Mundialmente conhecidos por fabricar carros grandes e beberrões, os Estados Unidos adotam agora uma postura bem diferente daquela que não aceitou o Protocolo de Kyoto (acordo internacional para reduzir as emissões de gases-estufa dos países industrializados): passam a obrigar as montadoras a aumentar a eficiência no consumo de combustíveis e reduzir as emissões de poluentes dos veículos.
Ou seja, os carros norte-americanos deverão sofrer mudanças drásticas em tamanho, peso, motor, aerodinâmica e materiais aplicados. Segundo as novas normas anunciadas pelo presidente Barack Obama nesta semana, até 2016 os automóveis produzidos no país terão de atingir o consumo de 15,1 quilômetros por litro de combustível, já os mais econômicos deverão fazer 16,5 quilômetros por litro. Grande parte dos automóveis fabricados aqui tem autonomia superior à exigida pelo governo americano. Mas para eles, a nova determinação será um grande desafio.
Além de reduzir as emissões, as novas medidas rendem aos Estados Unidos uma economia de quase dois bilhões de barris de petróleo, o equivalente a tirar 177 milhões de carros das ruas e das estradas, de acordo com a Casa Branca. E isso significará diminuir a dependência do petróleo que importam do México, Arábia Saudita e Venezuela.
"Em termos efetivos, esses 2 bilhões representam poucos meses de produção de petróleo. Mas a leitura que a gente faz dessa medida é justamente chacoalhar a indústria, para que eles mudem", observa o consultor da Trevisan Consultoria, Antônio Carlos Porto Araújo. E o chacoalhão significa sair da crise. "Se é notório que as empresas estão em crise é porque têm problemas de gestão ou são modelos de negócio muito ruins. Você não melhora essa estrutura se não mexer nisso. Apelar para a reinvenção automobilística é a saída", analisa Araújo.
Segundo o consultor, a "desculpa ambiental" e de redução do consumo de petróleo escondem por trás o ataque aos gargalos e a superação de desafios, que levaram a indústria automobilística americana à crise. E verba liberada pelo governo dos Estados Unidos para isso não falta.
Os novos veículos americanos
"Os americanos vão abrir mão de potências mais altas, mas os motores serão menores e mais eficientes", afirma o diretor das comissões técnicas da Sociedade de Engenheiros da Mobilidade (SAE Brasil), Luso Ventura. Além da modificação dos propulsores, o especialista também aponta a busca pela diminuição de peso dos veículos, o que significa aperfeiçoar os materiais utilizados na composição dos modelos.
No entanto, tais modificações terão de ser complementadas por combustíveis mais eficientes e renováveis e tecnologias alternativas, como os veículos híbridos. "Os americanos sempre fizeram carros beberrões, que gastam muita gasolina. O carro a gasolina perto do veículo a diesel gasta 30% a mais", observa.
Diante disto, entram em jogo os veículos híbridos e elétricos. "O mercado dos Estados Unidos é bastante forte, eles têm dinheiro para pagar. Nos veículos maiores, o aumento de custo causado pela versão híbrida é menos sensível do que em carros menores, tem atratividade maior. Enfim, é um caminho louvável", observa Luso Ventura.
GM, Ford e Chrysler
A Europa até 2020 tem um forte trabalho com leis que exigem redução de consumo e emissão. No mesmo sentido, o Japão estimula o consumo de veículos híbridos, oferecendo descontos nos impostos dos consumidores que optam pela tecnologia. E os Estados Unidos? Até agora, a cultura americana teve como foco de consumo picapes, SUVs e limousines. De acordo com Araújo, o americano passará por uma verdadeira revolução industrial, para mudar a cultura dos consumidores. "Eles terão de desenvolver projetos para a produção de novos motores, com capacidade de eficiência 40% maior do que se tem hoje", afirma Araújo.
A primeira montadora norte-americana a mostrar apoio à medida do governo foi a Ford, que além de participar de reuniões com a Casa Branca sobre o assunto, lançou no mesmo dia do anúncio, na última terça-feira (19), o motor EcoBoost 3.8 V6. O propulsor já está dentro das novas normas e, segundo a montadora, é o primeiro de uma série de motores EcoBoost, que deverão equipar 90% da linha da montadora nos EUA em 2013.
O motor permite redução do consumo de combustível entre 10% e 20%, sem comprometimento de sua performance. De acordo com a Ford, outros componentes estão em desenvolvimento para a redução de emissões, como novas transmissões de seis velocidades. A montadora também promete lançar mais veículos a diesel e híbridos, além de aumentar a utilização de biocombustíveis em sua frota.
A Ford diz que, em médio prazo, diminuirá o peso de seus veículos para aumentar a economia e ampliará o número de modelos híbridos no mercado, incluindo a geração ´plug in (híbridos que carregam na tomada). Trabalhará ainda no desenvolvimento do etanol de celulose. Em longo prazo, de 2020 a 2030, a montadora adotará as células de combustível (ou hidrogênio).
Já a General Motors concentra seus trabalhos na promoção do Chevrolet Volt. O modelo é o primeiro carro totalmente elétrico produzido em grande escala. A diferença para qualquer modelo híbrido é que ele possui apenas um motor principal, o elétrico, e o motor de combustão interna é menor, somente para auxílio. No caso dos carros híbridos, eles possuem duas fontes de propulsão simultâneas, sendo que o motor de combustão interna é a fonte principal de energia.
Quando a General Motors completou 100 anos, em setembro de 2008, o até então CEO (chief executive officer) da montadora, Rick Wagoner, afirmou que o Chevrolet Volt simboliza o que a GM quer para hoje. "Tecnologia associada à design e ao comprometimento com o futuro, para enfrentar os desafios com o meio-ambiente", disse. Segundo Wagoner, a GM reinventará o automóvel com o Volt.
Durante programa do apresentador David Letterman, da rede tevê americana CBS o vice-presidente da GM, Bob Lutz, afirmou que o modelo será lançado no primeiro trimestre de 2011 e deverá custar cerca de US$ 32,5 mil.
A terceira maior montadora norte-americana, a Chrysler, também aposta no carro elétrico para sair do buraco. A montadora lançará no ano que vem o cupê esportivo Dodge Circuit EV. O objetivo é concorrer com o Chevrolet Volt e o Tesla Roadster. O modelo é baseado na plataforma do esportivo Lotus Europa e terá propulsor elétrico de 200 kilowatts (o equivalente a 268 cavalos de potência) e bateria avançada de lítio, com autonomia de 240 km por carga.
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