Com déficit recorde de US$ 58,86 bilhões em 2014, a indústria de transformação, não foi apenas a principal responsável pelo maior saldo negativo da balança comercial brasileira desde 1998 (US$ 3,96 bilhões). O setor também contribuiu para piorar a qualidade do fluxo de comércio exterior: o Brasil se consolidou nos últimos oito anos como um exportador de itens que são quase matérias-primas também no segmento industrial.
Entre 2006 e 2014, setores intensivos em recursos naturais e que usam pouca tecnologia responderam por quase 70% do avanço das exportações da indústria, aponta um estudo da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) para avaliar o comércio exterior por setor produtivo com base na intensidade tecnológica. O estudo levou em conta os anos de 2006, quando a balança industrial era superavitária, e 2014, ano que a indústria teve déficit histórico.
Nesses oito anos, as exportações da indústria de transformação tiveram aumento de US$ 31 bilhões. Desse acréscimo, US$ 21,6 bilhões ou 69,7% vieram de setores de baixa tecnologia, como abate e fabricação de produtos de carne, produção e refino de açúcar, produção de óleos e gorduras vegetais, por exemplo. Já as exportações de segmentos industriais, que agregam maior valor aos produtos, ficaram praticamente estagnadas no período.
Importações
No sentido contrário, as importações da indústria entre 2006 e 2014 aumentaram US$ 122 bilhões, quase quatro vezes o acréscimo registrado pelas exportações. E a categoria que apresentou a maior variação no valor importado foi a de produtos intensivos em tecnologia e de alto valor.
“Não estamos desenvolvendo dentro da nossa indústria produtos de alto valor que possam ser exportados. A vulnerabilidade está justamente aí”, afirma José Ricardo Roriz Coelho, diretor titular do Departamento de Competitividade e Tecnologia da Fiesp e responsável pelo estudo. A mudança de perfil indica que a já combalida indústria brasileira está deslocando a produção de atividade de alta produtividade e que paga os maiores salários para setores com menor produtividade e remuneração para os trabalhadores locais.
Na sua avaliação, o Brasil se “acomodou” com os altos preços das commodities e foi perdendo competitividade nas exportações de produtos de maior valor, afetado pelo câmbio valorizado, pela alta carga tributária, pelos juros elevados, pela burocracia excessiva e a infraestrutura deficitária.
Demandas
A piora da qualidade da balança comercial da indústria combinada com déficit recorde do setor ganham relevância no momento que o governo desenha um plano para alavancar as exportações. Até agora, o Ministério do Desenvolvimento trabalha com a ideia de ajudar os empresários a entrar e ampliar sua presença em mercados já conhecidos e outros ainda a serem consolidados. Mas o plano não toca na desoneração dos produtos, a principal demanda do setor.
Para o gerente executivo de comércio exterior de Confederação Nacional da Indústria (CNI), Diego Bonomo, o plano de exportação não mexe nas questões estruturais, porque para tocar nesses pontos, como por exemplo, na reforma tributária, precisaria ter o aval do Executivo e do Congresso.
Já Roriz Coelho, da Fiesp, não vê grandes avanços nas exportações se as medidas ficarem restritas à área comercial. “Como ampliar as vendas externas se não temos competitividade para participar do mercado de produtos de maior valor”, questiona. Ele observa que a recente valorização do dólar em relação ao real, que já passa de R$ 3, pode atenuar um pouco o problema de falta competitividade. Segundo Roriz Coelho, a solução para ampliar as exportações é desonerar a produção.
O diretor da Fiesp argumenta que a indústria responde por 13% do Produto Interno Bruto (PIB) e paga um terço de todos os impostos que o Brasil arrecada. “É como se os produtos brasileiros estivessem participando de uma maratona com uma mochila nas costas pesando 50 quilos e concorrendo com um chinês todo paramentado, com um tênis de primeira linha”, afirma. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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