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Capital de risco

Quem é e por que o japonês SoftBank coloca milhões de dólares nas startups brasileiras

Masayoshi Son, fundador do SoftBank Group
Masayoshi Son, fundador do SoftBank Group (Foto: Kiyoshi Ota;Bloomberg)

Entre US$ 80 bilhões e US$ 100 bilhões. Esse é o valor que, se sabe, o SoftBank Group já investiu em startups em todo o mundo. O fundo japonês de venture capital - ou capital de risco, em bom português - tem os olhos voltados para o Brasil, puxando a fila de aportes milionários em companhias tupiniquins. Integram a lista - entre outras - as startups 99, Nubank, MadeiraMadeira, Creditas, QuintoAndar, Gympass, Loggi e, mais recentemente, a Olist.

Hoje uma das maiores companhias públicas do globo, o SoftBank surgiu em Tóquio nos anos 1980 com serviços de software, evoluiu para uma mega empresa de telecomunicação e se tornou um conglomerado investidor com apetite por tecnologia e principalmente inovação.

"Quando [o fundador e dono do SoftBank] Masayoshi Son fala sobre as visões dele, ele realmente acredita na questão da interconectividade, no uso da inteligência artificial para automatizar processos", diz Arthur Garutti, sócio da empresa de inovação ACE, uma das maiores do país. "A característica que eu observo", prossegue, "é que eles entram para fazer grandes disrupções, principalmente em mercados com uma grande quantidade de consumidores e com serviços de média para alta recorrência".

Nessa linha, o sócio da ACE pega o exemplo de aplicativos de mobilidade pelo mundo: "Uber, Lyft, DiDi e 99 (aqui no Brasil): o SoftBank participou de todos" e no início deste ano anunciou uma aposta em América Latina, com a criação do Innovation Fund, de US$ 5 bilhões destinados a empresas dessa ponta do continente.

Na avaliação de Garutti, entre os latinos, o Brasil oferece o ambiente perfeito para o perfil investidor do fundo, que "caça" oportunidades de inovação em países caracterizados pelo alto número de consumidores potenciais.

"Para criar disrupções, muito dinheiro"

No Brasil, outro investido recente é a Buser, app de fretamento particular de ônibus que teve o aporte em outubro, de valor não confirmado, e que é citada pelo especialista como prova dessa estratégia. "O mercado rodoviário no Brasil é gigantesco, ainda muito concentrado em poucos players, e o Buser vem para fazer uma disrupção no mercado atual, reduzindo deficiências principalmente sob a ótica do consumidor final. Nesse sentido, o SoftBank tem o Brasil como um país de alta densidade demográfica, com uma série de deficiências em diversas cadeias: é um grande playground, em algum nível", compara.

Com aportes feitos em diversos segmentos, de fintechs a logística, o sócio da ACE vê pouco padrão nas opções do fundo investidor para além do combo potencial de disrupção mais mercado amplo e de poucos players. Ainda assim, Garutti vê chances de integração de plataformas das quais do SoftBank tornou-se sócio.

No casos das startups do Brasil, poderiam-se abranger muitas cadeias em um mesmo negócio, para ir desde a aquisição de um imóvel - com o QuintoAndar - até a mobília - com a MadeiraMadeira. Tudo apenas um exercício de imaginação, por ora: "é uma possibilidade, mas isso num horizonte de futuro, daqui 10 anos".

Apesar de figurar como superinvestidor mundial, o fundo japonês teve seus revezes, o que pode representar um pé no freio e mais cautela quanto a práticas de governança. O alerta foi acionado pela crise na WeWork, empresa de compartilhamento de escritórios de origem norte-americana que nas últimas semanas passou por uma intervenção dos japoneses para evitar a falência. "Em algum momento, o SoftBank vai ter que se reequilibrar e pegar founders com bases mais sustentáveis, porque no final do dia, o fundo vai ter que recuperar o valor que ele investiu e, se todo investimento que ele fizesse virar uma WeWork ele não vai conseguir retorno", conclui o representante da companhia de inovação.

Terreno favorável

O venture capital se caracteriza pelo investimento de terceiros em uma empresa ainda não consolidada, mas com alto potencial retorno, o que explica o risco assumido pelo investidor na injeção de de capitais: ele o faz justamente para alavancar o desenvolvimento. Nesse tipo de operação, o aporte é feito por meio da compra de parte minoritária das ações da companhia, que posteriormente serão vendidas para realizar os ganhos (no que é chamado de desinvestimento).

Num cenário geral de Brasil, o venture capital teve um salto expressivo em anos recentes. Conforme o Panorama da Indústria Brasileira de Private Equity, Seed e Venture Capital 2011-2018, elaborado em conjunto pela Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (ABVCAP) e a KPMG, o volume de capital investido se manteve relativamente estável nos anos de 2015 a 2017, com oscilação de R$ 1,2 bilhão para R$ 800 milhões e então para R$ 900 milhões, seguida de um boom em 2018, direto para os R$ 6 bilhões.

Nesse quadro, o que cresceu foi o valor médio dos investimento, que saíram de um patamar próximo dos R$ 10 milhões para R$ 50 milhões.

Na avaliação de Clóvis Benoni Meurer, conselheiro da ABVCAP, a indústria do capital de risco está cada vez mais madura no país e o ambiente de investimento se manteve favorável - independentemente da vacilante macroeconomia - por causa de "razões fáceis de entender".

Para o especialista, existem muitas oportunidades no Brasil, não apenas em termos de mercado, mas também. Negócios promissores em inúmeros segmentos e uma população com mais de 200 milhões de consumidores se somam à presença de numerosos polos de desenvolvimento e ambientes de aceleração, que têm fomentado a inovação e o empreendedorismo.

Desse bom terreno surgem frutos que entram na mira dos investidores. "As grandes corporações", segundo Meurer, "estão em busca de mais produtividade, de novos mercados, e investem em outras empresas, médias ou pequenas, que já têm produtos e soluções bem desenvolvidos. É mais fácil para uma grandalhona investir do que, por exemplo, criar um setor de P&D [Pesquisa e Desenvolvimento]", afirma.

Para fechar essa equação: a taxa de juros. "Eles vêm caindo nos últimos quatro, três anos, com juros reais muito baixos. Com a Selic agora em 5%, tirando a inflação, o juro real está em 1%, 2%. É um fator super alavancador", avalia Meurer, e é aqui que aparece o reforço no interesse do estrangeiro.

"O cara lá de fora está com uma liquidez tão grande que ele olha o Brasil - que tem um potencial enorme, é um país continental, que tem negócios dos mais variados setores - como oportunidade certa [de investimento]", resume.

Em amadurecimento, mas nanico

Quando se fala em valores, os investimentos do tipo venture capital ainda são pouco representativos no país. Em 2018, foram R$ 6 bilhões, que não chegaram a perfazer 1% do PIB de acordo com dados do estudo de ABVCAP e KPMG - naquele ano, o Produto Interno Bruto brasileiro foi de R$ 6,8 trilhões.

A grana é curta se comparada a realidades como a dos Estados Unidos e da Europa, onde essa fatia fica próxima de 3% ou 4%, segundo o sócio da ACE, Arthur Garutti; entretanto, o conselheiro da ABVCAP, Clóvis Meurer, avalia que esses investimentos têm papel de destaque no país. "O volume em dinheiro de venture não é um volume super representativo no PIB, mas [é preciso] olha[r] a quantidade de empresas investidas e o quanto isso é importante na cadeia da economia", pondera.

Como exemplo disso, Meurer pinça o cenário das fintechs em operação no Brasil (cerca de 500, conforme dados do Fintech Mining Report 2019, elaborado pela Distrito, espécie de holding de inovação e aceleração de negócios). "Se elas receberem uma grana, não representa muita coisa em relação ao mundo bancário brasileiro, mas são centenas de novos empreendimentos que ali na frente vão fazer coisa maior. Veja o que é hoje o Nubank. É um unicórnio que atrás recebeu venture", completa o conselheiro.

Para um breve resumo, o Nubank foi a terceira startup nacional a atingir valor de mercado de US$ 1 bilhão ou mais. O primeiro aporte recebido pela criadora do cartão roxinho foi de US$ 2 milhões em capital semente em 2013, quando ainda estava em fase de desenvolvimento. Já a sétima e mais recente rodada de investimentos, de julho de 2019, foi de US$ 400 milhões, que levou a companhia a ser avaliada em US$ 10 bilhões.

Mesmo rarefeita em relação ao tamanho da economia, a cultura do investimento privado tem, sim, horizonte positivo, acredita Garutti: "quando você tem um SoftBank ancorando os principais investimentos do Brasil, cria-se uma renovação. Um novo perfil de empreendedores começa a surgir, você tem gente do mercado financeiro migrando para criar suas startups... [Além disso,] o SotfBank também ajuda quem está na base, uma vez que injeta capital na economia e para as boas oportunidades o dinheiro acaba entrando mais rápido", avalia.

Num pano rápido, em 2018, 211 startups brasileiras foram investidas por fundos de venture capital e só no primeiro semestre de 2019 mais 98 receberam aportes conforme a consolidação de dados da KPMG e ABVCAP. Delas, 76 informaram os montantes, totalizando R$ 3,4 bilhões. Caso a ritmo se mantenha de julho até dezembro, a expectativa é por um incremento de ao menos 13% na comparação com o total do ano passado.

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