Apita o árbitro. Se deu nesta quinta-feira, às 12h30, o início oficial de uma batalha no futebol paulista em que os protagonistas não são os jogadores em si, mas suas camisas – e a visibilidade que elas trazem.
O banco mineiro BMG oficializou patrocínio máster que deve render, no mínimo, cerca de R$ 30 milhões por ano ao Corinthians – clube que ficou um ano “órfão” após término do último contrato grande com a Caixa Econômica Federal. Do outro lado, claro, está a Crefisa, melhor amiga do Palmeiras desde 2015 que aplicou R$ 78 milhões no clube só em 2018.
As primeiras faíscas apareceram nas redes sociais. Na quarta-feira à noite, o Twitter oficial do BMG lançou a mensagem “se esse perfil passar de 21.813 seguidores até às 23h59 de hoje, esclareceremos alguns rumores amanhã, fielmente às 12h30”. Nada muito direto, mas a executiva Leila Pereira e a Crefisa entenderam o recado.
“#QuemTemMaisTemCrefisa”, tuitou a conselheira do Verdão, sugerindo que seus seguidores passassem a seguir também a arroba da financeira. Na página da empresa, outra provocação, fazendo referência à nova campanha de marketing do atual campeão brasileiro: “a cor da inveja está tirando seu sono?”. A esta última mensagem até o Twitter oficial do Corinthians respondeu, comparando títulos.
Segundo César Grafietti, consultor do Itaú BBA e especialista em finanças no futebol, essa estratégia especificamente não é bem vista por especialistas em marketing. “Apesar de gerar exposição, acaba associada à rejeição de outras torcidas, o que é ruim”, explica.
Rivalidade no mundo do crédito
Mas este dérbi não vai ficar só nas redes sociais, tampouco restrito ao gramado. Por trás, há uma batalha interessante entre duas concorrentes diretas no mercado de crédito pessoal brasileiro.
Estampar a camisa de um dos maiores clubes de futebol no país é uma exposição imensurável. E o BMG é um banco que já deixou clara a sua intenção de crescer rapidamente nos próximos meses e anos.
No ano passado, o banco ensaiou uma abertura de capital (IPO) na bolsa de valores para dezembro, ambicionando levantar algo entre R$ 1,8 e R$ 2 bilhões. Entre as maiores apostas, uma categoria nova de produto financeiro: o cartão de crédito consignado.
Um analista do setor que acompanhou de perto as negociações ao longo de 2018 confirmou a importância dessa frente para a empresa, que atualmente tem nada menos que 70% do mercado de crédito consignado no país.
Rodrigo Glatt, sócio da GTI Capital, explica que a maior ameaça neste produto em específico não é a Crefisa, e sim a Caixa Econômica Federal. O presidente da estatal, Pedro Guimarães, citou diretamente o crédito consignado como uma das categorias de negócios subpenetradas pela instituição. Considerando a gigantesca base de clientes, tanto do FGTS como correntistas, o potencial é claro.
Aposta na fidelidade do torcedor
Obviamente, não é necessário ser torcedor do Corinthians para se tornar cliente do BMG, ou do Palmeiras para usar os serviços da Crefisa. Mas, com estimados 30 milhões de torcedores, a exposição na camisa do Timão é “inegável”, comenta o analista.
“O posicionamento do BMG hoje contempla essas duas plataformas, seja a de uma financeira “high yield”, seja a de um banco digital”, lembra Grafietti. “Então, a estratégia de se posicionar como um contraponto à Crefisa vem na linha da rivalidade entre Corinthians e Palmeiras, ainda mais acirrada por terem conquistado os últimos 4 campeonatos brasileiros”, complementa.
O gasto também está controlado. Segundo ele, o BMG é suficientemente capitalizado para uma aposta deste tamanho em marketing, mesmo antes do IPO. A estimativa é que o banco feche 2018 com lucro próximo de R$ 300 milhões.
Fora isso, a própria Crefisa já deixou claro, em inúmeras ocasiões, o bem financeiro que a camisa verde e branca fez para os negócios. Em uma ocasião, o dono da empresa, José Roberto Lamachia, fez a Mauro Cezar Pereira uma pergunta tanto emblemática quanto retórica: “você conhecia a Crefisa antes de patrocinarmos o Palmeiras?”.
Negócios e paixão
Apesar das provocações, e impossível prever se o patrocínio do BMG ao Corinthians chegará ao patamar do que a Crefisa fez pelo Palmeiras, de acordo com Grafietti.
Por motivos emocionais (leia-se Leila Pereira, palmeirense fanática com intenção de presidir o clube) a financeira fez mais que o esperado pelo clube desde o início do contrato. Entre os feitos mais emblemáticos, acobertou custos do clube onde patrocinadores comuns dificilmente entrariam, pagando salários, cobrindo compras de jogadores, entre outros “presentes”.
Enquanto isso, o BMG tem pouco (ou nenhum) laço afetivo com o Corinthians. O mineiro Ricardo Guimarães, CEO do banco, é tão atleticano que chegou a ser presidente do Galo entre 2001 e 2006. A instituição também é dona de outro clube de Minas, o Coimbra. Por tudo isso, a maior aposta no mercado é que o patrocínio, mesmo que alto, seja apenas um patrocínio.
Quanto à captação financeira via mercado de valores, é praticamente consenso: ainda deve ocorrer. Provavelmente neste ano – para Glatt, este semestre é uma estimativa razoável.
Ele explica que, se tudo ocorresse conforme o planejado, o timing do patrocínio seria nada menos que ideal: o banco estaria usando parte do valor captado em marketing, para impulsionar os negócios. “Nem sempre as coisas são na hora que a gente quer”, diz.