A Organização Mundial do Comércio (OMC) condenou a proibição de importar, no Brasil, pneus remodelados, por violar regras comerciais internacionais. A decisão, ainda preliminar, foi uma derrota para o país em sua política para pneus remodelados, mas o governo brasileiro se diz "satisfeito" e classifica de "totalmente equivocada" a interpretação de que a OMC obrigará o Brasil a abrir seu mercado à importação desses pneus.

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Apesar da condenação às atuais regras restritivas à importação de pneus remodelados, a OMC reconheceu o direito do Brasil a usar razões ecológicas e de saúde para impedir importação de produtos considerados danosos ao meio ambiente - por essa razão autoridades brasileiras afirmaram ontem que há possibilidade de que o Brasil não apele da decisão do panel da OMC. Avalia-se, em Brasília, que "ajustes" serão necessários para barrar os pneus recauchutados.

As implicações do caso dos pneus para futuros conflitos entre regras internacionais de comércio e políticas nacionais de proteção ao meio ambiente e à saúde tornam um exemplo de enorme importância a disputa entre UE e Brasil. Nada menos que 12 integrantes da OMC, entre eles Estados Unidos, México, Japão, Argentina, Chile e Austrália participam do processo como "terceiras partes interessadas". A disputa, altamente polêmica, é a primeira em que um país desenvolvido questiona uma medida ambiental de uma nação em desenvolvimento.

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Um dos pontos fracos da política brasileira é a permissão concedida aos sócios do Mercosul para venda de pneus remodelados ao mercado brasileiro, que tem permitido ao Uruguai exportar ao país, anualmente, cerca de 100 mil unidades do produto. Técnicos do governo informavam, ontem, que o resultado da avaliação do " panel " da OMC reforça a intenção do Brasil de negociar com o governo do Uruguai um acordo, com compensações, para que os uruguaios passem a vender a outros países mercadorias fabricadas a partir de resíduos danosos ao meio ambiente, como os pneus remodelados.

"Podemos dizer com satisfação que o texto (da OMC), em sua maior parte, contém elementos amplamente favoráveis às teses brasileiras", afirmou o subsecretário-geral de Assuntos Econômicos e Tecnológicos do Ministério de Relações Exteriores, Roberto Azevedo. Azevedo ressalvou que " as conclusões finais da OMC, se mantidas, poderão demandar ações adicionais do governo brasileiro" .

O diplomata não quis informar que medidas poderiam ser necessárias, argumentando que as regras da OMC determinam sigilo. Ele admitiu que o tratamento dado ao Uruguai foi tema de análise na OMC. O Brasil e a Argentina foram proibidos pelos órgãos de solução de controvérsias do Mercosul de impedir a entrada de pneus recauchutados do Uruguai.

Fonte européia disse que, " pela primeira leitura, os europeus têm condições de estar satisfeitos " . O Valor apurou que o Brasil perdeu em todos os pontos do contencioso. Além de acolher a queixa européia, contra tratamento diferenciado para os parceiros do Mercosul, a OMC rejeitou também argumentação brasileira de que falta capacidade no país para a destruição apropriada dos pneus usados, especialmente com as importações crescentes originárias da UE.

O governo brasileiro, que ainda digere o relatório, de mais de 300 páginas, acredita ter conseguido uma aprovação importante da OMC, que reconheceu o direito do país de acionar, no caso dos pneus, o artigo 20 do acordo constitutivo da organização, que permite barreiras ao comércio por motivos como a proteção ambiental. Caberia atender às ressalvas levantadas no relatório sobre a forma como se proíbe atualmente a importação dos pneus. A regra da OMC exige que nenhuma restrição por razões ambientais ou outras provoque discriminação "arbitrária ou injustificada" entre membros da OMC ou esconda ações protecionistas.

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A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva - que Azevedo afirmou ter sido fundamental para mostrar aos árbitros da OMC a boa fé do Brasil -, afirmou que, embora também seja contrária à entrada dos pneus uruguaios, a possibilidade de importação dos pneus europeus é uma ameaça ainda maior ao meio ambiente.

"O Brasil foi vencido no tribunal do Mercosul, onde usou argumentos comerciais", comentou Marina, que, insiste no argumento de dano ambiental. "A Europa proibiu que os pneus usados sejam depositados em aterros sanitários, o que vai obrigar os europeus a encontrarem um destino para 80 milhões de pneus por ano" , disse. "Importamos anualmente 100 mil pneus do Uruguai. Embora sejamos contra, em princípio, há que se considerar os volumes envolvidos."

A associação dos produtores de pneus recauchutados da Europa comemorou ontem a decisão da OMC e prevê que seis empresas da Grã-Bretanha, Itália, Portugal e Espanha vão querer retomar rapidamente as exportações para o pais. Isso, porém, dificilmente acontecerá, porque os prazos para recursos e implementação das decisões da OMC podem prolongar a disputa por mais vários meses.

O Ministério do Meio Ambiente calcula existirem 1,3 mil reformadoras de pneus no país, que teriam uma enorme margem de lucro: um pneu usado é importado por US$ 0,20 a US$ 0,60 e vendido por cerca de US$ 20. Reformado, o preço chega a US$ 70.

A Associação Brasileira do Segmento de Reforma de Pneus (ABR) diz que o Brasil tem hoje uma das legislações para pneus das mais rigorosas - a Resolução 258 do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), de 26 de agosto de 1999. Em sua essência, vincula a fabricação de pneus no Brasil e a importação de qualquer tipo de pneu ao equivalente a 1,25 de pneus destruídos ou reciclados de forma ambientalmente adequada.

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