A gigante tecnológica deve a seus usuários melhores ferramentas para gerenciar suas informações
Quando o Google anunciou mudanças em sua política de privacidade, a maior preocupação dos usuários e da mídia foi o fato de que a única maneira de não aceitar a nova política é cancelar o registro no site. Ainda que o Congresso americano continue pressionando o Google a dar esclarecimentos, muitos usuários aceitaram a contragosto as notificações do Gmail, dando lugar a novas preocupações, como um aplicativo para o iPhone que copiou e salvou todos os contatos de seus usuários.
Contudo, as discussões públicas devem prosseguir, já que o assunto vai muito além de aceitar ou rejeitar as alterações. O ponto principal é o controle. A gigante das ferramentas de busca planeja substituir dezenas de políticas de privacidade por uma única. O Google diz que isso irá simplificar as coisas uma política ao invés de 60. Mesmo que a nova política não aumente a quantidade de informações pessoais que o Google coleta, ela introduz novas formas para que o Google combine e distribua esses dados ao longo de seus próprios serviços.
A transição para um serviço unificado prepara o terreno para o crescimento da empresa, fazendo com que cada usuário utilize apenas um perfil durante sua experiência online. O Google está mudando, mas suas ferramentas continuam as mesmas. O diretor de políticas públicas do Google, Pablo Chavez, rebateu as críticas destacando que o Google não irá coletar nenhum dado novo e que seus usuários podem continuar utilizando as mesmas ferramentas de privacidade que já estão a sua disposição.
Ainda que o painel do Google ofereça um grande número de ferramentas e que uma única política de privacidade seja mais simples que dezenas delas, os usuários estão perdendo a capacidade de gerenciar e manter diferentes identidades dentro do gigantesco mundo do Google.
A pesquisadora de mídias sociais danah boyd (como ela prefere que seu nome seja grafado) já se deparou com o mesmo desafio em 2010, após uma mudança nas políticas de privacidade do Facebook. No artigo "Why Privacy Is Not Dead" (Porque a privacidade não está morta, em tradução literal), publicado pela revista Technology Review, do MIT, boyd escreve: "Privacidade não é somente o controle ao acesso. É preciso compreender o contexto social e ter noção de como nossas informações são transmitidas e compartilhadas pelos outros". A forma como muitas empresas on-line compartilham informações com seus clientes e com outros serviços não é clara o bastante para os usuários.
O Google explicou ao Congresso porque acredita que seus usuários irão se beneficiar do compartilhamento de dados entre os serviços do Google, incluindo a edição de Google Docs dentro do Gmail e a integração do Google Maps com o Google+. Atualmente, quando você se conecta a um serviço Google, a identidade do usuário se conecta aos outros sites da empresa. O Google argumenta que compartilhar dados pessoais entre os serviços faz com que eles se adaptem com perfeição aos usuários, pois isso possibilita que o YouTube, por exemplo, recomende vídeos com base nos últimos resultados obtidos na ferramenta de busca.
Entretanto, a forma e a razão pelas quais uma pessoa utiliza os diferentes serviços nem sempre exigem o compartilhamento de informações. Um usuário pode utilizar a ferramenta de busca do Google para trabalhar ou para resolver problemas técnicos e utilizar o YouTube para ouvir música e assistir a vídeos fofos com gatinhos. Algumas pessoas simplesmente preferem utilizar dentidades diferentes no YouTube e na ferramenta de busca do Google, assim como podemos mostrar diferentes aspectos de nossa personalidade na biblioteca e no bar. Unificar de maneira forçada essas identidades acaba com a possibilidade de que os usuários revelem diferentes facetas de suas identidades para o Google em contextos diversos.
Em uma tentativa de esclarecer noções incorretas sobre as novas mudanças em sua política, Betsy Masiello, gerente de políticas do Google, relembra aos leitores que muitos dos serviços do Google, como a ferramenta de busca e o Google Maps, estão disponíveis para usuários sem cadastro. Entretanto, com uma conta unificada, essa afirmação se torna pouco realista, já que para se desconectar de um serviço Google, você precisa se desconectar de todos. Os clientes do Google estão praticamente enraizados em alguns serviços, como o Gmail e o Chat. Fazer uma ligação forçada entre os serviços, sem que os usuários tenham a opção de desconectar alguns deles é a forma encontrada pelo Google para tornar seus usuários mais dependentes de alguns serviços e alavancar a utilização de outros, em especial o Google+.O Google poderia ter oferecido a seus usuários uma ferramenta para que eles pudessem gerenciar a forma como suas identidades seriam compartilhadas ou separadas entre os diversos serviços.
A empresa também poderia ter oferecido um serviço para que os usuários realizassem uma auditoria de suas identidades online. Em menor escala, os usuários do Google+ já têm a opção de "Visualizar perfil como...", uma forma de examinar como sua identidade virtual é vista pelos demais usuários. O recurso aparece apenas discretamente na página principal do Google+ e permite que você observe seus posts como se fosse outro usuário, de modo que você possa saber como seus pais, por exemplo, enxergam suas informações. O Facebook tem uma ferramenta similar, por meio da qual um usuário pode assumir a perspectiva de outro usuário para se assegurar de que não haja falhas nas regras de compartilhamento e em suas permissões. Contudo, porque não dar um passo além e fornecer uma ferramenta para que os usuários vejam o que o Google sabe sobre eles e adicionar ou deletar os tópicos de interesse em cada um dos serviços? De fato, os usuários podem alterar o perfil dos anúncios que recebem ao modificar seu histórico de pesquisa, mas à medida que o Google se transforma em um mundo integrado, é fundamental que os usuários possam ter mais controle.
As políticas revisadas e consolidadas do Google, em especial a modificação na forma como os dados são coletados e compartilhados, podem ser vistas como uma resposta competitiva ao Facebook, que integra as identidades de seus usuários a milhares de outros sites. Em conjunto, as ações do Google e do Facebook são um exemplo da situação atual da esfera pública online um espaço governado por termos de serviço, mas sem proteções reais para que seus participantes controlem e gerenciem suas identidades virtuais ao longo dos diferentes serviços.
Já que as informações pessoais são a moeda de troca para se acessar a esfera pública, os usuários de serviços online devem obter um maior controle sobre a forma como suas informações são fornecidas, armazenadas, compartilhadas e excluídas.
*Thomas Gideon é tecnólogo sênior na Open Technology Initiative, que faz parte da Fundação New America. James Losey é analista de políticas na Open Technology Initiative, que faz parte da Fundação New America.