O PT e a equipe de transição liderada pelo vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB) encerraram a terça-feira (8) sem uma definição sobre o mecanismo – ou mecanismos – que apresentarão para garantir o financiamento de programas sociais a partir do próximo ano.
Alckmin e o deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) afirmaram que o grupo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva ainda discute um encaminhamento para a ação. Lula fará, nesta quarta-feira (9), reuniões com os presidentes de Câmara e Senado, respectivamente Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Segundo Pimenta, os encontros serão para "conversar" e não para "apresentar" aos parlamentares uma solução já acabada para o assunto.
A equipe de Lula considera ao menos três hipóteses:
- a apresentação de uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que retiraria do teto de gastos as despesas com o Auxílio Brasil (que deve ser rebatizado para Bolsa Família) e outras iniciativas;
- a edição de uma medida provisória (MP) que abriria créditos para o custeio dos projetos; e
- a solicitação de uma autorização ao Tribunal de Contas da União (TCU) para emitir créditos suplementares sem que isso possa trazer consequências jurídicas ao futuro governo.
Alckmin e coordenadores da transição devem se reunir às 10h com o relator-geral do Orçamento de 2023, Marcelo Castro (MDB-PI). Segundo a assessoria de Castro divulgou na terça à tarde, a "PEC da Transição" – como tem sido chamado pelo governo eleito o dispositivo para furar o teto de gastos – será apresentada nesse encontro, que será seguido de entrevista coletiva às 11h.
A criação de um desses mecanismos, ou de mais de um deles, é vista como essencial dentro da equipe de Lula pela necessidade de se garantir o Auxílio Brasil com R$ 600, a retomada de um programa habitacional de grande porte e a aquisição de medicamentos para o Farmácia Popular. Setores do novo governo estipulam o acréscimo necessário em R$ 175 bilhões. O projeto de Orçamento de 2023, enviado pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) ao Congresso, prevê o pagamento do Auxílio Brasil em R$ 405.
PEC: mais segurança jurídica e mais negociação com o Congresso
A criação da PEC para excluir os custos sociais do teto de gastos é interpretada como uma medida que traria mais segurança jurídica ao novo governo. Na terça, Alckmin afirmou que ela é mesmo o caminho "mais provável" para endereçar a questão.
A aprovação de emendas à Constituição depende de votos favoráveis de três quintos dos senadores e dos deputados, com dois turnos de votação em cada uma das duas Casas do Congresso. Isso daria mais legitimidade à proposta, pelo fato de a conclusão do processo representar uma chancela ampla do Legislativo.
Outro elemento favorável da PEC, segundo os petistas, é o de explorar um possível apoio que viria até de parlamentares que hoje integram a base do presidente Bolsonaro. Isso porque a concessão do Auxílio Brasil em R$ 600 foi uma promessa de campanha também de Bolsonaro. Com isso, defensores do presidente tenderiam a se sentir motivados a votar em defesa da proposição.
Na mão oposta, um elemento que joga contra a ideia da PEC é o tempo. A apreciação de PECs no Congresso costuma ser demorada, por demandar análise por parte de comissões especiais e regulares tanto da Câmara quanto do Senado. Além disso, o quórum alto para aprovação demanda articulações políticas avançadas para evitar frustrações.
Os defensores da ideia alegam que isso poderia ser driblado com o apensamento da nova proposta a iniciativas antigas – no jargão do Congresso, apensar é unificar a tramitação de projetos de teor semelhante, o que permitiria à proposta recente "pegar carona" na antiga e dispensar parte da rotina.
Outro argumento contrário à ideia de propor a PEC é que a negociação para a aprovação da iniciativa gastaria "capital político" de Lula antes mesmo de o presidente tomar posse. Entre os defensores desse argumento estão o senador Renan Calheiros (MDB-AL) e o deputado federal eleito Eunício Oliveira (MDB-CE), ex-presidente do Congresso. Ambos são aliados de Lula. Renan chegou a chamar de "barbeiragem" a sugestão da PEC. Para os emedebistas, a sugestão faria com que o novo governo iniciasse sua trajetória já dependente do Centrão.
MP: mais rápida e incerta
Eunício é defensor da tese que o governo Lula poderia resolver a questão com a emissão de uma medida provisória logo no início do mandato. As MPs são elaboradas exclusivamente pela Presidência da República e têm validade imediata. Porém, perdem seu valor se não forem transformadas em lei pelo Congresso Nacional. A negociação entre Executivo e Legislativo para a conversão de MPs em lei é um clássico do Congresso Nacional, e envolve um grande jogo de poder entre os lados.
Outro ponto negativo da ideia de apresentar uma MP é que a solução só poderia ser implantada após Lula ter tomado posse na Presidência. Pelo fato de as MPs serem atos individuais do presidente, não há como o Congresso estabelecer qualquer decisão antes de sua execução. Portanto, a implantação de uma solução via MP ainda em 2022 dependeria de uma mais do que improvável colaboração da gestão Bolsonaro com o futuro governo Lula.
A outra alternativa, um aval do TCU para a abertura de créditos suplementares, é vista como uma solução ousada e de difícil execução. A conquista dos recursos por esse caminho partiria do pressuposto de que o pagamento do Auxílio Brasil é uma necessidade emergencial e, portanto, dispensaria formalidades.
Para os anos seguintes, uma solução idealizada por setores do PT é a de excluir os gastos sociais em definitivo da regra do teto. A proposição poderia ter suas raízes criadas já com a PEC que teria sua tramitação iniciada pelo Congresso ainda em 2022. A ideia é defendida pelo senador eleito Wellington Dias (PT-PI), que expôs a sugestão em entrevista à "Folha de S.Paulo".
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