Diante da crise financeira internacional, a Petrobras terá de escolher quais projetos de investimento desejará levar adiante no curto e médio prazo. Com o acesso a crédito mais restrito, mesmo para uma gigante como a petrolífera, e com dificuldades no mercado de capitais em razão de fatores conjunturais, a empresa terá dificuldades para levar adiante todos os projetos anunciados, pelo menos no cronograma previsto inicialmente. Desta forma, a companhia terá de reavaliar os novos projetos e dar prioridade a alguns deles. Na avaliação de especialistas do setor de petróleo, a companhia deve optar pela área de exploração e produção em sua análise, com destaque para o pré-sal.
"A Petrobras terá dificuldades para tocar todos os projetos ao mesmo tempo. Eu acredito que ela priorizará a exploração, com foco nos projetos do pré-sal, a não ser que a atividade em águas ultraprofundas se torne inviável pelo comportamento do preço do petróleo", afirma o analista do Banco do Brasil Investimentos (BBI) Nelson Rodrigues de Matos.
Executivos da Petrobras e integrantes do primeiro escalão governo federal já deram indícios de que a exploração do pré-sal é viável entre US$ 35 e US$ 40 o barril. "Ainda estamos muito longe disso", observa o analista.
Matos explica que, do ponto de vista estratégico, avançar em exploração é mais importante para a companhia. Ele lembra que o pico de produção dos campos do pré-sal é esperado para 2020, período para o qual espera-se um novo patamar para os preços do óleo. "A Petrobras sempre priorizou a inovação, buscou novos horizontes em seus investimentos. Não é à toa que ela é líder mundial em águas profundas", acrescenta.
Para o analista do setor de petróleo da Ágora Corretora, Luiz Otávio Broad, a restrição de crédito deve fazer com que a companhia priorize projetos com expectativa de retorno mais rápido, situação na qual se enquadra a atividade de exploração. No refino, as margens são mais apertadas no Brasil, porque ainda há a necessidade de importar óleo leve para a produção de derivados.
O diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE), Adriano Pires, ressalta que a construção das cinco refinarias programadas pela Petrobras precisa ser repensada. "É um investimento muito alto para pouco retorno. Se a Petrobras tem que colocar dinheiro em algum lugar, que seja no pré-sal", diz.
A crise de crédito, para ele, pode ser uma boa oportunidade para a Petrobras abandonar, ou pelo menos postergar, projetos considerados "políticos", ou menos interessantes do ponto de vista econômico.
A queda no preço do petróleo, pelo menos por enquanto, ainda não inviabilizaria o pré-sal, considerando a linha de corte dos US$ 40 - patamar pouco provável para a commodity, segundo os analistas, que acreditam em um corte de produção pela Opep para sustentar os preços. O professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Giuseppe Bacoccoli, observa que a queda do óleo cru, em relação aos patamares históricos alcançados em meados do ano, pode inclusive contribuir para alguns avanços em exploração no Brasil, à medida que pode resultar em uma queda no custo dos equipamentos. Por outro lado, no entanto, a valorização do dólar frente ao real pode equilibrar essa equação
Em um tom destoante dos demais especialistas ouvidos pela Agência Estado, Bacoccoli avalia que a Petrobras deve manter as refinarias em seu programa. "É preciso atender ao mercado nacional, que está em expansão", diz. Para viabilizar a construção das unidades, o especialista destaca a possibilidade de uma renúncia fiscal, por parte do Governo Federal, lembrando a elevada participação dos impostos no mercado de combustíveis.
Setor "protegido"
A importância estratégica das usinas hidrelétricas do rio Madeira para o crescimento futuro do País deve fazer com que esses projetos tenham prioridade na liberação de recursos por parte do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Portanto, apesar das dificuldades e dos empréstimos ainda não terem sido liberados, especialistas consultados pela Agência Estado avaliam como de média a alta a viabilidade desses investimentos no prazo previsto inicialmente.
"Não é possível estruturar o crescimento da economia privada sem a resolução de duas questões fundamentais: energia elétrica e logística", afirma o professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e ex-presidente do BNDES, Carlos Lessa. Por essa razão, Lessa acredita que o banco de fomento deve escorar os projetos das hidrelétricas e do complexo do petróleo, que é "onde estão as apostas brasileiras", segundo ele.
Na mesma linha, o diretor da Coppe/UFRJ, Luiz Pinguelli Rosa, acredita que o setor de energia elétrica deva ser o menos afetado pela crise de crédito, destacando a participação das empresas do grupo Eletrobrás nos projetos, assim como a importância do BNDES no financiamento. Rosa foi presidente da Eletrobrás.
Lessa, no entanto, diz ter dúvidas sobre a conclusão do projeto no prazo previsto. As obras da usina de Santo Antonio já foram iniciadas, enquanto os trabalhos em Jirau aguardam a emissão de licenças ambientais, por parte do Ibama, para ter início. O consórcio responsável pelo projeto, liderado por Suez e Camargo Corrêa, já demonstrou a intenção de adiantar as obras, mas ainda não obtiveram aval do órgão ambiental. "O risco de os projetos não serem concluídos no prazo é anterior à crise internacional", diz ele, referindo-se aos freqüentes impasses com o Ministério do Meio Ambiente. "Agora há uma dificuldade adicional", acrescenta ele, sobre o crédito.
Nesta semana, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) adiou o leilão de linhas de transmissão do rio Madeira, que estava previsto para o próximo dia 31, para o final de novembro. Empresas interessadas em participar da licitação pediram o adiamento da disputa, devido a dificuldades para obter crédito, o que poderia reduzir o nível de competitividade no leilão. Um sinal de que, mesmo tratando-se de um investimento estratégico, a crise internacional já tem conseqüências no setor.
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