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Apesar de a quebra do monopólio da indústria do petróleo no Brasil completar 25 anos em 2022, a Petrobras ainda mantém, na prática, o controle do mercado de combustíveis do país. As sucessivas altas no preço da gasolina, do óleo diesel e do gás de cozinha ao longo de 2021 poderiam ser menores caso houvesse mais concorrência no mercado de refino, segundo especialistas.
Há alguns anos, a empresa tem buscado reduzir seu portfólio de ativos. A partir de 2011, quando a petrolífera iniciou um plano estratégico de venda de negócios, já se desfez de mais de 80 ativos, segundo levantamento da Federação Única dos Petroleiros (FUP).
No ano passado, por exemplo, a Petrobras finalizou a venda da Liquigás para o consórcio formado pela Copagaz, Itaúsa e Nacional Gás. No último mês de junho, a Petrobras vendeu os 37,5% de participação que ainda mantinha na BR Distribuidora desde que iniciou o processo de desestatização, em julho de 2019.
O propósito das operações é abrir mercado para a concorrência em determinados segmentos e, ao mesmo tempo, fazer caixa para reduzir o endividamento da empresa. Nesse sentido, a Petrobras também tem abandonado a participação em mercados específicos, como de geração de energia e fertilizantes, para concentrar sua atuação na exploração e produção de petróleo em águas profundas.
No ano passado, foram retomados os processos de venda da Araucária Nitrogenados S.A. (Ansa) e da Unidade de Fertilizantes Nitrogenados III (UFN-III). No último mês de novembro, a empresa concluiu a venda de suas participações acionárias de 20% na Termelétrica Potiguar (TEP) e de 40% na Companhia Energética Manauara (CEM).
A abertura do mercado e a venda de dezenas de ativos nos últimos anos são alguns dos argumentos do atual presidente da Petrobras, Joaquim Silva e Luna, para rebater as críticas à política de preços da empresa. “Reforçamos isso: não há monopólio. A Petrobras não é a única supridora do mercado. Atribuir à Petrobras preço de combustível não é correto”, disse Silva e Luna em uma audiência pública recente.
Os preços dos combustíveis ao consumidor acumulam alta de 50,43% em 2021, de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de novembro. A companhia justifica os reajustes nas refinarias, em compasso com o mercado global, pela necessidade de se importar cerca de 20% do que é consumido no Brasil, uma vez que as refinarias não são capazes de suprir a demanda interna de derivados. Mas, quase sem concorrência, a empresa acaba dificultando o investimento privado em novas refinarias e ditando o valor dos produtos que são enviados às distribuidoras.
A estatal chegou a ser alvo do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que investigava, em um inquérito administrativo, suposto abuso de posição dominante no mercado de refino. Em 2019, a empresa assinou um acordo, que suspendeu a investigação, por meio do qual se comprometeu a vender oito refinarias de petróleo, além dos ativos relacionados ao transporte de combustíveis. O prazo dado para o desinvestimento era de dois anos, mas aditivos postergaram a validade do acordo.
Participação da Petrobras no refino de combustíveis
Até este ano, 13 das 17 refinarias que operam no Brasil pertenciam à Petrobras, que concentrava quase a totalidade do mercado de refino. De janeiro a setembro de 2021, as refinarias da estatal responderam por 98,9% de toda a produção de derivados de petróleo no país, com 479,9 milhões dos 485,2 milhões de barris refinados em território nacional, segundo dados da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Juntas, as refinarias Dax Oil, Manguinhos, Riograndense e Univen, que pertencem à iniciativa privada, responderam por apenas 5,3 milhões de barris, ou 1,1% da produção no período.
Em 1.º de outubro, a, titularidade da operação da Refinaria Landulpho Alves (RLAM), na Bahia, foi transferida da estatal para a Refinaria de Mataripe, controlada pela Acelen, do fundo Mubadala. Ainda assim, naquele mês, a Petrobras respondeu por 86,2% de todo o refino do país, com 52,5 milhões dos 60,9 milhões de barris refinados.
Além da RLAM, a Refinaria Isaac Sabbá (Reman), no Amazonas, e a Unidade de Industrialização do Xisto (SIX), no Paraná, já tiveram seus contratos de venda assinados, mas o processo de desinvestimento ainda não foi concluído. Segundo a Petrobras, quando a transferência da operação estiver efetivada, a estatal responderá por aproximadamente 50% do abastecimento do mercado de combustíveis no país.
A empresa se comprometeu a vender ainda as unidades Lubrificantes e Derivados de Petróleo do Nordeste (Lubnor), no Ceará; Abreu e Lima (Rnest), em Pernambuco; Gabriel Passos (Regap), em Minas Gerais; Presidente Getúlio Vargas (Repar), no Paraná; e Alberto Pasqualini (Refap), no Rio Grande do Sul.
“Mesmo se as oito refinarias que foram acordadas com o Cade forem vendidas com sucesso, a Petrobras ainda seria líder no refino do país, com presença nos principais mercados, especialmente no Sudeste”, diz o economista Ilan Arbetman, analista de petróleo e gás da Ativa Investimentos. “O poder de pricing [formação de preços] da Petrobras iria se manter alto, ela iria continuar sendo pricemaker [formadora de preços].”
Para ele, uma eventual privatização da Petrobras, como tem sido defendida por autoridades nos últimos meses, não modificaria o mercado de combustíveis, especialmente em se tratando de precificação dos produtos. O setor de refino, que hoje é praticamente um monopólio estatal, apenas passaria a sê-lo na iniciativa privada.
Conrado Magalhães, da Guide Investimentos, lembra que a dinâmica de preços praticada pela Petrobras está muito relacionada ao fato de o Brasil não ser autossuficiente no refino de petróleo para abastecer o mercado interno.
“Parte do problema dessa ausência do refino vem desse monopólio. A iniciativa privada é relutante em investir nesse espaço porque tem uma empresa estatal que pode absorver lucro”, diz. “A dinâmica que está elevando os preços agora não seria melhor com uma Petrobras privatizada.”