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Combustíveis

O que acontece se a Petrobras deixar de seguir a lógica de preços do mercado

Com preço de paridade de importação, Petrobras visa garantir abastecimento do mercado de combustíveis (Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo/Arquivo)

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Com a escalada de preços do barril de petróleo no mercado internacional, voltou a ser discutida por alas do governo federal a possibilidade de mudanças na política de preços de combustíveis adotada pela Petrobras. Embora rejeitada pelo núcleo econômico, o próprio presidente Jair Bolsonaro (PL) defendeu nesta semana uma revisão no modelo de preço de paridade de importação (PPI), segundo o qual a companhia reajusta os valores dos derivados do petróleo com base na cotação da commodity no mercado global.

“Tem uma legislação errada feita lá atrás que você tem uma paridade com o preço internacional. Ou seja, o petróleo — o que é tirado do petróleo — leva-se em conta o preço fora do Brasil. Isso não pode continuar acontecendo”, disse Bolsonaro em entrevista à Rádio Folha de Roraima na segunda-feira (7). “Estamos vendo isso aí, sem ter nenhum sobressalto no mercado.”

As declarações levaram às ações da petrolífera a despencarem mais de 7% no pregão. Isso porque o mercado vê a possibilidade de mudança na PPI como uma intervenção do estado no setor de combustíveis. O alinhamento dos preços da Petrobras à livre flutuação do mercado visa tornar o setor competitivo para que a iniciativa privada também produza e importe derivados, uma vez que a estatal não é capaz de suprir toda a demanda interna.

“A Petrobras tinha o monopólio do refino e, lá atrás, da importação. Hoje importadores podem importar, e a própria Petrobras não quer ser garantidora do abastecimento do país. Por isso, dependemos que empresas importadoras possam agir para ter essa garantia”, explica Helder Queiroz, do Grupo de Economia da Energia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

“Essas empresas dependem de critérios de preços que estejam, pelo menos, alinhadas com os preços lá fora. Se tiver que importar e vender por um preço mais baixo do que importou, vai deixar de importar e aí podemos ter problemas com abastecimento”, diz o economista, que foi diretor da Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP).

A PPI foi instituída em 2016, durante o governo de Michel Temer (MDB), quando o economista Pedro Parente estava à frente da Petrobras. A medida foi adotada depois de anos de prejuízos da companhia em razão de uma política de controle de preços na estatal na gestão da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

“Se a Petrobras praticar um preço abaixo do valor de mercado, certamente, estará prejudicando a livre concorrência e os demais players do mercado, que já é dominado pela Petrobras”, concorda o economista Paulo Uebel, ex-secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia.

Para Uebel, qualquer tentativa de reduzir os preços dos combustíveis por parte da União deve ser feita com recursos do Tesouro e não por conta da margem de lucro da Petrobras. “Se o governo quiser subsidiar alguém, deveria fazer isso com recursos próprios, jamais com recursos da companhia”, diz.

Queiroz concorda, mas defende que o governo deve buscar medidas específicas para cada tipo de combustível. “Querosene de aviação é diferente do GLP, que é diferente da gasolina e do diesel. O mercado é diferente, os players são diferentes”, explica. “O diesel entra no custo de todas as mercadorias por causa da predominância do modal rodoviário no transporte de carga do país.”

“A gasolina é um bem consumido por uma parcela pequena da população, de 20% a 25%, que tem carro. Seria um benefício regressivo subsidiá-la. Não faz sentido do ponto de vista da equidade distributiva. Além do que a gente tem no país uma solução de competição interenergética, que é o etanol. Se você subsidia a gasolina, você mata a cadeia do etanol”, ressalta. “O GLP é diferente, é essencial, pesa muito no orçamento das famílias. Ali tem espaço para fazer uma política pública.”

Senado aprova projeto que muda PPI pouco após Petrobras anunciar reajuste

Nesta quinta-feira (10), após 57 dias sem reajustar os preços de gasolina e óleo diesel e 152 sem alterar o valor praticado no gás de cozinha vendido às distribuidoras, a Petrobras anunciou um aumento para reduzir a defasagem em relação à cotação internacional. Os papéis preferenciais da empresa na B3 chegaram a valorizar 6,1% na máxima do dia.

“Após serem observados preços em patamares consistentemente elevados, tornou-se necessário que a Petrobras promova ajustes nos seus preços de venda às distribuidoras para que o mercado brasileiro continue sendo suprido, sem riscos de desabastecimento, pelos diferentes atores responsáveis pelo atendimento às diversas regiões brasileiras: distribuidores, importadores e outros produtores, além da Petrobras”, justificou a companhia.

Na quarta-feira (9), a Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom) chegou a calcular uma diferença de 40% no preço médio do óleo diesel praticado no Brasil com o valor de mercado, o que inviabilizaria as operações de importação, segundo a entidade.

Poucas horas após a Petrobras divulgar o reajuste, que passa a vigorar a partir desta sexta-feira (11), o Senado aprovou um projeto de lei que promove uma mudança no PPI. Além da cotação internacional e dos custos de importação, o texto prevê que o preço do mercado de combustíveis considere também despesas internas de produção, que, desindexadas do câmbio, reduziriam os preços no mercado interno.

“O que a gente está vivendo é muita incerteza sobre qual vai ser o futuro da política de preços de derivados. Essa incerteza é ruim para o mercado, dificulta o processo de abertura do mercado de competição”, diz Marcelo Canêdo, da Escola Brasileira de Economia e Finanças (EPGE) da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

“Se você tem alguns bilhões de dólares, você coloca em algum lugar onde você sabe que o preço do produto que vende vai ser determinado pelo praticado no mercado. Ter certeza sobre isso é uma preocupação a menos”, explica. “E está claro que a política de preços, mesmo neste governo, não está muito segura. Claramente há ao menos uma ala do governo que gostaria de desfazer isso, fora declarações de outros candidatos a presidente, como Lula [PT] e Ciro [Gomes (PDT)], que já expressaram o desejo de desfazer. Essa incerteza toda certamente atrapalha.”

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