A dois anos do prazo da amortização das dívidas contraídas para sua construção, a hidrelétrica binacional Itaipu pode ter seus futuros resultados financeiros – estimados em até US$ 1 bilhão por ano – comprometidos desde já. Isso deve acontecer caso sejam aprovadas as condições do atual texto da medida provisória 1.031, que abre caminho para a privatização da Eletrobras.
Hoje, praticamente metade do valor que Itaipu recebe pela geração de energia é usada para pagar o financiamento de sua construção. Como a dívida deve ser quitada até 2023, dali em diante esse dinheiro poderá ter outro destino.
Na visão de analistas, a realocação de recursos proposta pelo relator transcende o setor elétrico e, portanto, não deveria ser discutida no âmbito da MP. A medida foi aprovada pela Câmara dos Deputados e agora tramita no Senado Federal. Caso os senadores modifiquem o texto, a proposta volta para a análise dos deputados. Se não for aprovada em definitivo até dia 22, perderá a validade.
Ligadas à Eletrobras, Itaipu e Eletronuclear – responsável pelas usinas de Angra 1, 2 e 3 – não podem ser privatizadas. Após uma reestruturação societária para mantê-las sob controle direto ou indireto da União, elas devem ficar sob gestão de uma nova estatal ou empresa de economia mista.
No caso de Itaipu, isso atende ao que foi disposto no tratado entre o Brasil e o Paraguai para o aproveitamento hidroelétrico dos recursos hídricos do Rio Paraná, que pertence aos dois países. Pelo acordo, assinado em 1973, cada país tem direito à metade da energia gerada pela usina e vende ao outro a parcela que não utilizar.
O relator da proposta na Câmara, Elmar Nascimento (DEM-BA), afirmou em seu parecer que, do custo médio da energia suprida pela usina (US$ 42,37 por megawatt-hora em 2019), 48,9% (US$ 20,71 por MWh em 2019) são destinados à amortização de empréstimos e financiamentos, que deverão ser quitados até 2023.
Nascimento estabeleceu inicialmente que parte do superávit da Itaipu a partir de 2023 fosse destinado à revitalização de bacias hidrográficas, como as dos rios São Francisco e Parnaíba. Mas, após críticas, Nascimento recuou da ideia.
O texto final, aprovado na Câmara em 19 de maio, prevê que – até o ano de 2032 – 75% dos lucros da hidrelétrica sejam repassados à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), um fundo voltado ao custeio de políticas públicas do setor e alívio das tarifas.
"É a hora de tratar isso [excedente da Itaipu]. Porque senão nós vamos dar liberdade completa a quem estiver conduzindo Itaipu, a partir de 2024, com uma soma que se estima de um superávit financeiro na ordem de mais de US$ 1 bilhão a fazer o que quiser com esse dinheiro, conforme a decisão deles, sem que isso também passe pela nossa decisão", justificou Elmar à Agência Infra.
O parlamentar lembrou que "quem financiou a construção da usina foi o consumidor cativo, a população brasileira". "Será que não é o momento de garantir que parte desses recursos sejam investidos na CDE para garantir a questão dos valores das tarifas?", disse.
Programa de transferência de renda
A medida provisória que está no Senado determina que os restantes 25% do superávit serão reservados, até 2032, para a União aplicar em algum programa de transferência de renda. Não se sabe exatamente de qual iniciativa se trata. Interlocutores especulam que o governo deve aproveitar a renda para reformular algum programa já existente – como o Bolsa Família – ou para criar um novo, em especial após o fim do auxílio emergencial.
"O que se pretende aqui é assegurar que os resultados financeiros sejam repassados ao consumidor cativo e para a perenização dos importantes programas setoriais", defende Elmar.
De 2032 em diante, a distribuição do superávit de Itaipu será um pouco diferente, com repasses também para a empresa que vai controlá-la. A MP direciona o saldo da seguinte maneira:
- 25% à sociedade de economia mista ou estatal que vai gerir a Itaipu e Eletronuclear;
- 50% à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE); e
- 25% à União para aplicar em programa social.
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