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Cogitada pelo presidente Jair Bolsonaro, a privatização da Petrobras é vista com certo ceticismo por parlamentares do Congresso. Tanto críticos quanto defensores da matéria afirmam que a proposta é apenas uma “demagogia” do Palácio do Planalto e que seria inviável discuti-la no atual mandato de Bolsonaro, que se encerra em 2022. Para que a estatal seja privatizada, é preciso que o Congresso autorize.
A privatização da petroleira — e das demais estatais — sempre esteve nos planos do ministro da Economia, Paulo Guedes, mas ele pouco falava no assunto porque Bolsonaro costumava deixar a companhia fora da lista de "privatizáveis". Agora, com o próprio presidente falando no assunto, Guedes passou a dar mais ênfase à ideia de vender a empresa.
Recentemente, o ministro afirmou que a empresa valerá “zero” daqui a 30 anos, em função da redução do uso do petróleo como combustível. “Bastou o presidente falar ‘vamos estudar’, e o negócio [a ação da Petrobras] sai subindo e 'aparece' R$ 100 bilhões. Não dá para dar R$ 30 bilhões para os mais frágeis num momento terrível como esse, se basta uma frase do presidente para aparecer R$ 100 bilhões, brotar no chão de repente. Por que nós não podemos pensar ousadamente a respeito disso?”, disse o ministro.
Uma das possibilidades cogitadas pelo Planalto é a apresentação de um projeto de lei que permita à União começar a se desfazer das ações da Petrobras de forma a perder o controle direto da empresa. Hoje o Executivo tem o controle por meio de 50,5% das ações ordinárias, as que dão direito a voto. A proposta, no entanto, é de que o governo manteria a chamada “golden share”, que o permitiria vetar determinadas operações e ainda indicar o presidente da empresa.
O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), confirma as intenções do Palácio do Planalto, mas, segundo ele, o debate ainda é inicial. “O governo está estudando, mas não tem nada definitivo”, afirmou o emedebista.
O vice-líder do governo na Câmara, José Medeiros (Podemos-MT), defende que o governo deu um “primeiro passo” para a discussão da privatização. “Esse Congresso já demonstrou que está pronto para discutir reformas importantes. Eu penso que o Brasil precisa se livrar dessas vacas sagradas e acabar com o monopólio. O presidente Bolsonaro está iniciando um debate importantíssimo”, diz Medeiros.
Aliada do governo, a deputada Alê Silva (PSL-MG) vê na privatização da empresa uma forma de acabar com o monopólio. “Que se entregue a Petrobras à iniciativa privada, que se quebre o seu monopólio, que se abra a concorrência. Porque somente num mercado livre, de livre comércio, aberto à concorrência, é que se pode garantir uma redução fiel de preços sem a intervenção do Estado, o que sempre se demonstrou altamente maléfico”, afirma.
Líderes partidários não acreditam na intenção do Palácio do Planalto
Defensor da privatização, o líder do Novo na Câmara, deputado Paulo Ganime (RJ), afirma, no entanto, que a fala de Bolsonaro foi apenas um “balão de ensaio” do governo. “Eu sou super favorável [à privatização], mas acho que o presidente da República, não. Isso foi um balão de ensaio. Fora que seria muito difícil avançar com algo assim faltando menos de um ano para as eleições”, argumenta.
Na mesma linha, o deputado Kim Kataguiri (SP), vice-líder do DEM, afirma não acreditar nas intenções do governo de vender a empresa. “Zero chance, hoje. Mesmo o presidente já disse que a empresa ‘dá lucro demais’. Não há a menor intenção de privatizar a estatal”, diz.
Na oposição, o deputado Orlando Silva (SP), vice-líder do PCdoB, afirma que “os entreguistas dolarizaram o preço da gasolina e desmoralizaram a Petrobras para depois vender”. “Não permitiremos nunca”, afirma.
Para o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), o governo está “transferindo” a culpa pelo preço dos combustíveis para a Petrobras. “Querem construir um senso comum, e o presidente Jair Bolsonaro, depois da demagogia de jogar a culpa no ICMS nos governadores e perceber que não haverá alteração de preço, transferiu-a agora para a Petrobras e propôs a sua privatização”, diz.
Reservadamente, líderes do Centrão, partidos que compõem a base do governo no Congresso, também admitem que são poucas as chances de uma privatização da estatal avançar. “O governo não conseguiu enviar nem projetos de reformas. Imagina para vender a Petrobras... No ano que vem teremos eleições. Ninguém vai mexer com isso”, admite um congressista do Centrão.
Presidentes da Câmara e do Senado divergem sobre privatização da Petrobras
Uma eventual privatização da Petrobras também é motivo de divergências entre o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Recentemente, Lira afirmou que que a discussão gira em torno do “monopólio absurdo do preço do gás e falta de política de investimento energético”. “Essa é a pergunta que tem que ser feita: então não seria o caso de privatizar a Petrobras? Não seria a hora de se discutir qual a função da Petrobras no Brasil? É só distribuir dividendos para os acionistas?”, questionou Lira durante entrevista à rádio CNN.
Na contramão, o presidente do Senado afirmou que essa “essa discussão de privatização da Petrobras não deveria vir agora. Nós não temos que tratar disso. O problema dos preços de combustível envolve sobretudo estabilidade. O Brasil precisa de estabilidade, inclusive estabilidade política. Todo mundo que está propondo soluções das mais diversas podia contribuir com a estabilidade”, afirmou.
Mesmo assim, Pacheco afirmou que o Brasil “tem um número muito excessivo de empresas públicas e muitas delas não deveriam ser públicas” e que “o Estado não tem vocação para ser empresário”.