A pandemia de Covid-19 reduziu a liberdade econômica nos estados brasileiros e anulou os ganhos obtidos desde 2003 na capacidade de promover um ambiente de negócios propício ao crescimento econômico.
É o que revela um estudo dos professores Vladimir Maciel, Julian Portillo e Ulisses de Gamboa, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em estudo divulgado pelo Instituto Millenium.
Segundo eles, o Índice Mackenzie de Liberdade Econômica Estadual caiu 36% desde 2003 (início da série) até 2020. O indicador compila dados sobre nível de gastos dos governos estaduais, tributação, regulamentação e a liberdade nos mercados estaduais.
O índice, que vai de zero a dez, apresentou uma tendência de queda entre 2003 e 2011, indo de 6,34 para 5,02. Subiu na sequência, atingindo o pico de 7,66 em 2018. Depois caiu para 6,37 em 2019, influenciado, segundo Maciel, por medidas de ajuste tributário tomadas pelos governadores recém-eleitos. E despencou para 4,06 em 2020, sob pressão da maior intervenção estatal na economia.
Segundo os professores do Mackenzie, a Covid-19 e as políticas públicas que foram adotadas para combater os efeitos da pandemia contribuíram para o aumento da participação do Estado na atividade econômica.
“O setor privado teve forte encolhimento, com grande redução do emprego e renda e paralisação ou fechamento de negócios. O governo, por seu turno, acabou crescendo em termos de despesas e subsídios e eventuais reduções de arrecadação foram muito menores que a queda de renda da população”, dizem os especialistas.
Somente entre março e junho de 2020 foram fechados mais de 1,5 milhão de postos de trabalho com carteira assinada, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Novo Caged).
O estudo aponta que muitas empresas foram forçadas a fechar as portas devido às restrições de funcionamento impostas pelos governos, enquanto outras enfrentaram queda significativa na demanda por seus produtos e serviços. “Muitos trabalhadores viram suas fontes de renda desaparecer ou serem seriamente comprometidas”, diz o texto.
Um dos impactos imediatos da crise da pandemia foi a rápida redução da taxa de participação da população na força de trabalho. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ela era de 63,4% no último trimestre de 2019 e caiu para 56,7% no período encerrado em julho de 2020. O índice até agora não se recuperou totalmente: no último trimestre de 2022, estava em 62,1%.
A taxa de desemprego, que encerrou 2019 em 11,1%, teve uma forte alta nos primeiros meses da crise, chegando a 14,9% em setembro de 2020. Nesse caso, a recuperação foi mais rápida: ela fechou dezembro de 2022 em 7,9%, abaixo dos índices pré-pandemia.
Os informais estão entre os que mais sentiram os efeitos. Esse contingente ficou 19,6% menor entre dezembro de 2019 e julho de 2020, passando de 39,2 milhões para 31,5 milhões de trabalhadores, devido à falta de circulação de pessoas e às restrições à atividade econômica. Com a retomada da economia e o fim das limitações, o número de informais voltou a crescer – em dezembro passado, eles eram 39,9 milhões.
Liberdade econômica diminuiu em todos os estados no ano da pandemia
Os indicadores de liberdade econômica caíram em todos os estados durante a pandemia. As maiores retrações entre 2019 e 2020 ocorreram em Alagoas (-54,1%), Piauí (-50,7%) e Acre (-47,8%). “São estados com atividade econômica deprimida, com forte presença do setor público e dificuldades na geração de renda por parte do setor privado. Os poucos ganhos de liberdade econômica se perdem rapidamente em momentos de crise”, diz Maciel.
Evolução do indicador de liberdade econômica entre 2019 e 2020, por unidade da federação
UF | Variação |
AL | -54,2% |
PI | -50,7% |
AC | -47,8% |
PE | -47,1% |
PB | -46,3% |
MA | -42,5% |
RN | -40,7% |
RS | -38,2% |
AM | -37,1% |
RJ | -36,8% |
BA | -36,2% |
RR | -35,9% |
TO | -35,0% |
MS | -34,8% |
RO | -32,5% |
PA | -32,5% |
GO | -31,1% |
PR | -30,0% |
AP | -29,6% |
SE | -29,3% |
SC | -28,7% |
CE | -25,9% |
MT | -25,8% |
SP | -22,3% |
Segundo ele, os estados nordestinos têm um histórico de depender de transferências de órgãos como a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs) e a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf).
Por outro lado, São Paulo (-22,3%), Mato Grosso (-25,8%) e Ceará (-25,9%) são os estados que tiveram as menores perdas de liberdade econômica em decorrência da pandemia, entre 2019 e 2020. Maciel, do Mackenzie, aponta que nesses estados não houve um crescimento tão grande dos gastos do governo.
O que acontece quando a liberdade econômica diminui
As implicações dessa redução na liberdade econômica têm efeitos de médio e longo prazo. Segundo Maciel, entre elas estão:
- expansão da informalidade;
- perda de investimentos em inovação: investimentos são postergados ou não se investe devido à falta de incentivos institucionais;
- estagnação da produtividade;
- impactos negativos na competitividade global do país.
O estudo aponta que a redução da liberdade econômica tem implicações profundas para a economia e para a sociedade. “Muitos empresários e trabalhadores lutaram para sobreviver e manter suas empresas e fontes de renda, o que pode ter um impacto a longo prazo na economia e na sociedade como um todo”, aponta o estudo divulgado pelo Instituto Millenium.
O que fazer para retomar o crescimento da liberdade econômica
Para retomar o caminho perdido, o professor do Mackenzie diz que é necessário investir em ações imediatas, que tenham efeitos no curto e longo prazo. Ele aponta que entre as principais estão a reconstrução do arcabouço fiscal, para substituir o teto de gastos. “É preciso conter o crescimento das despesas públicas”, diz.
Também é necessário, segundo ele, reforçar as discussões sobre a reforma tributária. Idealmente, ela deveria vir acompanhada da simplificação das regras e redução da carga, algo que, em sua avaliação, não deve ocorrer.
As ações de longo prazo passam pela redução do Estado, por meio de corte de despesas e de subsídios. “É necessário rever políticas mais generosas concedidas a algumas empresas.”
Outra estratégia é estimular o mercado de trabalho privado. Dados do IBGE mostram que em novembro eram 48,6 milhões de pessoas formalizadas, incluindo empregados no setor privado, trabalhadores domésticos com carteira assinada, empregadores e trabalhadores por conta própria com CNPJ.
A alternativa defendida por Maciel é a adoção de leis de liberdade econômica por estados e municípios. Em nível nacional, já existe a Lei 13.874, conhecida como Lei da Liberdade Econômica, sancionada em 2019, antes da pandemia.
Até 9 de março, segundo o Instituto Liberal de São Paulo (Ilisp), 783 cidades tinham pelo menos um decreto ou lei de liberdade econômica. E 81% das capitais, incluindo o Distrito Federal, já contavam com leis deste tipo.
Segundo Maciel, as leis contribuem para dar maior dinamismo às economias locais porque se centram em pontos como desburocratização e simplificação de procedimentos para empresários e empreendedores.
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