Chinesa Huawei ultrapassou a Apple e é a segunda marca que mais vende smartphones no mundo| Foto: Luis Gene/AFP

A indústria de smartphones chinesa assumiu um protagonismo involuntário na guerra de comercial de seu país com os Estados Unidos. Também pudera: cada vez mais, nomes como Huawei e Xiaomi conquistam consumidores do mundo todo, destronando nomes tradicionais como Motorola e até a Apple. Mas têm um mercado entre os mais importantes do mundo em que as marcas da China sempre batem na trave: o brasileiro.

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São marcas que estão ganhando o mercado global com muita agressividade. De 9.º lugar, em 2016, a Xiaomi passou para 4.º, este ano, no ranking da IDC, que monitora as vendas de smartphones ao redor do mundo. A Huawei ultrapassou a Apple e se consagrou como a segunda fabricante em número de aparelhos vendidos, atrás apenas da Samsung.

Enquanto o mercado global de smartphones diminuiu — queda de quase 2% no segundo quadrimestre, em relação ao mesmo período do ano passado — os chineses avançam a galope. A Huawei aumentou seu market share de 11% para 15,8%, neste intervalo. Muito impulsionada pela linha de celulares de ponta P20, que ocupa uma faixa de preço (US$ 600 a US$ 800) similar à do iPhone Xr, nos EUA.

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A capacidade da empresa de manter o ritmo acelerado de crescimento é considerada “impressionante, para dizer o mínimo”, pelo IDC, que atribui o fato à capacidade da empresa de crescer rapidamente em mercados onde, até pouco tempo, era desconhecida.

Há uma expectativa de que este movimento ocorra no Brasil. Com uma população aficionada por smartphones, o país é o 4.º mercado do planeta em número de vendas. A Huawei, que há duas décadas opera no país no setor de infraestrutura, tentou entrar com celulares de baixo custo em 2013, mas o projeto foi descontinuado.

No meio do ano, a marca chegou a anunciar um retorno ao país por meio de uma parceria com a fabricante nacional Positivo. Mas o projeto entrou na geladeira.

Em nota, a Positivo Tecnologia informou que “diante de todos os acontecimentos recentes”, ainda está “em fase de discussão com a Huawei sobre se irá participar e como será sua eventual entrada no Brasil”.

No início de dezembro, uma das principais executivas da empresa, a CFO Meng Wanzhou, foi presa no Canadá, a pedido do governo norte-americano. A empresa é acusada de vender produtos para o embargado Irã. Mas, nos bastidores, há quem desconfia de que riscos de espionagem e a ameaça ao domínio da americana Apple seriam os reais motivos para a prisão.

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Questionada sobre a possibilidade de voltar a vender celulares no Brasil em breve, a Huawei disse, em nota à reportagem, não comentar “rumores e especulações”. Sem mencionar a Positivo, a empresa destacou o mercado brasileiro como importante em sua estratégia de levar soluções de tecnologia ao consumidor.

“Baseados nas oportunidades de negócios, continuaremos a estudar o mercado e avaliar os melhores produtos e experiências necessárias para atender à demanda e expectativas dos brasileiros”, diz a nota.

Outra marca chinesa, a ZTE, firmou recentemente parceria com a brasileira Multilaser, para vender tanto equipamentos de infraestrutura quanto celulares de forma conjunta, no Brasil.

Muito presente no mercado americano, a ZTE foi prejudicada, nos últimos anos, por sanções do governo dos Estados Unidos similares às que a Huawei está sofrendo.

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A Xiaomi, considerada a “Apple chinesa” também se aventurou por aqui, em 2015. A estreia foi liderada por seu vice-presidente internacional, o brasileiro Hugo Barra. Poucos meses depois, a marca começou a se retirar do mercado.

Crise brasileira e pé no freio

O mercado brasileiro é complexo. Dizem que o país não é para amadores; mas também profissionais têm dificuldade de se firmar por aqui.

“É um mercado muito particular, e toda esta confusão de entrar no Brasil acaba afastando os investidores do país “, avalia o analista de mercado em Mobile Phones & Devices da IDC Brasil, Renato Meireles. O desafio não é exclusividade dos chineses. Um bom exemplo é a Nokia, que estava certa para voltar ao Brasil em meados de 2017, mas foi postergando esta decisão, atualmente prevista para 2019.

Mas os chineses são cascudos, acostumados a entrar em mercados difíceis. A Xiaomi, por exemplo, ampliou sua liderança em relação à Samsung na Índia e na Indonésia, dois dos mercados que mais cresceram nos últimos dois anos.

O que leva a crer que a crise econômica no Brasil pode ter contribuído para as marcas colocarem um pé no freio na expansão. Entre 2015 e 2017, por exemplo, a Índia saltou de 7% para 12% na representatividade do mercado mundial de smartphones. Crescimento que foi dominado pela Xiaomi, muito graças aos celulares de entrada.

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“O Brasil é um mercado importante para você entrar. Se ele apresentasse um crescimento como foi o de 2015 e 2016 , talvez a aposta seria muito boa. Mas vemos um cenário flat, com viés de queda, ou um crescimento bem leve, nada otimista”, avalia Renato Meirelles.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]

Comportamento do consumidor brasileiro

Vencidas as barreiras econômicas e estruturais, a expansão de marcas chinesas no Brasil emperra em um fator de maior importância: o comportamento do consumidor.

Pesquisa do IDC Brasil identificou que a marca é o principal atributo, de cinco estudados, para o brasileiro escolher um aparelho de celular. Samsung, Motorola, LG e Apple são as mais lembradas pelo consumidor. A Xiaomi fica em 8.º, e a Huawei, em 11.º. Ficam atrás até da Nokia, que sequer comercializa seus aparelhos no país.

No Brasil, telefone não é somente um aparelho funcional. Ele ocupa o lugar de status antigamente atribuído ao carro, avalia o especialista em tendências de consumo Roberto Kanter, professor dos MBAs FGV.

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“As pessoas compram muito mais do que características técnicas. Elas compram a inteligência de atributo que envolve a marca, o design”, explica.

Para fazer sucesso no país, as marcas precisam reunir um conjunto de atributos que vai além de ter bons produtos, e inclui redes de assistência técnica, logística, e uma comunicação que faça sentido para o público local.

Parcerias sino-brasileiras

A parceria com empresas locais, como a ZTE iniciou com a Multilaser e a Huawei ensaiou com a Positivo, parece uma boa alternativa para crescer no mercado brasileiro.

Roberto Kanter, da FGV, faz um paralelo com o mercado de carros. Também lá as marcas chinesas patinam para entrar no Brasil. Mas iniciativa recente da Chery seguiu os passos da sul-coreana Hyundai, que atua no mês em joint venture com o grupo Caoa.

Uma iniciativa que deve ser observada é a da TCL. A fabricante chinesa de celulares já atuou no Brasil como Alcatel e, recentemente, lançou celulares voltados a um público de classe média, em parceria com a Semp (famosa por representar a japonesa Toshiba).

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“A TCL fez uma estratégia correta e que está dando certo: num primeiro momento traz produtos importados para ver a aderência, depois entra com a fabricação local e então com a divulgação”, analisa Renato Meirelles.

O ponto-chave é que as marcas chinesas já tem atributos técnicos para superar o grande estigma do brasileiro: de que os produtos vindos da China são de baixa qualidade. Mas será preciso aliar isso a um investimento forte em trazer portfólio para o país e construção de marca para reverter este potencial em um market share de relevância.