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Combustíveis

Os entraves que o Brasil precisa contornar para importar diesel da Rússia

ANP monitora risco de desabastecimento de diesel no segundo semestre (Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo/Arquivo)

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A decisão do Brasil de começar a importar diesel da Rússia diante do risco de desabastecimento interno foi recebida com ceticismo por agentes do setor, em meio às sanções econômicas que o país do Leste Europeu sofre do Ocidente desde o início da guerra na Ucrânia. Embora em termos políticos e econômicos não haja qualquer impedimento às operações, alguns entraves operacionais precisarão ser contornados.

O Brasil importa hoje cerca de 25% do que consome de óleo diesel, a maior parte proveniente dos Estados Unidos, de refinarias da região do Golfo do México. Na terça-feira (12), o ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, afirmou que o Brasil tem estoque suficiente para suprir a demanda interna por 50 dias sem a necessidade de importação. Até o início da semana, o país somava 1,6 milhão de metros cúbicos de diesel A S-10 (sem adição de biodiesel).

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A situação é monitorada pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), que vê riscos em razão do aumento da demanda pelo derivado no segundo semestre e das incertezas geradas pela situação geopolítica mundial.

Nas últimas semanas, o governo brasileiro promoveu duas reuniões entre pelo menos três exportadoras russas do combustível e distribuidoras brasileiras, segundo a agência Reuters. Os encontros tiveram a participação do embaixador russo, Alexey Kazimirovitch Labetskiy.

Pelo menos uma empresa, a catarinense Uptime Trading e Distribuição, anunciou já ter obtido autorização da ANP para fazer a importação do combustível da Rússia. Um contrato de compra de 25 mil toneladas por mês ao longo de um ano foi firmado com uma refinaria daquele país, faltando apenas a apresentação de garantias para a finalização do negócio, o que deve ocorrer em até 20 dias, segundo a CNN Brasil.

A Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom) declarou ver com ceticismo os negócios com a Rússia. “Existem muitos óbices operacionais devido à sanção estabelecida”, disse o presidente da entidade, Sergio Araujo, ao jornal Valor Econômico. Segundo ele, o Brasil já não importava diesel da Rússia mesmo antes do boicote, por questões como a oferta de diesel do Golfo do México, custo com frete e tempo de viagem.

Depois de o presidente Jair Bolsonaro (PL) anunciar o início das negociações para importação de diesel russo, o chanceler brasileiro, Carlos França, chegou a ser questionado por jornalistas a respeito da declaração em uma reunião do Conselho de Segurança das Nações Unidas, em Nova York.

Após um repórter perguntar se ele não estava preocupado com a possibilidade de a compra financiar uma guerra, França pediu que a mesma indagação fosse feita ao premiê alemão, Olaf Scholz. “Talvez você devesse perguntar ao senhor Scholz sobre isso, e então eu respondo”, disse, referindo-se ao fato de a Alemanha ser um importante consumidor do gás russo.

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Maiores dificuldades estão relacionadas a câmbio, custos e prazos

Para o economista Rodrigo Leão, doutorando em economia política internacional e coordenador técnico do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), no entanto, não deve haver consequências de ordem política ou diplomática, como retaliações de outros países, que impeçam as importações.

“Basicamente o boicote à Rússia vem da Europa, Estados Unidos, Austrália e Japão, além de algumas economias da África e da América Latina. Não é a maioria dos países, e a gente tem observado que outras nações, em razão dos descontos que a Rússia tem dado em termos de preços, tem elevado significativamente a compra de diesel russo”, afirma. É o caso de China e Índia, por exemplo. “O Brasil já importa alguns produtos da Rússia, especialmente fertilizantes, em uma quantidade considerável”, lembra.

É a mesma tese defendida pelo ministro de Relações Exteriores do Brasil. “A Rússia é um parceiro estratégico do Brasil. Somos parceiros do Brics. Também dependemos muito das exportações de fertilizantes da Rússia e da Bielorrússia. E, claro, a Rússia é um grande fornecedor de petróleo e gás”, disse França na terça-feira.

Embora se declare contrário à guerra, o Brasil tem adotado discurso relativamente neutro em relação ao conflito, sem tomar posição para um lado ou outro.

Ainda assim, o economista do Ineep vê alguns complicadores que precisarão ser contornados. “A principal questão é que a Rússia tem feito seus negócios em moeda local, o rublo, o que gera custos adicionais”, explica. “Além disso, o tempo para o diesel chegar aqui é maior, o custo logístico é mais elevado e, dependendo da região, há dificuldades em razão do inverno rigoroso”, diz.

Entre as vantagens, por outro lado, está a cotação do produto russo na comparação com o derivado norte-americano. Como a Europa está boicotando o óleo russo, houve um crescimento considerável no volume importado dos Estados Unidos, o que gera uma pressão sobre os preços do produto daquele país.

“Se pegar as exportações americanas de março a maio, houve um crescimento, a cada mês, a taxas de mais de 10%. Então, claramente tem um grupo de países demandando dos Estados Unidos, o que tem gerado uma queda de estoque de derivados norte-americano”, explica Leão.

“Isso começa a impactar preços, além de poder gerar dificuldade de atender a demanda que eles estão recebendo. Por outro lado, há uma tendência de aumento da oferta do óleo russo. Então é natural que haja uma reorganização do fluxo comercial.” Para se ter uma ideia, nos últimos três meses, o litro do diesel russo teve um piso de US$ 0,95, enquanto o do produto norte-americano foi de US$ 1,33, segundo os estudos do Ineep.

A possibilidade de desabastecimento de diesel no Brasil foi levantada pela Petrobras em maio, devido a paradas de manutenção previstas em suas refinarias no segundo semestre e à escassez do produto no mercado internacional, por causa da guerra da Ucrânia.

Na terça-feira (12), a ANP realizou audiência pública sobre duas propostas de resolução visando obrigar empresas do setor a aumentar os estoques do produto no segundo semestre. Em nota divulgada no dia seguinte, a agência afirmou que, “no momento, o abastecimento de óleo diesel A S-10 ocorre com regularidade no país” e que seu objetivo “é atuar de forma preventiva”.

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