O engenheiro Ozires Silva, 81 anos, não esquece a mãozinha do destino quando, em abril de 1969, o avião do então presidente Artur da Costa e Silva, impedido de pousar em Guaratinguetá (SP) por causa de um nevoeiro, mudou o pouso para São José dos Campos (SP).
O então major Ozires era a maior autoridade do Centro Técnico Aeroespacial (CTA) naquele dia e cabia a ele receber a inesperada visita do presidente. Sem gabinetes, sem protocolos, sem intermediários, seria uma oportunidade única para conversar com a maior autoridade do país sobre a indústria brasileira de aviões, uma ideia que havia taxiado no CTA depois da criação do primeiro avião de testes 100% brasileiro, o Bandeirante, que não decolava por ceticismo dos militares e do governo.
Durante a hora em que Costa e Silva esteve no CTA, Ozires percorreu os hangares e vendeu ao presidente a ideia de fabricação do Bandeirante para a Força Aérea Brasileira (FAB). Costa e Silva prometeu "examinar a ideia". Dois meses depois, Ozires foi a Brasília explicar a uma turma de ministros o projeto. O então ministro da Fazenda, Delfim Netto, de início relutante por causa dos custos de um projeto dessa envergadura, acabou se animando. "E qual seria o nome da nova empresa?", perguntou Delfim. "Embraer: Empresa Brasileira de Aeronáutica", respondeu Ozires.
Nascia ali, finalmente, da obstinação de um grupo de militares do CTA e da quebra de hierarquia de um deles, aquela que se transformaria na terceira maior empresa de aviação do mundo, com faturamento estimado de R$ 6 bilhões em 2011. Essas e outras histórias fazem parte do livro Ozires Silva: um líder da inovação, biografia do criador da Embraer, escrita pelo engenheiro Decio Fischetti, que deve ser lançado em abril.
Um líder da inovação poderia render muito mais nas mãos de um escritor ou jornalista acostumado com biografias. O texto se mostra muitas vezes confuso. Mas a trajetória de Ozires que foi presidente da Petrobras no governo de José Sarney (1986-1988), integrou uma missão à China organizada pelo guru da administração Peter Drucker, foi superministro da Infraestrutura no governo de Fernando Collor de Mello (1990-1991), o grande executor da privatização da Embraer (1994) e presidente da Varig (2000-2002) não tem como não resultar em histórias interessantes, como as brigas com o então ministro de Minas e Energia Aureliano Chaves sobre os rumos do Proálcool, ou o pedido de demissão do governo Collor, incomodado com o grupo da República de Alagoas que levaria o presidente ao impeachment.
"Minha experiência no governo me deixou claro que, se a Embraer queria se modernizar e competir no disputado mercado internacional de aviação, a saída só poderia ser a privatização", diz Ozires. "O governo é lento e controlador. O governo tem de melhorar o ambiente de investimento, e não controlar setores industriais."
"De uma forma bem objetiva, a Embraer simplesmente não existiria sem o Ozires", resume o presidente da Embraer, Frederico Curado. Foi Ozires quem liderou o time que conduziu o processo de criação da empresa, em 1969, e se tornou seu primeiro presidente, posição que ocupou por 17 anos. Retornou em 1991 para levar a Embraer de forma segura e estável à privatização, em dezembro de 1994. Nessas duas fases absolutamente críticas na história da empresa, a liderança de Ozires Silva foi determinante para seu sucesso.