A Petrobras mantém silêncio sobre as ameaças proferidas pelo presidente Jair Bolsonaro. A Gazeta do Povo procurou a empresa e foi informada de que a estatal não vai comentar as declarações. A companhia também não se manifestou ao mercado financeiro. Por ter capital aberto, com ações negociadas no Brasil e recibos de ações nos Estados Unidos, ela tem a obrigação de informar primeiro o mercado sobre mudanças.
Na noite de quinta-feira (18), em sua live semanal nas redes sociais, Bolsonaro demonstrou irritação com os últimos reajustes nos preços dos combustíveis e sinalizou mudanças na estatal, sem dizer quais. As críticas foram feitas no mesmo dia em que a Petrobras anunciou aumentos de 15,2% para o diesel e de 10,2% para a gasolina, os maiores deste ano e de toda a gestão de Roberto Castello Branco à frente da companhia.
"Teve um aumento, no meu entender, fora da curva da Petrobras. 10% hoje na gasolina e 15% no diesel. É o quarto reajuste do ano. A bronca vem sempre pra cima de mim. Só que a Petrobras tem autonomia”, afirmou o presidente. Ele completou dizendo que não pode interferir na estatal, mas disse que "alguma coisa vai acontecer na Petrobras nos próximos dias". "Você tem que mudar alguma coisa. Vai acontecer”, avisou. Bolsonaro não detalhou quais seriam essas mudanças.
Em outra fala, o presidente direcionou as críticas ao presidente da estatal. “Como disse o presidente da Petrobras, há questão de poucos dias: ‘Eu não tenho nada a ver com caminhoneiros’. Foi o que ele falou, o presidente da Petrobras. Isso vai ter uma consequência, obviamente”. A declaração soou como uma ameaça velada de demissão, já que o histórico de Bolsonaro mostra que ele costuma "fritar" publicamente seus desafetos antes que eles sejam desligados, a pedido ou pelo próprio Planalto.
Segundo o jornal "O Estado de São Paulo", o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, está entre os cotados para assumir a presidência da Petrobras no lugar de Roberto Castello Branco. Albuquerque é nome de confiança de Bolsonaro e já tinha sido cotado para a Eletrobras, após a renúncia de Wilson Ferreira Júnior.
Mas Bolsonaro não tem autonomia para demitir o presidente da Petrobras sozinho. Ele pode sugerir a demissão, que tem que ser aceita pelo conselho de administração da companhia. O conselho é formado por pessoas indicadas pelo governo, acionistas e empregados.
Na manhã desta sexta-feira (19), Bolsonaro reforçou sua ameaça à estatal. "Anuncio que teremos mudança sim na Petrobras. Jamais vamos interferir nessa grande empresa, na sua política de preço. Mas o povo não pode ser surpreendido com certos reajustes. Faça-os, mas com previsibilidade. É isso que queremos", disse em Pernambuco.
As ameaças de Bolsonaro ocorrem às vésperas de reunião do conselho de administração da estatal, marcada para a próxima terça-feira (23). Entre outros itens, os conselheiros vão votar a recondução de Castello Branco à presidência por mais dois anos.
É um procedimento padrão, realizado a cada dois anos, previsto nas regras da política de indicação dos membros do conselho fiscal, conselho de administração e diretoria executiva da Petrobras. Castello Branco assumiu a presidência da estatal em janeiro de 2019, por isso precisa ser reconduzido em 2021 a mais dois anos.
No dia 24, a companhia divulga o resultado do 4.º trimestre de 2020 e, consequentemente, do acumulado do ano. No dia seguinte, fará uma conferência com investidores para comentar os números.
Petrobras fez sucessivos aumentos de preço, acompanhando cotação do petróleo
Por causa da disparada do preço do barril de petróleo no mercado internacional, a Petrobras vem fazendo sucessivos aumento nos preços dos combustíveis. Ao todo, foram quatro somente em 2021. Esses reajustes fizeram o litro da gasolina e do diesel nas refinarias acumular alta de, respectivamente, 34,78% e 27,72%.
O valor médio do litro da gasolina está em R$ 2,48 e do diesel, em R$ 2,58. Em dezembro, o litro da gasolina era vendido pela Petrobras por R$ 1,84, em média, e o diesel saia a R$ 2,02. Vale ressaltar que esses são os preços na refinaria. Depois, há ainda os custos com impostos, distribuição, transporte e venda ao consumidor que são incorporados ao preço final.
Segundo a Petrobras, o preço final do diesel ao consumidor é formado da seguinte forma:
- 49% - custo do combustível na Petrobras (refinarias)
- 15% - distribuição e revenda
- 14% - ICMS (imposto estadual)
- 13% - custo do biodiesel
- 9% - impostos federais (Cide, PIS/Pasep e Cofins)
Para a gasolina, a composição é a seguinte:
- 32% - custo do combustível na Petrobras (refinarias)
- 28% - ICMS (imposto estadual)
- 14% - impostos federais (Cide, PIS/Pasep e Cofins)
- 14% - custo etanol anidro
- 12% - distribuição e revenda
Preço final ao consumidor está abaixo da média mundial, diz Petrobras
Em nota distribuída à imprensa, a Petrobras afirma que o preço final ao consumidor está abaixo da média mundial, segundo pesquisa da Globalpetrolprices.com. O preço médio da gasolina ao consumidor no Brasil está 17% inferior à média global e o país ocupa a 56.ª posição do ranking composto por 167 países. Para o diesel, em uma amostragem de 166 países, o preço final no Brasil está 28% inferior à média global, colocando o país na 43ª posição.
A estatal destaca, ainda, que em ambos os casos os preços médios no Brasil estão abaixo dos registrados no Chile, Argentina, Peru, Canadá, Alemanha, França e Itália.
Em comunicados, Petrobras busca esclarecer variação de preço dos combustíveis
No comunicado à imprensa, a Petrobras reforça que a sua política é a de reajustar os combustíveis de acordo com a paridade internacional, ou seja, com a variação do preço do barril de petróleo, cotado em dólar.
“O alinhamento dos preços ao mercado internacional é fundamental para garantir que o mercado brasileiro siga sendo suprido sem riscos de desabastecimento pelos diferentes atores responsáveis pelo atendimento às diversas regiões brasileiras: distribuidores, importadores e outros refinadores, além da Petrobras”, diz a estatal.
Ela afirma, ainda, que “os preços praticados pela Petrobras, e suas variações para mais ou para menos associadas ao mercado internacional e à taxa de câmbio, têm influência limitada sobre os preços percebidos pelos consumidores finais”.
“O preço da gasolina e do diesel vendidos na bomba do posto revendedor é diferente do valor cobrado nas refinarias da Petrobras. Até chegar ao consumidor são acrescidos tributos federais e estaduais, custos para aquisição e mistura obrigatória de biocombustíveis, além das margens brutas das companhias distribuidoras e dos postos revendedores de combustíveis”, conclui o texto.
Não é de hoje o interesse da Petrobras em esclarecer sua política de combustíveis e a composição do preço final ao consumidor. A companhia publicou no dia 14 de janeiro deste ano em seu site um perguntas e respostas intitulado de “Verdades sobre o preço do diesel que você precisa saber”.
No texto, a companhia diz que não é ela quem define o preço na bomba, reforça que o preço dos combustíveis no Brasil não é o mais alto do mundo, diz que em 2020 o preço do diesel nas refinarias caiu 14% e explica por que não pode ignorar a cotação internacional do preço do barril de petróleo.
As explicações foram publicadas em meio a ameaças dos caminhoneiros de greve. Parte da categoria convocou uma paralisação para o dia 1º deste mês, mas o movimento não teve adesão. A categoria, em geral, apoiou o presidente Jair Bolsonaro nas eleições de 2018.
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