O melhor lugar para se comprar uma pechincha em bichos de pelúcia no Dia das Crianças pode não ser necessariamente uma loja de brinquedos. Da mesma forma, aquele abacaxi "doce como mel", que parece não existir em grandes supermercados, também não é encontrado somente em barracas de feira ou no Mercado Municipal. Há oportunidades de compras que simplesmente surgem, sobre rodas, em uma esquina movimentada da cidade. Em cima de um carro ou caminhão estacionado na rua, ou até mesmo num carrinho-de-mão estrategicamente parado em frente a um banco, vende-se desde a suculenta fruta da estação até pesados cofres de 150 quilos saídos "direto da fábrica".
Cachorros e tartarugas de pelúcia grandes o suficiente para servir como colchão para crianças pequenas são companheiros de Ivo Pissato, de 43 anos, há duas décadas. Ele já foi daqueles que circulam pela rua com um bichão de pelúcia nas costas, oferecendo rifas. Anos atrás achou que os sorteios não estavam dando retorno e resolveu transformar o carro em vitrine de loja "estacionada" numa esquina do Tarumã. Enche o veículo com sofazinhos infantis e suas pelúcias gigantes e segue para o "ponto comercial". "Mal sobra espaço para mim no carro", conta o vendedor.
A ausência de despesas como aluguel, impostos e energia elétrica permite que Pissato cobre R$ 80 com uma margem de lucro de 30% por presentes que em lojas chegam a custar R$ 200. Os bichões são bonitos e bem-feitos, mas não adianta querer procurar etiqueta, esclarece o vendedor: "São produtos artesanais. Na loja se paga pela marca, aqui não. As pessoas compram porque é mais barato ou porque lembram do presente, no trânsito, quando vêem as mercadorias". A venda média mensal de 30 bichões e sofazinhos é suficiente para sustentar três pessoas. "Dá para levar uma vida tranqüila, mas sem luxo", confirma o vendedor.
Se o preço baixo e o visual de cachorrões, tartarugas e personagens infantis é o que atrai clientes para Pissato, o que levaria uma pessoa a comprar um cofre vendido na carroceria de um caminhão? "É gente que já está procurando cofre para comprar e percebe que nosso preço é mais barato. A maioria passa, anota o número do telefone e liga depois. Conforme o caso, a gente até entrega o produto", diz o baiano Aparecido Carlos, de 35 anos, responsável pelos cofres. A mercadoria é fabricada em Vitória da Conquista e percorre dois mil quilômetros para chegar aqui. Os vendedores não ganham comissão. "É a fábrica quem contrata o frete até aqui. Trazemos uns 60 cofres e passamos uns três meses na cidade, depois voltamos para lá. Temos nota, estamos com toda a documentação", diz, um tanto desconfiado, o vendedor.
Os preços variam de R$ 120 a R$ 400 de cofres para embutir na parede a verdadeiros armários de ferro com trava de segurança mecânica. Eles não têm um ponto fixo de venda, mas são vistos com mais freqüência na saída para rodovias que levam ao litoral. "Às vezes passamos dias sem vender nada. A gente procura não passar muito tempo no mesmo lugar, porque tem outros vendedores de cofre que estacionam nesta mesma região", informa Aparecido Carlos.
Clientela
Preço baixo não foi o chamariz escolhido por José Barbosa, de 38 anos, para atrair clientes, no caminhão de frutas que ele mantém estacionado na Rua Marechal Floriano, no Boqueirão. "No supermercado eles (os clientes) encontram frutas mais baratas, mas certamente não são tão gostosas e selecionadas quanto as minhas", afirma. Ele diz tirar uma margem de lucro de até 100%, dependendo da fruta. "Mas tem muita coisa que eu acabo doando, porque consegui a confiança dos clientes vendendo produtos de primeira qualidade", complementa.
A qualidade que Barbosa tanto enaltece ajuda a manter a clientela, mas a simpatia dele é um ingrediente essencial no negócio. "Faço isso há 15 anos e tenho certeza de que só não ganha dinheiro no Brasil quem não se esforça. Trabalho de domingo a domingo, só paro na segunda-feira de manhã para descansar, porque o movimento é muito fraco. Tenho vários clientes fixos, gente que nem desce do carro, só me chama e diz o que está precisando. O pessoal até brinca que se eu me candidatasse a vereador, ganhava", conta. Não é falsa modéstia. Em cerca de dez minutos de conversa, pelo menos meia dúzia de carros passaram buzinando e acenando para o vendedor.
A mesma fonte de abastecimento de mercadoria de Barbosa, a Ceasa, é usada pelo casal Daiani Ferreira de França, de 23 anos, e Acir Ribeiro, de 27, para encher de abacaxis dois carrinhos-de-mão que eles "estacionam" em frente a agências bancárias movimentadas da cidade. "Já fui ajudante de cozinha, vendedora de loja e trabalhei em fábrica, fiquei desempregada e há pouco mais de dois anos comecei a trabalhar com isso, como funcionária. Juntando dinheiro durante um mês, eu e meu marido conseguimos comprar um carro e passamos a trabalhar por conta própria", explica Daiani. O casal vende em média 100 abacaxis por dia e tira em torno de R$ 40 de lucro diário. "A concorrência aumentou bastante nos últimos meses, porque tem freguesia. Os supermercados compram a fruta verde para durar mais, ela amadurece sem ficar doce. A gente escolhe só aqueles que estão no ponto para consumir. Se o abacaxi não está bonito naquele dia a gente escolhe outra fruta mais atrativa", diz a vendedora.
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