Diferentemente do que foi feito pelo ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy, que apresentou um grande número de propostas para melhorar as contas públicas, um eventual governo de Michel Temer vai concentrar esforços em um conjunto pequeno de iniciativas na área econômica que busca rever a estrutura dos gastos e, no médio prazo, conter e até reverter o aumento da dívida, recuperando a confiança dos investidores na capacidade de o País pagar as suas contas. A mudança de percepção, acredita-se, ainda pode abrir espaço, no curto prazo, para uma queda mais rápida da taxa de juros que a esperada pelo mercado.
Logo de saída, a prioridade é aprovar duas medidas no Congresso: a fixação de um teto para as despesas e a desvinculação de gastos sociais, em particular a de benefícios ao salário mínimo. Mais à frente, podem sugerir reformas na Previdência.
O foco do pacote é sinalizar, logo de início, que haverá queda na trajetória da dívida no médio prazo, o que tende a resgatar a confiança e gerar um efeito dominó benéfico. Estima-se que haverá a volta dos investimentos, em especial internacionais, seguida de recuo na cotação do dólar. Nesse ambiente, a inflação, que já está cedendo, terá alívio adicional, o que abriria terreno para o Banco Central reduzir a Selic, a taxa básica de juros. Adicionalmente, seria possível cortar a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP). Ela é usada nos financiamentos a empresas concedidos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
O diagnóstico desenhado nas últimas semanas aponta que uma queda mais rápida dos juros serviria como um instrumento importante para o ajuste fiscal e para a retomada do crescimento econômico. Afinal, só com o fim da recessão e a volta do crescimento será possível melhorar a arrecadação, que não para de cair. Com o choque de confiança, alguns economistas acham que a Selic, hoje em 14,25%, pode fechar o ano em 11,25% ou perto disso.
A fixação de um teto para o total das despesas é vista também como uma ferramenta para melhorar a gestão de todos os gastos, até mesmo dos fixos, que o governo não tem autonomia para mexer. Isso ocorre porque, ao se determinar um teto, todas as despesas serão reduzidas proporcionalmente. Na prática, significa, por exemplo, que não é necessário desvincular os gastos com Saúde e Educação, fixados na Constituição.
As concessões públicas já em curso serão tocadas, mas o eventual novo governo vai reformular esse programa, considerado fundamental. De um lado, ele pode reforçar o caixa com receitas extraordinárias, inclusive com dólares de investidores externos. De outro, vai auxiliar na retomada do emprego, mais uma peça considerada central na política econômica que está sendo desenhada.
Equipe
Escolhido pelo vice-presidente para comandar a economia, o ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles está definindo nomes justamente para a presidência do BC e para o comando dos bancos oficiais - Banco do Brasil, BNDES e Caixa Econômica Federal. Nesta segunda-feira, 2, Meirelles deverá se reunir com o senador Romero Jucá (PMDB-RR), indicado para o Ministério do Planejamento, e um dos principais interlocutores de Temer. Meirelles apresentou a Temer quatro nomes para o BC: Carlos Kawall, ex-secretário do Tesouro Nacional, Ilan Goldfajn, Afonso Bevilaqua e Mário Mesquita. Os três últimos ex-diretores do BC.
Para a equipe do Ministério da Fazenda, um dos cotados é o ex-diretor do BC Carlos Hamilton, que é diretor da J&F, que controla a JBS. Meirelles é presidente do conselho consultivo da J&F. A orientação do vice-presidente é de que a equipe do BC tenha sintonia e com a do Ministério da Fazenda. Interlocutores do vice afirmam que não é intenção no momento discutir a independência operacional do Banco Central, que manterá a autonomia para decidir os rumos da política monetária.
Para mercado, agenda Temer precisa ser objetiva
Para economistas ouvidos pela reportagem, faz todo o sentido um eventual governo de Michel Temer ter uma agenda econômica objetiva. Em primeiro lugar, porque será um governo de transição com prazo mais curto de existência. Em segundo, porque agora o cenário não é evitar um estrago, como foi na gestão do ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy, é corrigir o estrago já feito. “Levy tinha uma agenda de reformas de longo prazo e, obrigatoriamente, uma agenda de curto prazo para tentar evitar que o Brasil perdesse o grau de investimento: ele tentava apagar o início de um incêndio. O PMDB agora encontra tudo queimado”, diz a economista Monica de Bolle, pesquisadora do Peterson Institute for International Economics.
Nesse cenário, rever a estrutura de gastos é prioridade, na avaliação do especialista em contas públicas Raul Velloso. “O gestor público precisa ter liberdade para poder gastar e para escolher o que vai cortar, onde e quando. A desvinculação é uma das melhores medidas a serem tomadas”, diz ele.
O ex-diretor do BC Carlos Thadeu de Freitas avaliou que a estratégia da equipe de Temer de reduzir a taxa de juros rapidamente está correta, mas o BC tem de avaliar as condições técnicas para isso. “Se o vice gerar a expectativa de que vai fazer o que é preciso, os juros cairão, mas cairão mais rapidamente quanto mais a parte fiscal ajudar”, afirmou. E essa queda pode ajudar, sim, na recuperação. “É uma medida imediata para retomar algum nível de atividade e conseguir fazer com que a recessão ao menos pare de se aprofundar - e se não conseguir reverter o quadro recessivo num prazo razoável, o governo Temer estará perdido”, diz o economista José Luís Oreiro.
Apesar de a composição da agenda e da equipe ser importante, alguns economistas frisam que o ponto-chave ainda é político. “No final do dia, o grande desafio é saber a capacidade do PMDB de aprovar uma agenda mínima no Congresso, qualquer cenário econômico depende disso”, avalia Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos. “Eu sou otimista, para mim, o PMDB entende a gravidade da crise e vai tentar estabelecer uma agenda mínima.”
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