu a expansão desse mercado ao aprimoramento, em 2016, da resolução da Aneel, que passou a permitir a geração fosse feita distante do ponto de consumo. Essa possibilidade, que não existia antes, na resolução 482, trouxe oportunidades de negócio para atender os chamados consumidores “sem telhado”.
Segundo Neves, a modalidade que mais tem crescido em Minas é justamente a de fazendas solares, com empreendimentos de até 5 MW. “A pessoa faz um arrendamento de uma fatia da planta solar e o crédito é abatido no seu CPF ou CNPJ. O modelo para a geração de telhado ainda precisa ser aperfeiçoado, tem poucas linhas de financiamento e um payback [tempo de retorno do investimento] alto, superior a cinco anos”.
Embora a Cemig tenha 93% do mercado de geração distribuída de Minas, as 7.594 conexões fotovoltaicas conectadas à sua rede representam um traço no mercado da distribuidora. Mesmo assim, a empresa criou há cerca de 90 dias a divisão de Geração Distribuída (GD), da qual Neves é presidente, porque acredita no potencial deste mercado.
“Tem uma discussão do impacto da GD na distribuidora, mas estamos numa postura de encontrar o ponto de equilíbrio. Nós não estamos reagindo e resistindo; queremos nos posicionar de maneira forte nesse mercado”.