O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil caiu 0,1% no terceiro trimestre, em comparação aos três meses anteriores. No segundo trimestre, a geração de riquezas, que atingiu R$ 2,2 trilhões, já havia encolhido 0,4%, conforme dado revisado. Os dois resultados negativos em sequência configuram o que economistas chamam de recessão técnica.
O resultado foi divulgado nesta quinta-feira (2) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e veio abaixo do ponto médio das projeções de mercado, que sinalizava para estabilidade. O resultado também frustrou as expectativas do Ministério da Economia, que contava com alta de 0,4%.
Na comparação com o terceiro trimestre de 2020, o PIB subiu 4%. No acumulado de quatro trimestres, que indica a geração de riquezas ao longo de um ano inteiro, o crescimento foi de 3,9%. E no comparativo entre os três primeiros trimestres de 2020 e 2021, a expansão da economia é 5,7%.
O IBGE aponta que o PIB está nos níveis do fim de 2019 e ainda está 3,4% abaixo do ponto mais alto de atividade econômica do país, alcançado no primeiro trimestre de 2014.
O resultado do terceiro trimestre vem num momento em que as projeções de crescimento econômico vêm caindo. Segundo o relatório Focus (um conjunto de previsões de bancos, consultorias e corretoras compiladas pelo Banco Central), a expectativa para o PIB deste ano, em baixa há sete semanas, chegou a 4,78%. Para 2022, as projeções caem há oito semanas e agora apontam para expansão de apenas 0,58%.
Serviços crescem mais entre os setores
Na divisão por grandes setores (ótica da oferta), os resultados foram os seguintes:
- Serviços: +1,1% em relação ao segundo trimestre de 2021 e +5,8% em relação ao terceiro trimestre de 2020
- Indústria: 0% em relação ao segundo trimestre de 2021 e +1,3% em relação ao terceiro trimestre de 2020
- Agropecuária: -8% em relação ao segundo trimestre de 2021 e -9% em relação ao terceiro trimestre de 2020
O recuo na agropecuária (-8,0%) foi consequência do encerramento da safra de soja, que também acabou impactando as exportações. A coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, Rebeca Palis, explica que a colheita da soja, por ser muito mais concentrada nos dois primeiros trimestres, impacta no resultado.
O crescimento dos serviços foi puxado por outras atividades (4,4%), que reúnem diversos serviços prestados às famílias. Cinco atividades da categoria apresentaram crescimento: outras atividades de serviços (4,4%), informação e comunicação (2,4%), transporte, armazenagem e correio (1,2%), administração, defesa, saúde e educação públicas e seguridade social (0,8%).
As atividades imobiliárias (0,0%) ficaram estáveis e apenas as atividades financeiras, de seguros e serviços relacionados (-0,5%) e comércio (-0,4%) registraram variações negativas.
Segundo o IBGE, a retração nos serviços financeiros se deve, parcialmente, a um aumento nos sinistros dos planos de saúde. Já o comércio, teve uma forte alta no segundo trimestre com a reabertura da economia, e vinha de uma base comparativa mais alta. Outro fator que explica a retração nas vendas é que as famílias migraram parte de seu consumo para os serviços.
A indústria permaneceu estável no terceiro trimestre. O setor vem sofrendo os impactos da alta de preços dos insumos e a dificuldade de fornecimento de matérias-primas, como é o caso dos microprocessadores, que afetam as montadoras.
Consumo puxa expansão do lado da demanda
Sob a ótica da demanda, o IBGE revelou as seguintes variações no terceiro trimestre:
- Consumo das famílias: +0,9% em relação ao segundo trimestre de 2021 e +4,2% em relação ao terceiro trimestre de 2020
- Consumo do governo: +0,8% em relação ao segundo trimestre de 2021 e +3,5% em relação ao terceiro trimestre de 2020
- Investimentos (Formação Bruta de Capital Fixo): -0,1% em relação ao segundo trimestre de 2021 e +18,8% em relação ao terceiro trimestre de 2020
- Importação: -8,3% em relação ao segundo trimestre de 2021 e +20,6% em relação ao terceiro trimestre de 2020
- Exportação: -9,8% en relação ao segundo trimestre de 2021 e +6,6% em relação ao terceiro trimestre de 2020
Segundo o IBGE, a balança de bens e serviços negativa acabou puxando a variação do PIB para baixo, na comparação com o trimestre anterior.
Governo defende "qualidade do crescimento"
Em nota, a Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Economia afirmou que "mais importante do que considerar o número do crescimento, é observar a sua qualidade". Deu mais destaque ao crescimento de 4% na comparação com o terceiro trimestre de 2020 e afirmou que "é fundamental distinguir o que é política econômica de fatores climáticos adversos e pontuais da natureza, devese ressaltar que se observa a maior crise hídrica em 90 anos de história".
A secretaria também enfatizou que os dados do PIB são passíveis de revisão, observando que o IBGE acaba de recalcular (para melhor) a queda da economia em 2020.
A equipe do ministro Paulo Guedes ressaltou os avanços das taxas de poupança e investimento. "A taxa de poupança chegou a 18,6% do PIB no terceiro trimestre, retornando ao nível do mesmo trimestre de 2014. Por sua vez, a taxa de Investimento atingiu 19,4%, retomando o patamar do começo da década passada", diz a nota.
Em outro trecho, a SPE volta a destacar a "melhora na qualidade do crescimento", apesar das duas retrações trimestrais consecutivas do PIB. "Se até 2013 o investimento era, em grande parte, financiado com recursos públicos, hoje o investimento é financiado majoritariamente pelo setor privado: os recursos, através de decisões do setor privado, vão para onde é mais eficiente e não mais para onde o Estado determina. A redução de direcionamento de crédito é fundamental para retomada do investimento."
A principal razão para a frustração da expectativa do Ministério da Economia em relação ao terceiro trimestre foi o desempenho do agronegócio. A pasta esperava variação zero em relação ao segundo trimestre e alta de 1% sobre o mesmo período do ano passado, porém o IBGE revelou variações de -8% e -9%, respectivamente. "Se fosse zerada a variação da agropecuária na margem, o PIB cresceria na ordem de 0,3% a 0,4% no 3T21 em relação a 2T21", diz o comunicado da SPE.
A equipe econômica também mencionou "forte recuperação do setor de serviços, condizente com a melhora no mercado de trabalho e aumento da mobilidade". "Pelo lado da demanda, há elevação da absorção interna, puxada principalmente pelo maior crescimento do consumo das famílias desde o final do ano passado", diz o texto.
A nota também destaca a forte recuperação do mercado de trabalho. Dados divulgados nesta semana mostraram uma queda na taxa de desemprego no terceiro trimestre e geração de vagas formais em outubro.
Reações do mercado
O desempenho do PIB ficou ligeiramente aquém do esperado pelo mercado, refletindo o aumento dos preços, as restrições de oferta na indústria e a queda na produção agrícola. Segundo o economista Alexandre Almeida, da CM Capital, o que segurou o desempenho foi o setor de serviços, do lado da oferta, e o consumo das famílias, do lado da demanda.
"Estamos em uma economia enfraquecida, com desaceleração da indústria e dos serviços, e pressionada pela inflação, que está comendo renda, e pelos juros", diz o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale.
Para Rodolfo Margato, economista da XP Investimentos, o consumo total - incluindo famílias e governo - teria sido mais intenso se não fosse a alta nos preços. O consumo ajudou a contrabalançar os números fracos da formação bruta de capital fixo. Mas, as atividades varejistas foram bastante prejudicadas pelo aumento da inflação e do efeito do deslocamento da maior proporção dos gastos das famílias do mercado de bens para o setor de serviços.
"A surpresa veio em uma queda mais forte no setor de produção agropecuária, que despencou 8% no período, especialmente por conta da quebra de safras agrícolas, como do milho, cana de açúcar, algodão e café, e da fraqueza da pecuária", diz Rachel de Sá, chefe de economia da Rico.
Uma avaliação similar é feita pelos economistas do banco Original, que apontam que o setor agropecuário sofreu os impactos da quebra da segunda safra de milho e a forte queda nos abates de bovinos, em decorrência da suspensão das exportações para a China.
IBGE revê dados de 2020
O IBGE também divulgou nesta quinta-feira uma revisão dos dados de 2020. A variação do PIB no ano passado, até então calculada -4,1%, foi alterada para -3,9%.
A principal razão foi o crescimento mais forte da agropecuária: em vez de 2%, o crescimento desse setor no ano passado passou a 3,8%. Também houve pequenas mudanças no desempenho de indústria e serviços, cujas retrações ficaram ligeiramente mais suaves após a revisão.
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