Embora tenha melhorado ligeiramente suas projeções para o PIB de 2022, o mercado não modificou suas estimativas de baixo crescimento econômico em 2023.
De acordo com a última edição do boletim Focus, a mediana das expectativas de instituições financeiras do país para a variação do PIB nacional neste ano subiu de 0,3% para 0,42%. Porém, para o próximo ano a previsão mediana se manteve em 1,5% pela terceira semana seguida. Em seu melhor momento, os prognósticos de bancos e corretoras para 2023 apontaram para um crescimento econômico de 2,5%, mas as expectativas passaram a cair a partir de setembro.
Comparativamente, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) estima que o PIB global deve avançar 4,5% em 2022 e 3,2% em 2023, enquanto os 38 países membros do grupo devem crescer, respectivamente, 3,9% e 2,5%.
Na avaliação de boa parte dos economistas, a atividade econômica do país ainda deve sofrer as consequências da desaceleração provocada pela alta na taxa básica de juros. No esforço para conter a pressão inflacionária, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) já elevou a 10,75% a taxa Selic, que estava em 2% até março de 2021.
O comitê sinaliza que ainda haverá novas altas nas próximas reuniões, com a perspectiva de alcançar os 12,25%, segundo a mediana das projeções mais recentes coletadas pelo Focus. Porém, algumas instituições já preveem um juro básico de até 14% como consequência das pressões inflacionárias geradas pela guerra na Ucrânia.
A medida torna o crédito mais caro, desestimulando o consumo e, portanto, a elevação de preços. Por outro lado, os juros mais altos também desestimulam a atividade econômica, dificultando o crescimento. “São 10 pontos porcentuais de alta [caso a taxa chegue à casa dos 12%] que, de fato, atrapalha o funcionamento da economia como um todo, a forma como as empresas acessam crédito e até mesmo a dívida das empresas. Sobra menos dinheiro para as empresas investirem ou tomarem crédito para novos empreendimentos, que fica mais caro”, explica Samuel Cunha, economista e sócio da H3 Invest.
Com uma expectativa de IPCA em alta há oito semanas (agora é de 5,65% para 2022, mais de meio ponto acima do teto da meta do BC), a tendência é de que a taxa básica de juros se mantenha em níveis elevados. Por ora, a mediana das projeções do mercado indica que o ano deve virar com uma Selic a 12,25% para só em janeiro de 2023 iniciar um ciclo de baixa que, segundo a mediana das expectativas, a levará a 8,25% até o fim de 2023 – até semana passada, esperava-se taxa ligeiramente menor, de 8%.
“Ainda vamos estar sob o impacto de juros elevados. É provável que a Selic fique nesse patamar ainda o ano inteiro. A gente vê que esse impacto não fica restrito a 2022”, diz Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados.
“É um cenário de recuperação muito lenta. É uma conjunção de saída da pandemia com inflação elevada, fiscal deteriorado, e isso, para política monetária, é o pior dos mundos. Joga a taxa de juros em um patamar que, infelizmente, impede que a recuperação da economia possa ser melhor do que está sendo”, explica Vale.
Cunha pondera, por outro lado, que o baixo crescimento é preferível a um quadro de inflação desenfreada. “É claro que a taxa de juros mais elevada atrapalha a economia, mas ficar em um nível de inflação que a gente teve ao longo de 2021 tende a ser muito mais prejudicial, considerando o prazo consolidado”, diz.
Cenário político também afeta projeções para PIB de 2023
O segundo motivo para a cautela nas expectativas do mercado é o cenário político. A incerteza em relação à política econômica do próximo governo dificulta qualquer prognóstico mais otimista.
“Os pré-candidatos que estão aí têm colocado uma agenda de certa forma preocupante, que a gente precisa acompanhar”, diz Vale. “A gestão que vai herdar essa situação fiscal bastante deteriorada vai ter que lidar com isso de forma equilibrada, e não está claro se o governo que vier vai conseguir fazer isso.”
O sócio da H3 concorda. “Os dois candidatos que estão à frente das pesquisas hoje são muito contrários em termos de ideologia e de propostas, mas de ambos os lados há pontos negativos para a economia como um todo”, diz Cunha.
“Tanto uma possível eleição do Lula [PT] como uma eventual reeleição do [Jair] Bolsonaro [PL]. A gente viu, principalmente nos últimos seis meses, que ambos são candidatos populistas, que tendem a visar uma política fiscal mais expansionista. É isso que o mercado enxerga como negativo e que pode, sem dúvida, afastar investidores”, afirma.
Para Vale, um cenário que poderia impulsionar a economia exigiria uma conjunção de medidas que parece distante de acontecer. “Se o Lula ganhar, o melhor que a gente poderia ter seria ele sinalizar que vai fazer uma manutenção das boas práticas, do que teve de positivo ao longo do governo atual. Não foram tantas coisas assim, mas é não tentar reinventar a roda no que foi mudado”, analisa.
“Tentar quebrar a regra do teto, rever a lei de independência do BC, esse tipo de discussão, não ajuda. O melhor que o governo poderia fazer seria reforçar uma agenda relacionada à reforma tributária, deixar a regra do teto para ser discutida só em 2026, que é o que constitucionalmente se espera. Aí estaria entregando uma notícia espetacular para o mercado e provavelmente teria um cenário de tranquilidade muito grande. Mas não dá pra saber se vai ser isso de fato que vai acontecer”, diz o economista-chefe da MB.
A depender de sua duração, a guerra na Ucrânia também tende a ter efeito sobre a economia mundial e, consequentemente, brasileira. Porém, o mercado ainda observa com cautela essa questão – a mediana das expectativas para 2023 não foi alterada após o início do conflito.
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