O surgimento das versões para tablets, o avanço irreversível da internet no Brasil e os novos hábitos de consumo de informação estão levando os jornais brasileiros a rediscutirem a cobrança de conteúdos digitais. A era da informação grátis na web não deve acabar, mas o fechamento para alguns assuntos exclusivos de cada veículo é iminente.
O assunto foi tema dos principais debates no VIII Seminário Nacional de Circulação da Associação Nacional dos Jornais (ANJ), realizado esta semana em São Paulo. E a monetização dos conteúdos produzidos para todas as plataformas foi um consenso entre executivos dos grandes grupos jornalísticos do país.
"Vamos parar de dar informação de graça. Não temos mais alternativa", decretou o diretor-presidente do Grupo Estado, Silvio Genesini. "Claro que há dentro do hard news (notícias factuais) as commodities, que estão circulando o tempo todo e que estarão abertas no site. Mas o conteúdo exclusivo precisa ser cobrado."
Genesini lembra que a participação da publicidade no faturamento dos jornais vem registrando queda, enquanto a circulação responde por uma fatia cada vez maior. Na internet, a tendência é a mesma. "O consumo de mídia se fragmentou e a publicidade também. A conclusão principal é que não dará para viver de publicidade porque ela não cresce em ritmo excepcionalmente grande."
Para Walter de Mattos Junior, diretor-presidente e editor do Grupo Lance!, conteúdo de valor não deve ser entregue de graça. "Mesmo sites mais bonitos e conteúdo de qualidade não foram suficientes para atrair publicidade que tornasse a operação autossuficiente. Temos que reforçar a ideia de que no mundo digital o conteúdo é pago", diz.
André Furlanetto, diretor da Unidade de Negócios Digitais da Infoglobo, lembra que até há pouco tempo os meios supervalorizavam a audiência, e a tendência era ver o crescimento no número de acessos como algo positivo. "Geralmente é algo a se comemorar, mas infelizmente as receitas publicitárias não acompanham essa grandeza", analisa. "Tem que se diferenciar, procurar ser ícone em algumas áreas, para que o público veja valor e se disponha a pagar".
Modelos
Nos Estados Unidos, os veículos buscaram monetizar seus conteúdos digitais cada um à sua forma.
O New York Times, que há quatro anos havia decretado o fim da cobrança por acesso e aberto totalmente o seu site, reviu seu posicionamento e voltou adotar o paywall (sistema de venda de conteúdos online) em março deste ano. Em seis meses, já amealhou 224 mil assinantes pagos na web e 57 mil em tablets e Kindle, além de 100 mil assinantes web patrocinados pela Ford. Um detalhe interessante é que o faturamento com a publicidade cresceu 16% após o fechamento de conteúdos.
Já o Wall Street Journal conta com 200 mil assinantes na versão tablet e mais de um milhão na edição digital, e a perspectiva é de que o número de assinantes digitais passe o de impressos até 2012.
O Philadelphia Inquires apostou em dar um "incentivo" para aumentar a base de leitores em tablets: ao adquirir o pacote digital, o assinante ganha um aparelho Android cujos preços no mercado vêm caindo e tendem a diminuir ainda mais.
No Brasil, ainda não há um modelo estabelecido e a perspectiva é que cada jornal busque o caminho mais adequado à sua realidade. Para André Furlanetto, do Infoglobo, a inexistência de um padrão não deve ser um impeditivo. "Os jornais precisam perder a síndrome do pânico de ver algo dar errado. O mundo digital é um convite à experimentação. Se uma iniciativa não der certo, tente-se outra."
A adoção do paywall, lembra, é uma operação de alta complexidade e exige ajustes por parte dos veículos. "É preciso adequar a infra-estrutura e preparar os setores de cobrança e de armazenamento de dados."
O investimento, acredita, vale à pena. "O futuro está atrelado ao sucesso nesta área."