| Foto: Sampaio

Cenário externo e produtividade baixa atrapalham

O mercado financeiro vibra a cada subida de Marina Silva ou Aécio Neves nas pesquisas eleitorais. A esperança é que um eventual novo governo seja menos intervencionista e mais sensível a questões como a necessidade de um trato nos gastos do governo – leia-se um ajuste fiscal forte o suficiente para suavizar a pressão sobre a inflação e a taxa de juros e ainda abrir espaço para mais investimentos públicos e privados, tidos como essenciais para um crescimento econômico mais sólido no futuro.

Na teoria é interessante, mas é improvável que o mais bem-intencionado ministro da Fazenda consiga levar tudo isso a cabo tão cedo. "Uma coisa é palanque, outra é o dia a dia. Em termos de política econômica, o que normalmente impera é o pragmatismo", observa o economista Pedro Paulo Silveira, da TOV Corretora.

Silveira acredita que, por mais que trabalhe o governo, será pouco se o mundo não crescer mais rápido. "Dependemos demais da economia global, e ela tem trajetória muito pouco dinâmica. Todas as expectativas estão sendo revisadas para baixo. Isso afeta o crescimento brasileiro", diz.

Produtividade

Giuliano Contento de Oliveira, professor do Instituto de Economia da Unicamp, vê a participação do exterior como importante, mas não determinante. "Eu diria que, ao contrário do que ocorria antes da crise de 2008, o cenário internacional já não contribui para tornar menos limitantes os nossos problemas domésticos", avalia.

Muitos analistas creem que a deterioração dos fundamentos da economia brasileira nos últimos anos afetou até mesmo a capacidade de o país crescer. "Acho que a economia pode crescer mais. Mas para isso é preciso avançar em uma agenda de investimentos que tem estado um pouco obstruída", diz Oliveira. "A produtividade da economia diminuiu nos últimos anos. E ela está condicionada a investimentos em infraestrutura, novas tecnologias, novos métodos e processos. Precisamos fazer um ‘upgrade’ em nossa estrutura produtiva."

CARREGANDO :)

Quando anunciou os 12 mil empregos formais criados no pior mês de julho em 15 anos, o ministro do Trabalho, Manoel Dias, avisou que aquele número representava o "fundo do poço" e garantiu que o mercado de trabalho já estava se recuperando. No mês seguinte, o país gerou 101 mil vagas, aparentemente confirmando a tese do ministro.

INFOGRÁFICO: Veja os indicadores da economia brasileira

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A opinião do governo federal em relação não só ao emprego, mas à economia toda, é de que o pior passou. Pode ser. Mas, na avaliação de economistas consultados pela Gazeta do Povo, há uma distância grande entre sair do fundo do poço e chegar à superfície. Eles acreditam que, sob pressão de problemas internos e externos, o Brasil tende a continuar patinando pelo menos até o fim do ano, com chances de voltar a avançar – um pouco – apenas a partir de 2015.

Para crescer mais, defendem esses economistas, o país precisa resolver problemas profundos – dos baixos níveis de poupança e investimento às elevadas taxas de inflação e juros, começando por um forte ajuste fiscal – e ainda contar com uma recuperação mais forte da economia global. Por enquanto, nada disso aparece no radar.

Virada?

Depois da recessão técnica constatada ao fim do primeiro semestre, indicadores divulgados nas últimas semanas deram a impressão de estar havendo uma virada. O Índice de Atividade Econômica do Banco Central subiu 1,5% na passagem de junho para julho, a maior alta mensal em seis anos. O PIB Mensal estimado pelo Banco Itaú, por sua vez, cresceu 1,4%, o avanço mais forte desde dezembro de 2011. Os dois índices sintetizam a melhora de uma série de dados, entre eles a produção industrial e as vendas do comércio.

A questão é que os ganhos recentes não reverteram as perdas acumuladas nos meses anteriores. Além disso, traçar um diagnóstico com base nos dados de um único mês pode ser arriscado. O próprio mercado de trabalho é prova disso. Em fevereiro, quando foram preenchidas 261 mil vagas com carteira assinada, o ministro Manoel Dias disse que o emprego estava "reagindo" à timidez anterior. Não era bem assim: na soma dos cinco meses seguintes, o país abriu apenas 214 mil vagas.

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Estagnação

"Não acho que seja o caso de falar em reversão de tendência. Acredito que até o fim do ano vamos ter um quadro mais de estagnação que de recuperação", avalia o economista Paulo Picchetti, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV). Picchetti é um dos responsáveis pelo Indicador Antecedente Composto da Economia (Iace), que busca antecipar os rumos do PIB. Elaborado pelo Ibre/FGV e a organização The Conference Board, o Iace subiu 2% entre junho e julho, mas em agosto recuou 0,4%.

"O resultado da eleição e a trajetória das economias centrais são duas grandes incógnitas", diz Picchetti. "O banco central norte-americano aparentemente sinaliza que a recuperação dos Estados Unidos ainda não é tão robusta, e a Europa dá sinais de estar patinando. Por enquanto o cenário é bem incerto, com viés de acreditar que não é no começo de 2015 que veremos uma recuperação mais vigorosa."

Para João Basílio Pereima Neto, chefe do departamento de Economia da UFPR, o que pode estar havendo é somente o fim da desaceleração da atividade econômica. "Não vejo uma retomada agora. Espero uma retomada leve a partir do início de 2015, mas nada exuberante", diz. "O país deve voltar a crescer entre 1,5% e 2%, o que é bom apenas se comparado ao perto de zero em que estamos. O cenário fiscal, monetário e cambial não permite muito mais que isso."

Exportações

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Para economista, controle do câmbio reduz competitividade do país

Pelo menos uma parte da perda de competitividade dos produtos brasileiros no exterior está relacionada ao câmbio. A taxa efetiva real – índice calculado pelo Banco Central, que leva em conta a variação da inflação no Brasil e em seus parceiros comerciais – revela que a moeda brasileira está hoje mais valorizada que no início do Plano Real, o que é ruim para maioria dos exportadores e tem como consequência uma redução do potencial de crescimento do país.

Para o economista Giuliano Contento de Oliveira, da Unicamp, o primeiro passo para "recolocar o câmbio no lugar" seria deixá-lo flutuar mais livremente. Embora a taxa seja flutuante na teoria, desde o ano passado o Banco Central tem atuado para impedir um avanço mais forte do dólar. O governo sempre defendeu a busca por um câmbio mais competitivo – isto é, um real mais desvalorizado –, mas a preocupação com a inflação está falando mais alto.

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