Antes rejeito na extração do níquel, o cobalto virou pivô de uma nova corrida na mineração que ameaça o futuro do carro elétrico. Hoje, uma pessoa que tem um tablet, um laptop, celular e uma furadeira, por exemplo, consome menos de 200 gramas de cobalto por ano. Se essa mesma pessoa compra um carro elétrico, o consumo sobe para ao menos 10 kg. Só que a extração do minério tem alguns nós, entre eles o fato de mais da metade das reservas mundiais estarem na República Democrática do Congo, país politicamente instável e com problemas de exploração infantil, segurança e disputas tribais.
A indústria de carros elétricos deve multiplicar por quatro a demanda por cobalto, nos próximos anos. A previsão é de que o consumo do metal chegue a 450 mil toneladas, em 2030. A perspectiva disparou uma corrida pela matéria-prima, fundamental para a produção das baterias dos novos carros. No Brasil, a Vale abandonou planos de vender ativos no segmento e já estuda ampliar a produção de cobalto, apurou o Estadão/Broadcast.
A britânica Horizonte Minerals é outra que estuda o potencial do metal no plano de desenvolvimento de duas minas de níquel no Brasil. Até pouco tempo, o cobalto era rejeito em área de produção de níquel. Os governos do Brasil e da Alemanha já estudam implantar tecnologias de beneficiamento para extrair cobalto destas áreas já existentes.
Atenta às oportunidades do segmento, a Vale captou US$ 690 milhões com uma venda antecipada do insumo. O negócio permitiu que a mineradora destravasse investimentos de US$ 1,7 bilhão para a ampliação da mina de níquel de Voiseys Bay, no Canadá. Foi a primeira iniciativa para rentabilizar a reserva do mineral da companhia que, segundo fontes, equivale a 10% das reservas totais de cobalto fora do Congo.
Operações como a da Vale se tornam mais atrativas porque a cotação do cobalto saiu de US$ 5 mil por tonelada, em 2012, para US$ 75 mil neste ano. E a expectativa ainda é de alta.
Relatório da Bloomberg New Energy Finance, publicado em maio, estima que os carros elétricos devem ser vendidos a um preço similar ao dos modelos a gasolina já no meio da década de 2020. Em 2040, os elétricos devem representar um terço da frota mundial.
De olho numa possível crise de extração, a fabricante chinesa de baterias BYD deve lançar, até o fim deste ano (2019), uma bateria para carros elétricos em que a proporção de níquel, magnésio e cobalto seja de 8:1:1. A BMW deve já em 2021 este modelo – que deve responder por quase dois terços do mercado, até 2030, pela estimativa da Bloomberg New Energy Finance. A BYD também está expandindo sua capacidade de reciclagem das baterias, e montou uma fábrica só com este propósito, em Xangai.
Marcelo Ribeiro Tunes, diretor de Assuntos Minerários do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), conta que a corrida por cobalto está mobilizando produtores de níquel e cobre, metais mais associados ao novo “ouro azul”. O Chile, por exemplo, está modificando plantas de cobre para produzir também cobalto.
“O Brasil tem entraves para desenvolver minas de níquel (de onde sairá o cobalto). Um deles é o custo da energia. Mas, a partir de US$ 18 mil por tonelada de níquel, a produção começa a fazer sentido.” Hoje, a cotação está próxima de US$ 15 mil.
Parceria Brasil e Alemanha para exploração do Cobalto
Com a meta de tirar de circulação os veículos a combustão em 2030, a Alemanha conversa com o governo do Brasil para desenvolver tecnologias de beneficiamento do minério em áreas de produção de níquel. “O Brasil tem vários depósitos de níquel e suspeitamos que o rejeito tenha um teor importante de cobalto”, diz o diretor de recursos minerais da Companhia de Pesquisa em Recursos Minerais (CPRM), Marcelo Esteves.
Ele diz estar conversando com empresas que têm produção de níquel para abrir espaço para as pesquisas com o governo alemão. “Eles têm menos de 12 anos para garantir o fornecimento e, em média, o desenvolvimento de um projeto de beneficiamento mineral leva cerca de sete anos”, completa.
A ideia também está nos planos para o Brasil da Horizonte Minerals, que pretende incluir plano de desenvolvimento das minas de níquel Araguaia e Vermelho, compradas da Vale no início do ano. Segundo a gerente geral de sustentabilidade e relações institucionais da empresa, Katie Millar, os estudos de Vermelho realizados pela Vale há 12 anos serão revisados para considerar também o cobalto. “O mercado ainda não precificou corretamente a qualidade do ativo que compramos. Vamos publicar os estudos preliminares esse ano. A expectativa é estar produzindo em 2021”, diz.
Consórcio japonês para extração do mineral
Para evitar uma crise na distribuição de cobalto, fabricantes japoneses de automóveis e de baterias montaram um consórcio para fomentar minas de cobalto. O grupo tem apoio do governo japonês, que tenta fazer frente à escalada chinesa em busca de novas frentes de exploração do minério ao redor do mundo.
A expectativa do governo é de que o consórcio dê conta da extração do recurso para alimentar a indústria local. Os japoneses querem firmar acordos com os países produtores do minério, por meio de financiamentos do Banco Japonês para Cooperação Internacional e parcerias com a Companhia Japonesa de Óleo, Gás e Metais).
Carro elétrico no Brasil
No Brasil, a soma de carros híbridos e elétricos soma menos de 10 mil unidades, segundo dados da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE). Os preços altos são o principal entrave. Hoje o único modelo 100% elétrico vendido no país é o importado i3, da BMW, que custa cerca de R$ 160 mil.
Apesar disso, analistas preveem um crescimento nas vendas do segmento, ainda que em ritmo mais lento do que o observado em países como a China e a Noruega. A redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para veículos elétricos e híbridos, do teto de 25% para até 7%, prevista no programa Rota 2030, é uma das medidas que deve pavimentar a chegada dos elétricos por aqui.
A medida é vista como uma sinalização do governo para as empresas começarem a investir no setor com alguma segurança. Hoje não há produção nacional de carros elétricos ou de baterias, por exemplo. A Associação Brasileira de Veículos Elétricos (ABVE) estima que a produção deve se viabilizar, comercialmente, a partir de 10 mil a 15 mil unidades vendidas ao ano.
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