As projeções para o crescimento do PIB brasileiro em 2022 estão aumentando há cinco semanas, segundo expectativas apuradas pelo relatório Focus, do Banco Central (BC). Passaram de 0,5% para 0,7%. No mesmo período, o ponto médio das projeções para 2023 caiu de 1,5% para 1%. Mas por que isso acontece? "É um efeito da base de comparação: quando um ano sobe, o outro desce", diz Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research.
Uma série de fatores está ajudando nas expectativas para 2022. Segundo o economista Rodolfo Margato, da XP Investimentos, a economia brasileira mostrou sinais de resiliência no início de 2022, com reabertura, principalmente no segmento de serviços; recuperação sólida do emprego – foram 615,2 mil postos de trabalho abertos no primeiro trimestre, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged); e dinâmica favorável dos preços das commodities.
O desemprego também atingiu, no final de março, a taxa de 11,1%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), um patamar inferior ao registrado antes da pandemia da Covid-19. A população ocupada total está em 95,3 milhões de pessoas, superando os níveis pré-pandemia.
“Além disso, os dados de atividade acima do esperado no final de 2021 e o anúncio recente de medidas governamentais de estímulo também contribuem para elevar as expectativas de crescimento econômico”, aponta ele. A corretora reviu a projeção de crescimento para este ano de 0% para 0,8%.
Ventos favoráveis para o PIB em 2022
Margato destaca que alguns segmentos mostraram desempenho positivo ao longo do primeiro trimestre, como a “sólida trajetória de recuperação da construção civil, serviços de transporte e armazenagem, serviços de informação e comunicação e outros serviços (incluem serviços prestados às famílias).”
Outros ventos favoráveis também sopram a favor da economia brasileira, particularmente no primeiro semestre.
Em destaque, de acordo com a corretora, estão as perspectivas de aumento dos investimentos públicos, impulsionados principalmente pelos governos estaduais; as estimativas favoráveis para atividades menos sensíveis ao ciclo econômico, como a agropecuária, apesar das revisões baixistas para a safra de grãos, e para a indústria extrativa mineral, como o petróleo e o gás; e os estímulos à economia, com a antecipação do 13° para aposentados e pensionistas e a liberação de parcela do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). “Tivemos, também uma boa herança estatística vinda de 2021”, lembra Margato.
O Itaú também reviu, no início de abril, suas projeções de expansão do PIB. O banco que, no ano passado, projetou uma retração de 0,5% na economia brasileira para 2022, passou a trabalhar com um cenário de expansão de 0,2% e, em abril, passou a estimar um crescimento de 1,0%.
Segundo o banco, a revisão incorpora a melhoria da projeção no primeiro trimestre deste ano e a liberação de recursos do FGTS.
“Os juros altos têm afetado negativamente o crescimento, mas, por outro lado, o cenário positivo de preços de commodities e estímulos fiscais são fatores que contribuem positivamente para a demanda agregada no curto prazo”, destacam os economistas da instituição financeira.
Quem também reviu as expectativas de crescimento foi a consultoria MB Associados, que passou suas projeções de 0% para 0,5%. “Mas o Brasil tem potencial para entregar mais”, diz o economista-chefe, Sérgio Vale, se referindo à baixa taxa de crescimento projetada para este ano.
No segundo semestre, ele aponta que o consumo, responsável por 64% do PIB brasileiro, esteja em uma situação mais complicada, por causa da inflação elevada e do aumento nos juros, que deve ter impactos sobre as compras a prazo.
Outro indicador que tende a ser impactado negativamente pela alta nos juros é o investimento, que teve um bom desempenho no ano passado. Houve uma expansão de 17,2% em comparação a 2020.
“O custo do crédito está aumentando muito”, diz Vale. Desde o início do atual ciclo de aperto monetário, em março do ano passado, a taxa de juros cobrada pelas instituições financeiras das empresas passou, segundo o BC, de 0,81% ao mês para 1,21% ao mês, entre fevereiro de 2021 e 2022.
Expectativas mais tímidas para o segundo semestre de 2023
Mas, mesmo diante desse cenário mais favorável para o primeiro semestre, as expectativas para a economia brasileira são mais tímidas para 2023. Bancos, consultorias e corretoras projetam um crescimento menor. Nas últimas quatro semanas, elas caíram de 1,3% para 1%, de acordo com dados divulgados pelo BC.
Margato aponta que o cenário continua desafiador e aponta que a dinâmica da atividade econômica será muito diferente entre os semestres de 2022.
“O aperto da política monetária deve impactar mais fortemente a demanda a partir de meados do ano, especialmente os investimentos privados e o consumo de bens duráveis. Inflação alta, salários deprimidos, elevado endividamento das famílias, incertezas políticas, restrições persistentes nas cadeias de suprimentos – pesando sobre a produção industrial – e menor crescimento econômico global compõem o conjunto de ‘ventos contrários’ para o PIB nos próximos trimestres”, destaca o economista.
A corretora reviu a projeção de crescimento do PIB em 2023 de 1,2% para 0,5%, considerando duas hipóteses: a dissipação dos choques causados pela pandemia e pela guerra na Ucrânia, e a manutenção do arcabouço fiscal vigente que visa à sustentabilidade da dívida pública no curto prazo.
Ele também avalia que caso alguma destas premissas não se confirme, o desempenho da atividade econômica no próximo ano poderá ser pior. “As perspectivas para o PIB consideram um processo de desinflação (queda da inflação) gradual na economia e flexibilização monetária (corte nos juros) a partir do final do primeiro trimestre de 2023.”
O maior risco é a persistência dos gargalos, que pode impactar negativamente no crescimento industrial e pesar na inflação de bens industriais. Em março, ela atingiu 3,13%, segundo o IBGE, a maior desde março de 2021. “Sem a descompressão da inflação, os sinais de enfraquecimento da atividade econômica persistirão”, diz Margato.
O Itaú também reviu para baixo as projeções do crescimento da economia no próximo ano, passando de 0,5% para 0,2%. A justificativa para este rebaixamento são os juros mais elevados, a expectativa de moderação nos preços das commodities e o carrego estatístico negativo, devido à contração do PIB no segundo semestre deste ano. “[Estes] são os principais fatores indicando estagnação da atividade econômica no ano que vem.”
Cenário internacional sinaliza ventos contrários
Sergio Vale, da MB Associados, diz que o cenário internacional também sinaliza ventos contrários. Há o risco de recessão da economia americana em 2023. A maior economia global tem a maior inflação dos últimos 40 anos e, na última quarta-feira (4), promoveu um aperto monetário com alta de meio ponto percentual na taxa básica de juros e venda de ativos, como forma de enxugar a liquidez.
A Inglaterra já subiu suas taxas e a União Europeia deve fazer o mesmo nos próximos meses, destaca Gustavo Sung, da Suno Research.
“A China também deve enfrentar uma desaceleração, em função dos rígidos controles em relação à pandemia da Covid-19”, diz Vale. Dados do Fundo Monetário Internacional projetam um crescimento de 4,3% do PIB em 2022. As expectativas já foram maiores. Para 2023, a sinalização é de uma expansão de 5,1%.
A Allianz Trade estima que o surto de ômicron na China custe o equivalente a 0,4 ponto percentual do PIB. A empresa estima que uma demanda menor por parte da segunda maior economia global implica em uma redução mundial de US$ 140 bilhões nas exportações. “Do lado da oferta, uma parada repentina na atividade industrial chinesa causaria riscos ao produto global. A continua disrupção criará pressão inflacionária global.”
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