Depois de passar todo o dia em alta, a Bolsa de Valores de São Paulo inverteu o comportamento e fechou em baixa nesta segunda-feira, com investidores ainda receosos em retomar as compras diante das incertezas em relação à extensão dos problemas de crédito imobiliário nos Estados Unidos. A proximidade do vencimento de índice futuro, que ocorre na quarta-feira, e o também fraco desempenho de Wall Street contribuíram para a queda da Bovespa.
O Índice Bovespa, principal indicador da bolsa paulista, caiu 0,39%, atingindo 52.434 pontos, depois de subir quase 2% pela manhã. Foi o terceiro dia seguido de queda, levando o Ibovespa ao menor nível desde 12 de junho. O volume financeiro ficou em R$ 3,79 bilhões, o segundo menor do mês e abaixo da média diária do ano, de R$ 4,1 bilhões.
Analistas dizem que uma crise maior parece ter sido evitada no momento, mas que até que a completa extensão dos problemas do setor de crédito imobiliário dos EUA seja conhecida o mercado continuará na defensiva.
- A explosão (dessa crise) parece estar se dissipando, mas o problema, que é ainda não sabermos exatamente onde estão as perdas, continua - disse Lou Crandall, economista-chefe da Wrightson ICAP. - A vulnerabilidade do sistema a esse tipo de questão de liquidez ainda está presente.
As bolsas de valores dos Estados Unidos fecharam praticamente estáveis, com preocupações em relação às perdas ligadas ao mercado de crédito imobiliário de risco pressionando ações do setor financeiro e ofuscando atuações de bancos centrais para injetar liquidez no sistema.
Durante boa parte da sessão, Wall Street seguiu outros mercados acionários que subiram -como Ásia e Europa-, mas no final da tarde os principais índices dos EUA foram pressionados por ações de bancos. O índice Dow Jones, referência da bolsa de Nova York, recuou 0,02%, para 13.236 pontos. O termômetro de tecnologia Nasdaq caiu 0,10%, para 2.542 pontos. O índice Standard & Poor's 500 teve desvalorização de 0,05%, somando, no fechamento, 1.452 pontos.
O dólar também fechou em queda nesta segunda-feira , recuperando parte da alta acumulada no mês, influenciado pelo fluxo cambial positivo, que prevaleceu em meio à situação mais amena no cenário externo. A moeda norte-americana recuou 0,46% e fechou cotada a R$ 1,943. Em agosto, o dólar ainda registra alta de 3,19%.Manhã de alta
A alta de 2% do IBovespa, verificada na abertura, deveu-se à recuperação internacional diante de novas injeções de recursos de bancos centrais de diversas partes do mundo no sistema financeiro. Com pouco mais de 10 minutos de pregão, o índice Bovespa já subia 1,96%, mas perto das 16h passou a cair. Às 16h30, o Ibovespa recuava 0,68%, para os 52.280 pontos, com volume financeiro de R$ 2,9 bilhões, considerado baixo para o horário.
BCE injetou US$ 65 bilhões nesta segunda
Antes da abertura do mercado brasileiro, o Banco Central Europeu (BCE) injetou 47,665 bilhões de euros (US$ 65 bi). O Banco Central do Japão também voltou ao mercado, oferecendo mais US$ 5 bilhões. Um pouco mais tarde, após a abertura do mercado americano, o Fed (banco central dos Estados Unidos), disponibilizou mais US$ 2 bilhões de crédito ao sistema bancário.
Na semana passada, as bolsas do mundo todo desabaram após o banco francês BNP Paribas anunciar a suspensão de saques de três fundos de investimentos que tinham títulos americanos de dívida imobiliária. O anúncio trouxe pânico aos mercados, que temem a contaminação de todo o sistema financeiro com a crise das hipotecas de alto risco americanas, e fez os bancos centrais de todo o mundo atuarem oferecendo crédito para impedir a falta de liquidez.
O economista-chefe da Fidúcia Asset Management, Marcelo Castello Branco, disse que a queda faz parte da volatilidade que o mercado está passando.
- Depois de muito otimismo pela manhã com a recuperação dos mercados internacionais diante das atuações dos bancos centrais, as pessoas estão voltando para a realidade - afirmou Castello Branco.
O economista-chefe da Consultoria Lopes Filho, Julio Hegedus Netto, avalia que alta dos mercados externos, que puxaram a Bovespa pela manhã, foi puxada pela ação do BCE e também pelo fato da grande desvalorização ocorrida na sexta-feira, quando as bolsas do mundo todo fecharam em queda. Além disso, ele conta que os investidores viram com bons olhos o fato de os representantes dos BCs da Europa terem se reunido com executivos do mercado para discutir a crise durante o fim de semana.
Ações européias tiveram maior alta em 15 meses
As principais bolsas européias registraram forte alta, puxadas principalmente por papéis de bancos como o Royal Bank of Scotland, o HSBC e o Barclays. O índice FTSEurofirst 300, que reúne as principais ações das empresas européias, subiu 2,37%, para 1.514 pontos, na maior alta percentual diária em 15 meses (desde 23 de maio de 2006). Tiveram valorizações significativas as bolsas de Londres (2,99%), Paris (2,21%) e Frankfurt (1,78%).
Na Ásia, o índice Nikkei da Bolsa de Tóquio fechou com leve alta de 0,21%. Na Bolsa de Seul, a alta foi mais expressiva: 1,14%. A Bolsa de Hong Kong teve alta de 0,45%.
Volatilidade deve continuar
O economista da Lopes Filho ressalta, no entanto, que a volatilidade deve continuar por toda a semana, principalmente ao sabor das notícias sobre a extensão da crise das hipotecas.
- A grande questão agora é saber quais bancos estão contaminados com os créditos subprime (de alto risco) - afirmou Julio Hegedus Netto.
Isso ocorre porque os empréstimos imobiliários americanos são securitizados. Ou seja, as financiadoras vendem títulos de seus créditos no mercado financeiro e investidores do mundo todo compram esses papéis.
Os indicadores econômicos americanos previstos para esta semana também devem influenciar os mercados durante, prevê o economista da Lopes Filho. Nesta segunda-feira, foi divulgado o aumento das vendas no varejo americano de 0,3% em julho .
- Os indicadores serão importantes para mostrar ao mercado que a economia americana continua sólida, apesar da crise das hipotecas. Mas se vierem ruins também serão motivo para novas quedas - afirmou Julio Hegedus Netto.
Intervenções dos BCs são paliativas
Um analista do mercado financeiro que pediu para não ser identificado ressalta que a crise não deve ser passageira e prevê mais períodos de turbulências pela frente. Segundo ele, os bancos centrais deverão continuar injetando recursos no mercado financeiro para evitar o pior.
- Essas intervenções dos bancos centrais são paliativas. Eles querem evitar um colapso. Uma crise de confiança no crédito como essa demora a ser debelada. O crédito fica mais restrito e acaba alimentando a crise - afirma o analista.
Além da reunião dos BCs da Europa no fim de semana, no domingo, também foi revelado que várias instituições européias como Deutsche Bank, Commerzbank, além do BNP Paribas, são credoras da financeira americana HomeBanc Corp, que entrou com pedido de recuperação judicial contra falência.
O banco de investimentos Goldman Sachs anunciou nesta segunda-feira que injetará, em parceira com outros investidores, US$ 3 bilhões em um hedge fund que recuou mais de 30% este ano. Segundo o banco, o motivo não é um socorro ao fundo mas uma boa oportunidade de investimento para comprar mais ações. Entretanto, às 14h, os papéis do Goldman caíam 0,25%, depois de ter reagido positivamente após a notícia.