Os empresários “estão esperando que haja governo” para voltarem a investir no País, segundo Delfim Netto, ex-ministro da Fazenda. Em entrevista, ele ressalta que a presidente Dilma Rousseff precisa “assumir a presidência” para gerar o equilíbrio fiscal estrutural.
Para isso, segundo Delfim, Dilma precisará enviar ao Congresso com urgência propostas de reformas que vão consertar as contas públicas no longo prazo: Previdência Social, legislação trabalhista, desindexação e desvinculação de receitas do Orçamento.
Para abrir esse caminho, a presidente Dilma Rousseff tomou iniciativa inédita de ir na sessão de abertura do Congresso para a abertura dos trabalhos legislativos deste ano. A intenção é sinalizar disposição para o diálogo e reforçar a necessidade de o Congresso se debruçar sobre as medidas de ajuste fiscal, e alertar para a necessidade da reforma da Previdência, além do retorno da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF).
“Se a presidente não agir, vamos perder mais 4% (PIB) em 2016. E em 2017, se ela não agir, vamos perder mais um pouquinho. Só vamos ter uma luz em 2018 quando se processar a eleição.”
A seguir, os principais trechos da entrevista:
O que a presidente Dilma Rousseff deveria fazer para retomar os investimentos e o crescimento?
A probabilidade do impeachment da presidente Dilma hoje é zero. Então, ela precisa assumir o protagonismo, a presidência. Estou propondo que ela coopte o Congresso, com projetos de reformas constitucionais e infra constitucionais que deem suporte e credibilidade ao ajuste fiscal. São elas: Previdência Social, flexibilização da legislação trabalhista, desindexação e desvinculação de receitas do Orçamento. São medidas que retomam o equilíbrio fiscal estrutural. E é isso que produzirá crescimento, que gerará equilíbrio fiscal. A sociedade está mais convencida do equilíbrio fiscal estrutural do que a Dilma.
Mas há chances do Congresso aprovar essas reformas em meio à atual crise política?
Essa dúvida deixa muito confortável o Congresso. Como a presidente não apresenta os projetos de mudança, ela é a responsável. O governo tem condições de mobilizar sua base e apresentá-las ao parlamento. Provavelmente, o Congresso terá que melhorar os projetos, haverá dificuldades para aprovação, mas sabemos que é assim.
O que os empresários estão esperando para voltarem a investir?
Eles estão esperando que haja governo. O crescimento depende só de confiança, aumento do investimento e ampliação das exportações, que estão ocorrendo com a desvalorização cambial. Só que as exportações sozinhas não tem torque para mudar muito a taxa de crescimento. O único fator que tem força é o investimento.
A presidente Dilma só conseguirá resgatar a confiança dos empresários quando enviar as propostas que o senhor defende para o Congresso?
Não tem outra saída. É o que a sociedade espera dela. A sociedade pode ser dividida em dois grupos. Num deles, há os que continuam sonhando com o impeachment, que não vão a lugar nenhum Um outro grupo está preocupado com o Brasil e sabe que o país não pode esperar mais três anos. É muito tempo, é um desastre muito grande. Já perdemos 4% do PIB em 2015 e se a presidente não agir, vamos perder mais 4% em 2016. E em 2017, se ela não agir, vamos perder mais um pouquinho. Só vamos ter uma luz em 2018 quando se processar a eleição. Na Argentina, o presidente Maurício Macri não fez nada, só espuma. Porém, o CDS do país, que era 4 vezes maior que o do Brasil, hoje está menor. Ou seja, são as expectativas dos fatos que importam.
Se a presidente enviar essas propostas ao Congresso, o que virá depois?
As pessoas verão que tem luz no fim do túnel. ‘Agora vai’, dirão E isso terá repercussões positivas em preços de ativos, como câmbio e redução de juros. E quem não aproveitar vai se dar mal, porque em dois anos o crescimento estará ai. Foi a falta de investimento nos últimos anos que reduziu a capacidade de produção brasileira. Se o Brasil poderia crescer 3,5%, 4%, hoje provavelmente não pode crescer mais do que 1,0%, 1,5%. Qualquer tentativa de empurrar, vai produzir muito mais inflação.
Como o senhor avalia a decisão do governo de tentar estimular a economia com mais crédito que virá de bancos públicos?
Isto não vai ser resolvido com crédito, mas com crescimento. O crescimento não vem do Estado, ainda que eu acredite que há uma boa margem para investimentos públicos
Se o governo agir como o senhor propôs, os investimentos poderão voltar quando?
Na margem, pode ser que no final do ano, mas se tudo for feito na direção certa.
O presidente do BC, Alexandre Tombini, fez bem em não subir a Selic?
Sim, não tenho dúvida. A semana passada revelou que o mundo estava muito pior do que se imaginava.
Mas a comunicação do BC foi muito criticada.
Foi deselegante. Mas é melhor ser deselegante certa do que elegante errada.
O governo vai registrar novo déficit primário neste ano?
Se o governo não fizer nada, seguramente ocorrerá um déficit maior do que 1% do PIB. Veja o que está ocorrendo na Previdência, nas receitas e na subestimação de algumas despesas.
Qual é a avaliação do senhor sobre a volta da CPMF?
Pode pensar na CPMF depois de fazer o que tem que ser feito na área fiscal. E a CPMF teria um prazo curto. Ai, poderia pensar. ‘Bom, fez a tarefa fiscal, vai levar um bolinho de bacalhau.’ Isto é, a CPMF valeria só para um tempo curto. Ela é tão ruim quanto qualquer imposto e é inflacionária.
Quanto deve subir a inflação neste ano?
Eu acredito que ela fica abaixo de 10%, um pouco inferior à de 2015. Todas as políticas de crédito, se tiverem algum efeito, será aumentar a inflação.
Isso ocorrerá porque com a inflação de 10,67% no ano passado, a inércia para este ano será grande?
Sim, veja as correções do salário mínimo. A indexação já está produzindo seus estragos. Hoje, a inflação de 10% é vista como número meio mágico. São dois dígitos. E há também outros, como 10 milhões de desempregados. -4% de PIB.
Com o equilíbrio fiscal, quando o Brasil poderá recuperar o grau de investimento perante a S&P e Fitch?
Põe 5 anos. O Brasil destruiu o seu patrimônio. A Petrobras vale 5% do que valia. O setor siderúrgico foi destruído. Vamos chegar em 2018 com uma renda per capital inferior ao que tínhamos em 2009 e 2010.
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