Quando as chances de impeachment de Dilma Rousseff aumentam, a Bolsa sobe e o dólar cai – nesta terça-feira, com a aprovação do processo contra a presidente na comissão, a Bovespa abriu em alta de 2,2%, enquanto o dólar recuou na segunda-feira abaixo de R$ 3,50. Quando parece que ela vai resistir, acontece o oposto. Além de ter uma aversão natural a governos tidos como intervencionistas, o mercado financeiro torce pela queda da presidente por pelo menos dois motivos.
O primeiro é a esperança de que um novo governo, liderado pelo vice-presidente Michel Temer, buscaria pôr as contas públicas nos trilhos, iniciativa tida por muitos como o primeiro passo para uma recuperação – ainda que bastante lenta – da economia.
O segundo motivo, que parece estar pesando mais sobre as decisões recentes dos investidores, é de fundo psicológico. A sensação entre eles é de que a economia está tão feia que a mera troca de comando melhoria os ânimos de consumidores e empresários. É a mesma ideia do clube que troca de treinador apenas para ver se o “fato novo” dá gás a um time que anda perdendo.
Mudança de rumo
O conjunto de propostas liberais “Uma ponte para o futuro”, do PMDB, e a gravação em que Temer fala como se a Câmara já tivesse aprovado o impeachment sinalizam que o pemedebista pode tentar implantar uma agenda de ajustes fiscais de curto prazo e reformas estruturais dos gastos públicos, incluindo a fixação de uma idade mínima para a aposentadoria.
“As contas fiscais estão péssimas. O governo não tem qualquer controle sobre elas, a dívida pública interna cresce absurdamente, na faixa de mais de R$ 500 bilhões por ano. Não é sustentável. Sob esse ponto de vista, a troca de governo parece a coisa mais racional para o mercado”, diz Wagner Salaverry, sócio-diretor da gestora de recursos Quantitas.
“Para não enganar ninguém, temos que dizer que teremos sacrifícios pela frente. Sem sacrifícios, não conseguiremos reunir as condições para retomar o crescimento e o desenvolvimento.”
Novo ânimo
Mas, por mais que Temer pense mesmo em implantar um plano de austeridade, sabe-se que: 1) as medidas não seriam aprovadas do dia para a noite, em um Congresso que tende a ser favorável, mas não se sabe até que ponto; e 2) ajustes e reformas demorariam a ter efeito sobre a economia, dada a gravidade do déficit público e a profundidade da recessão.
É por isso que a principal aposta do mercado está na melhora do “clima econômico”, mesmo antes de a troca de governo ter efeitos práticos, mais ou menos como vem acontecendo na Argentina desde a posse de Mauricio Macri.
“A percepção hoje é de que nada pode ser pior para a economia que o atual governo, e que qualquer um que entre fará algo para melhorar as coisas”, diz José Kobori, professor do Ibmec e sócio-estrategista da consultoria JK Capital.
O ambiente favorável não durará para sempre, no entanto. “Não basta assumir a presidência e achar que os problemas acabaram”, observa Alex Agostini, economista-chefe da agência de classificação de risco Austin Rating. “O Macri, quando assumiu a Argentina, gerou otimismo no mercado financeiro. Mas logo em seguida foi pondo medidas em prática. Então ele foi conquistando e renovando apoio a cada momento.”
Troca nas estatais
Kobori nota que, nos dias em que a Bolsa sobe no embalo do noticiário político, as ações de estatais como Banco do Brasil e Petrobras avançam bem acima da média. “A troca do governo significará uma troca no comando dessas empresas. O Estado não é um bom gestor, mas, nas mãos do atual governo, ele é um gestor muito pior”, diz Kobori.
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