A Embaixada dos Estados Unidos em Brasília recomendou a Washington que mantivesse o Brasil na lista dos países com grave problema de pirataria, revelam documentos divulgados ontem pelo site WikiLeaks. Em 2003 e 2004, a representação norte-americana enviou telegramas ao Departamento de Comércio americano aconselhando o órgão a não excluir o Brasil da "lista prioritária de vigilância" do Special 301 Review – um estudo sobre direitos intelectuais feito anualmente pelo órgão. A análise dos documentos vazados mostra que, ao menos durante os primeiros quatro anos do governo Lula, a embaixada dos EUA em Brasília se mostrou preocupada com a política de direitos autorais brasileira, vista pelos EUA como frágil e sem fiscalização adequada.

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Em uma das mensagens, enviada em junho de 2006, o Consulado em São Paulo cita o episódio em que o presidente Lula teria supostamente assistido a uma cópia pirata do filme Dois filhos de Francisco, em 2005. Em outra mensagem, de dezembro de 2007, a diplomacia americana aborda o caso do filme Tropa de elite: "A pirataria não atinge somente os artistas americanos, mas também os brasileiros. Tropa de elite é a produção mais pirateada da história do país", diz o documento.

Para os Estados Unidos, a legislação brasileira é incapaz de desestimular a falsificação de produtos. Em telegrama de 2006, o Consulado em São Paulo comenta: "Os bens pirateados hoje têm uma clientela mais sofisticada, e muitos criminosos estão se especializando em certas marcas, como a Louis Vuitton. De acordo com a lei do Brasil, (...) as companhias precisam ter uma representação no país para prestar queixa. Infelizmente, duas das marcas mais pirateadas, Polo Sport e Ralph Lauren, não têm escritórios aqui".

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Para Carlos Mendonça, especialista em direitos autorais e segurança digital, o alto consumo de produtos pirateados no Brasil pode ser explicado por questões culturais. "A população, por ter um baixo poder aquisitivo, não vê problemas em ir ao camelô para comprar um filme ou um CD de música", afirma.

Medicamentos

Os telegramas também revelam a preocupação dos laboratórios farmacêuticos em relação à quebra da patente de medicamentos antirretrovirais, utilizados em pacientes com aids. "A adulação global ao programa antiaids brasileiro (...) torna provável o uso de licenças compulsórias para garantir o suprimento de remédios contra a aids, a menos que os laboratórios negociem reduções de preço", afirma a embaixada, em telegrama de 2003.

Apesar de diversos avanços, incluindo penalidades mais pesadas para infrações de direito autoral e crescentes (porém isoladas) ações policiais contra roubo de propriedade intelectual, o governo Lula ainda não desenvolveu uma estratégia nacional adequada para garantir a aplicação das leis de propriedade intelectual. Vários sinais sugerem que o progresso está a caminho, mas até agora pouco de concreto pode ser visto na justiça brasileira.Telegrama enviado pela Embaixada dos Estados Unidos no Brasil, em fevereiro de 2004.