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PIB

Qual foi o crescimento das economias do Brasil e de outros países nos últimos anos

O PIB do Brasil cresceu abaixo da média mundial em todos os anos desde 2010. (Foto: Hugo Harada/Arquivo/Gazeta do Povo)

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As projeções para o crescimento da economia brasileira em 2022 têm melhorado. De abril para cá, as expectativas do Fundo Monetário Internacional (FMI) passaram de 0,8% para 2,8%, segundo relatório publicado neste mês. O número atual é ligeiramente superior à estimativa oficial do governo federal para o avanço do PIB, hoje em 2,7%. Algo parecido ocorreu com as apostas de economistas no Brasil: segundo a mediana das previsões do mais recente relatório Focus do Banco Central, a expansão estimada para 2022 é de 2,76%. No começo do ano, esperava-se algo próximo de 0,3%, apenas.

De acordo com o FMI, o Brasil crescerá mais que a média das economias avançadas, para as quais a previsão é de uma expansão média de 2,4% neste ano. Porém, outras comparações são desfavoráveis ao país. Se confirmadas as projeções, nossa economia vai avançar menos que a média da América Latina e Caribe (de 3,5%, segundo o FMI), abaixo das economias emergentes (3,7%) e também abaixo da média mundial (3,2%).

O ritmo de crescimento inferior à média global não é fenômeno recente. A última vez que o Brasil avançou acima dela foi em 2010.

Nos últimos quatro anos, durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), o país cresceu a uma média de 1,1% ao ano, metade da expansão do PIB mundial (2,2% ao ano). Os dados consideram os resultados efetivos de 2019, 2020 e 2021, mais as projeções do FMI para 2022.

Com isso, o Brasil fica na 117.ª posição do ranking mundial de crescimento nesses quatro anos, considerando os 192 países para os quais o Fundo tem dados completos do período.

Entre as 20 maiores economias globais, o Brasil fica na 11.ª posição, à frente das principais economias europeias, mas atrás de emergentes como Turquia, Índia e Indonésia, e de gigantes como China e Estados Unidos.

A tabela abaixo mostra o crescimento médio anual dessas 20 economias entre 2019 e 2022, considerando os resultados efetivos do PIB de 2019, 2020 e 2021 e as projeções mais recentes do FMI para 2022:

O desempenho do Brasil foi ainda pior nos quatro anos anteriores (2015-18), sob Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB), quando nossa economia andou para trás (com retração de 1% ao ano, em média) em meio a um movimento de expansão mundial (3,5% ao ano). Com isso, o Brasil ficou 185.ª posição no ranking do crescimento, dentre 195 países com dados completos. Foi o segundo pior desempenho entre os países da América Latina e Caribe, à frente apenas da Venezuela.

O Brasil também cresceu menos que a média no primeiro mandato de Dilma (2011-14): 2,3% ao ano, contra 3,7% do mundo.

Uma das poucas exceções no passado recente foi o segundo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (2007-2010), quando o país cresceu 4,6% anuais, contra 3,5% anuais do mundo. Nos quatro primeiros anos do petista, o PIB brasileiro avançou abaixo do PIB global – as taxas foram de 3,5% e 5%, respectivamente.

O Brasil também perdeu para o índice mundial nos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). No governo do tucano, o país cresceu mais que a média do mundo apenas em 1995 e 2002.

O Brasil vem patinando desde a década de 1980. Em um intervalo de 43 anos (que inclui o ano de 1980 e também os dados projetados para 2022), o crescimento anual do PIB brasileiro foi inferior ao mundial em 31 ocasiões, e superior apenas em 12.

Nessas pouco mais de quatro décadas, o Brasil cresceu a uma média de 2,25% ao ano, próxima à de México e Canadá, ante uma expansão média de 3,35% do PIB mundial, o que o coloca na 95.ª posição do ranking de crescimento, em uma lista de 135 países para os quais há dados completos desse período.

Quatro das cinco economias com maior expansão no PIB desde 1980 estão na Ásia. O destaque entre as grandes potências é a China, com um crescimento de 9,05% ao ano, em média. A maior expansão foi da Guiné Equatorial (11,80% ao ano), país da África Central governado por uma ditadura e beneficiado pela extração de petróleo. Só duas economias encolheram no acumulado desses 43 anos: a Líbia (-1,72% ao ano) e a Venezuela (-1,55%).

Os gráficos abaixo mostram o crescimento do PIB do Brasil e de grupos selecionados (mundo, América Latina e Caribe, países emergentes e desenvolvidos), ano a ano, de 1980 a 2022. Os dados até 2021 são os resultados efetivos do PIB, e os de 2022 representam as projeções mais recentes do FMI, de outubro (a reportagem prossegue após os gráficos).

Quais as explicações para o baixo crescimento crônico do Brasil

Samuel Pessôa, pesquisador sênior do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), aponta que o problema de baixo crescimento no longo prazo da economia brasileira é extremamente complexo. “Em jogo, há questões como a falta de reformas, problemas com a qualidade da educação brasileira e fatores institucionais”, diz.

O gerente executivo de economia da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Mário Sérgio Telles, aponta que, para assegurar um crescimento de longo prazo sustentável, é preciso investir em três frentes:

  • aumentar o estoque de capital, por meio de mais investimento;
  • aumentar a produtividade da economia, por meio de melhor aproveitamento da mão de obra e do capital investido; e
  • expandir o mercado de trabalho.

“O Brasil cresce pouco porque a produtividade não avança”, diz Telles. Os últimos dados disponíveis para a indústria, do segundo trimestre de 2022, mostram que a produção está 6,8% abaixo da média de 2019 e nos mesmos níveis do quarto trimestre de 2015, aponta a CNI.

Problemas estruturais também afetam uma expansão da economia brasileira com maior vigor e de forma mais sustentável, destaca a economista Alessandra Ribeiro, sócia da consultoria Tendências. É o caso da baixa taxa de investimento, que não é suficiente para dar tração ao crescimento. No segundo trimestre deste ano, o investimento produtivo correspondia a 18,7% do PIB, segundo o IBGE. Países da América do Sul como o Chile têm taxas maiores: 21,5%.

Outro problema levantado pelo gerente da CNI, é que o país não está sabendo aproveitar o período do bônus demográfico, em que há mais gente em idade de trabalhar. “É uma época que está passando e o Brasil não ampliou a produtividade e não melhorou seu estoque de capital, por meio de investimento.”

O cenário tornou-se mais complexo nos últimos anos e foi agravado pela recessão que o Brasil enfrentou em 2015 e 2016 e pela pandemia, diz Ribeiro: “A crise demorou, a reconstrução tomou ritmo a partir de 2017 e crescemos um pouco nos anos seguintes até a pandemia.”

Falta de avanço nas reformas dificulta expansão mais forte do PIB

Outro entrave, segundo os especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo é a falta de avanço nas reformas, o que afeta indiretamente a produtividade. É o caso da reforma tributária. Nosso atual sistema de tributos provoca distorções que acabam influenciando as escolhas empresariais. “Essa reforma facilitaria uma melhor alocação dos fatores de produção”, cita Ribeiro.

Um dos exemplos mais claros dos impactos dessa situação, de acordo com Telles, é a indústria da construção civil, que estruturou seu modelo com base na carga tributária: “Aqui no Brasil quase tudo é feito no canteiro de obras. Lá fora é uma atividade mais industrializada, ocorrendo apenas a montagem final no local, com peças pré-prontas para serem usadas na obra.”

Um ponto a favor das maiores economias é que, no geral, elas cobram apenas um tributo sobre a atividade, o Imposto sobre o Valor Agregado (IVA). “Por aqui, há vários, como o ISS, que incide sobre a atividade; o ICMS, sobre os fornecedores. Isto acaba gerando uma cumulatividade e resíduos tributários”, diz o economista.

Um estudo feito pela CNI em parceria com a LCA Consultores mostra que esse resíduo corresponde a 7,4% do preço líquido de venda, o que acaba afetando na competitividade interna e externa.

Outro problema, citado por Pessôa, é a complexidade do sistema tributário brasileiro, que favorece o litígio. Um termômetro dessa situação é o tamanho dos departamentos tributários nas empresas de médio e grande porte. Outro são as despesas com advogados. “É um dinheiro que, em parte, poderia ser direcionado para inovação, pesquisa e desenvolvimento”, diz o economista.

Reformas já realizadas começam a produzir efeito

Os especialistas apontam que não dá para considerar as reformas como sendo uma “bala de prata” para resolver o problema de baixo crescimento. Mas são unanimes ao afirmar que algumas das reformas já implementadas – como a trabalhista, a previdenciária e as microeconômicas – já começam a se refletir na economia brasileira. “As reformas estão maturando aos poucos. É coisa que leva tempo”, ressalta o pesquisador do Ibre/FGV.

Uma das que já está produzindo resultados, na avaliação deles, é a trabalhista, que saiu do papel em 2017. Um dos reflexos é a redução no contencioso trabalhista. Outro impacto relevante e que foi visível durante a pandemia, segundo o gerente da CNI, foi a flexibilização dos contratos trabalhistas.

A reforma da Previdência também está surtindo efeitos, apontam Pessôa e Ribeiro. Eles avalia que o conjunto de medidas contribuiu, ao lado da melhoria da arrecadação, para a sucessão de desempenhos positivos no resultado primário do setor público consolidado, acumulado em 12 meses, desde novembro do ano passado. “O cenário fiscal seria pior se não houvesse a reforma da Previdência”, diz a sócia da Tendências.

Reformas microeconômicas também estão favorecendo investimentos, destaca Telles, da CNI. É o caso dos marcos legais do saneamento e do gás natural, que devem resultar em obras nos próximos anos.

Mas é preciso mais, afirma Ribeiro. Apesar da Lei de Liberdade Econômica, de 2019, é preciso avançar em reformas que melhorem o ambiente de negócios.

“O Brasil está mal posicionado”, diz ela. No Índice de Liberdade Econômica, da Heritage Foundation, o Brasil ocupa a 133.ª posição. E entre os países da América Latina e do Caribe é o sétimo pior, à frente apenas de Venezuela, Cuba, Bolívia, Suriname, Haiti e Argentina.

Educação afeta a produtividade e inibe crescimento

Um problema que também influi no baixo crescimento brasileiro é a questão educacional, que se reflete nas dificuldades para ampliar a produtividade. Uma pesquisa feita pela FGV mostra que, entre 1995 e 2021, o único setor que teve ganhos consistentes de produtividade foi a agropecuária.

Pessôa aponta que o Brasil tem problemas históricos com a baixa qualidade do ensino. É um atraso que remonta ao século 19 e que ganhou contornos piores com a urbanização a partir de meados do século passado. “O brasileiro migrou do campo para a cidade sem que houvesse uma maior preocupação com a educação de base”, diz.

Outro fator que, em sua avaliação, complicou a questão educacional foi o foco dado durante muito tempo ao ensino superior. O pesquisador diz que a partir da redemocratização, em 1985, o cenário na educação fundamental melhorou. “Não é um problema de investimentos, mas sim de qualidade. Aprende-se pouco.”

A situação foi agravada pela pandemia, que favoreceu a evasão escolar, complementa a sócia da Tendências.

Privilégios também afetam o PIB

A entidade empresarial também reclama que empresas e setores que não são mais produtivos acabam sendo privilegiados. Um termômetro disso, segundo Telles, é a questão tributária. “A indústria, que é o setor mais produtivo, acaba sendo penalizada.”

Outro problema levantado pelo gerente da CNI está relacionado à questão tributária: a guerra fiscal entre as unidades da federação. “Empresas são instaladas em lugares menos eficientes por causa dos incentivos fiscais”, ressalta.

Segundo o professor Fernando de Holanda Barbosa, da Escola Brasileira de Economia e Finanças da FGV (EPGE/FGV), o estado brasileiro está quebrado porque concede muitos privilégios. E, por isso, o Brasil apresenta baixas taxas de crescimento, insuficientes para reduzir as desigualdades sociais.

A importância da questão fiscal

Telles avalia que, com o teto de gastos, o controle fiscal melhorou nos últimos anos. Um dos trunfos obtidos foi a redução do custo de financiamento do Estado. O resultado primário – arrecadação menos despesas totais do governo, excluído o pagamento de juros da dívida – foi de 1,97% do PIB nos 12 meses encerrados em agosto. Ele chegou a ser de -3,04% do PIB nos 12 meses encerrados em setembro de 2016, antes da entrada em vigor do teto de gastos.

Outra contribuição dada pelo teto de gastos foi o aumento na credibilidade em direção a um caminho sustentável para as contas públicas, e a queda na curva futura de juros. “Isto é investimento na veia. Viabiliza novos empreendimentos”, ressalta Ribeiro.

Porém, os riscos fiscais aumentaram recentemente. Boa parte do resultado positivo dos últimos meses pode ser atribuída à recuperação econômica além do esperado, que resultaram em recordes de arrecadação.

“O teto de gastos contribuiu para reduzir as taxas de juro. Mas a quebra do teto [no segundo semestre de 2021, com a mudança de regra promovida pelo governo], contribuiu para uma piora na percepção do risco de investir na economia brasileira”, diz Pessôa, da FGV.

É grande a incerteza sobre o que será feito de 2023 em diante. Tanto Bolsonaro quanto Lula, que disputam o segundo turno das eleições presidenciais, indicaram que pretendem substituir o teto de gastos por algum outro dispositivo.

Conteúdo editado por: Fernando Jasper

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