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Sob forte impacto da pandemia de coronavírus, o Produto Interno Bruto (PIB) desabou no segundo trimestre. O país gerou R$ 1,653 trilhão em riquezas no período, 9,7% menos que nos três primeiros meses do ano e 11,4% abaixo do valor registrado no segundo trimestre de 2019.
Trata-se, em ambas as comparações, da maior queda trimestral da série histórica iniciada em 1996. Os números foram divulgados nesta terça (1.º) pelo IBGE.
Segundo o instituto, no acumulado do primeiro semestre a economia brasileira encolheu 5,9%, na comparação com a primeira metade de 2019.
A queda do PIB no segundo trimestre foi a segunda consecutiva. No primeiro, quando o distanciamento social mostrou seus primeiros efeitos, a atividade econômica já havia recuado 2,5% em relação aos três meses anteriores – esse número, inicialmente de -1,5%, foi revisado pelo IBGE – e 0,3% na comparação com o mesmo período do ano passado.
O péssimo resultado do intervalo de abril a junho já era esperado. A Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Economia previa algo entre 8% e 10%, e economistas de bancos, consultorias e corretoras projetavam queda entre 7% e 11%, com mediana de -9,2%.
Desempenho tão ruim, no entanto, não deve se repetir. Muita coisa mudou de lá para cá. Indicadores mostram que a atividade econômica começou a sair do fundo do poço ainda no segundo trimestre, nos meses de maio e junho, e manteve-se em recuperação na sequência.
Entre os motivos para a reação estão o pagamento do auxílio emergencial de R$ 600, que começou em abril e deu algum sustento ao consumo das famílias, e a gradual reabertura do comércio e de outras atividades.
As projeções para o PIB do ano todo têm melhorado há nove semanas consecutivas, muito embora ainda apontem para uma queda recorde. A atual projeção mediana de economistas e bancos é de que a economia vai encolher 5,28% no acumulado de 2020. No pior momento, no fim de junho, os economistas previam um tombo na casa dos 6,5%.
Os piores resultados do PIB na história foram registrados em 1990, quando a economia encolheu 4,35%, e 1981 (-4,25%). Na última recessão, as quedas foram de 3,55% em 2015 e 3,28% em 2016.
Como o governo avalia o PIB do segundo trimestre
Em nota distribuída à imprensa, o Ministério da Economia destaca que, apesar da forte queda, a redução da atividade no Brasil "está entre as menores em relação às principais economias". "Por exemplo, a queda no 2.º trimestre nos países do G7, quando comparado ao mesmo trimestre de 2019, foi de -11,9%. Algo semelhante ocorre para os países emergentes como Chile, México e Índia foram de -13,7%, -19% e -23,9%, respectivamente", diz o comunicado.
O ministério enfatiza que "as medidas de preservação de emprego e manutenção da renda limitaram a deterioração mais aguda da economia", e que "os indicadores de maior frequência mostram que a atividade continua recuperando", notadamente no varejo e na indústria.
Mas a nota também afirma que, "para que a retomada seja consistente, é importante a continuidade da agenda de reformas estruturais e da consolidação fiscal".
"O diagnóstico do baixo crescimento da economia brasileira é a baixa produtividade, resultado da má alocação de recursos. Não há outro caminho que resulte em elevação do bem-estar dos brasileiros a não ser medidas que busquem a correção da má alocação e incentive a expansão do setor privado", diz o texto da equipe econômica.
Investimento, consumo das famílias e despesas do governo diminuíram
Sob a ótica da demanda, a queda do PIB no segundo trimestre foi resultado da queda do investimento produtivo (medido pela Formação Bruta de Capital Fixo, que caiu 15,4% em relação ao primeiro trimestre), do consumo das famílias (-12,5%) e das despesas do governo (-8,8%).
O único impacto positivo veio do comércio exterior: as exportações de bens e serviços aumentaram 1,8%, ao passo que as importações diminuíram 13,2%, segundo o IBGE.
Indústria e serviços despencaram, agropecuária cresceu
Sob a ótica da oferta, o único resultado positivo entre os grandes setores veio da agropecuária, cujo PIB avançou 0,4% na passagem do primeiro para o segundo semestre.
A atividade da indústria diminui 12,3%, afetada pela forte queda em segmentos como a indústria de transformação (-17,5%) e a construção (5,7%), entre outros.
Nos serviços, maior setor da economia brasileira, o tombo foi de 9,7% no segundo trimestre. A baixa foi disseminada por vários segmentos, com destaque para "outras atividades de serviços" (-19,8%), transporte, armazenagem e correio (-19,3%), e comércio (-13,0%). Por outro lado, o IBGE reportou leve avanço em atividades financeiras, de seguros e serviços relacionados (0,8%) e atividades imobiliárias (0,5%).
Menos investimento, mais poupança: os efeitos sobre a economia no futuro
Com menos obras e gastos em máquinas, equipamentos e pesquisa, a chamada taxa de investimento correspondeu a 15% do PIB no segundo trimestre, abaixo da observada em igual período do ano passado (15,3%). Nos melhores momentos da série histórica, esse índice superou 20% do PIB.
O recuo dos investimentos, caso se prolongue, é um mau indicador para o futuro da economia. Em geral, quanto menos se investe, menor é a capacidade de o país crescer sem provocar pressões inflacionárias.
Por outro lado, a queda no consumo acabou levando ao menos parte da população e das empresas a poupar. Com isso, a taxa de poupança aumentou de 13,7% do PIB no segundo trimestre de 2019 para 15,5% no mesmo período deste ano.
Conforme a Gazeta do Povo mostrou na semana passada, o aumento da poupança pode ter reflexo positivo na economia nos próximos meses, caso os consumidores retomem a confiança após o período mais crítico da pandemia.
Porém, há dúvidas sobre quanto do que foi poupado nos últimos meses vai se converter em consumo. Além disso, a redução no valor do auxílio emergencial – as próximas quatro parcelas serão de R$ 300, metade do valor pago até agosto – tende reduzir um pouco o ímpeto das classes mais baixas, se o mercado de trabalho não conseguir absorver a massa gigantesca que perdeu o emprego na crise.