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Paul Krugman

Os verdadeiros vencedores

A Suprema Corte, desafiando muitas expectativas, acabou decidindo a favor de manter a lei de reforma da saúde, também conhecida como Obamacare. Haverá, sem dúvidas, muitas manchetes declarando que essa é uma grande vitória para o presidente Obama, o que, de fato, é. Mas os verdadeiros vencedores são os americanos comuns.

Estamos falando em quantas pessoas beneficiadas? Em torno de 30 milhões passarão a ter acesso a um plano de saúde graças ao Obamacare, de acordo com estimativa do gabinete orçamentário do Congresso.

Mas esse número subestima em muito a verdadeira quantidade de vencedores, porque milhões de outros norte-americanos – incluindo muitos que se opuseram à lei – poderão vir a se tornar um desses 30 milhões.

Somemos, então, cada um desses que trabalham para uma companhia que ofereça um bom plano de saúde, mas que correm o risco de perder o emprego – e quem neste mundo de terceirização e aquisições de empresas de capital privado não corre este risco? E ainda todos que poderiam considerar impossível pagar por um plano de saúde privado, e que agora receberão um auxílio financeiro crucial; e aqueles que seriam recusados por planos de saúde em muitos estados.

Em resumo, a não ser que você faça parte daquela minúscula classe de americanos ricos que estão isolados e protegidos das realidades da vida da maioria das pessoas, os vencedores dessa decisão da Suprema Corte são pessoas como você. Pois quase todos serão beneficiados ao fazer da América uma sociedade mais generosa e decente.

Mas e os custos? Coloquemos desse modo: a estimativa feita pelo gabinete orçamentário dos custos ao longo da próxima década das "provisões de cobertura" do Obamacare – basicamente, os subsídios necessários para possibilitar o pagamento do sistema de saúde – representam cerca de um terço dos cortes tributários que Mitt Romney propôs para esse mesmo período de tempo. É verdade que Romney prometeu compensar esse custo, mas ele não conseguiu providenciar nenhuma explicação plausível sobre como ele faria isso.

A reforma da saúde, em contraste, estará completamente quitada, com uma combinação de aumentos nos impostos e cortes em despesas em outras partes.

Então, a lei que a Suprema Corte manteve é um ato de decência humana que também é fiscalmente responsável. Não é perfeita, nem de longe – é, afinal, um plano originalmente republicano, feito há muito tempo como um modo de adiar a alternativa óbvia de se estender a cobertura do Medicare – que se aplica a indivíduos acima de 65 anos ou portadores de necessidades especiais – para todo mundo.

Como resultado, o Obamacare é um híbrido esquisito de seguro público e privado que saiu de uma forma como ninguém o planejaria se fosse feito do zero. Haverá uma longa luta para melhorá-lo, assim como ocorreu com a Previdência Social, mas, ainda assim, é um grande passo rumo a uma sociedade melhor – moralmente falando.

E isso nos traz de volta à questão da natureza das pessoas que tentaram acabar com a reforma da saúde – e quem continuará, é claro, seus esforços para isso, apesar dessa já esperada derrota.

Em um dos níveis, a coisa mais chocante sobre a campanha contra a reforma foi a sua desonestidade. Lembram-se das "bancas da morte" (termo usado pela ex-governadora do Alasca, Sarah Palin, para se referir a como burocratas supostamente decidiriam quem seria "digno" do sistema de saúde)? Lembram-se de como os oponentes da reforma, sem se darem conta da contradição, acusaram Obama de promover maior intervenção do governo e o condenaram por cortar o Medicare?

Política não é brincadeira, mas, mesmo nesses tempos partidários, a natureza inescrupulosa da campanha contra a reforma foi excepcional. E, pode ter certeza, todas as velhas mentiras, provavelmente com um punhado de mentiras novas, virão à tona de novo diante da decisão da Suprema Corte. Tomara que os democratas estejam prontos.

Mas o que foi e continua sendo realmente chocante sobre os antirreformistas é a crueldade. Uma coisa seria se, em algum ponto, eles tivessem oferecido qualquer coisa que se parecesse com uma proposta alternativa para ajudar os americanos com doenças pré-existentes, os americanos que simplesmente não podem pagar por planos de saúde individuais caros e os que perderam sua cobertura junto com os empregos.

Mas há muito tempo tem sido óbvio que o objetivo da oposição é simplesmente acabar com a reforma, sem se importar com as consequências humanas. Nós todos devemos estar gratos pelo fato de que, pelo menos desta vez, esses esforços fracassaram.

E deixem-me acrescentar uma última palavra sobre a Suprema Corte. Antes das discussões começarem, o consenso predominante entre os especialistas em Direito que não eram conservadores radicais – e mesmo entre alguns conservadores – era o da evidente constitucionalidade do Obamacare. E, no fim, graças ao juiz John Roberts Jr., a Corte manteve esse ponto de vista. Mas quatro juízes discordaram, e discordaram em termos extremos, proclamando não somente que o muito discutido mandato individual era inconstitucional, mas a lei inteira. Considerando a opinião jurídica predominante, é difícil ver essa posição como algo que não seja partidarismo descarado.

A questão é que isso tudo não acabou ainda – nem para o sistema de saúde, nem para o espectro mais amplo da sociedade americana. A crueldade e a implacabilidade que fizeram com que houvesse tanto suspense nessa decisão da Corte não irão embora tão cedo. Mas vamos celebrar por enquanto. Esse foi um grande dia, uma vitória dos devidos processos legais, da decência e do povo americano.

Tradução: Adriano Scandolara

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