A aprovação na Câmara dos Deputados do projeto de lei que permite a terceirização de todas as atividades das empresas levantou uma dúvida entre as pessoas que sonham com uma vaga no serviço público: a contratação de mão de obra terceirizada sem restrições poderá acabar com os concursos no país?
Apesar do temor que surgiu após a aprovação do projeto, a resposta é não. O texto da lei aprovado pela Câmara se aplica apenas as empresas privadas, ou seja, não afeta as futuras seleções em órgãos da administração pública municipal, estadual e federal. Secretarias estaduais e municipais, por exemplo, continuam proibidas de terceirizar atividades consideradas essenciais no serviço público.
No entanto, a nova lei pode sim levar a uma redução de cargos públicos nas empresas estatais, de economia mista e suas subsidiárias. Pela lei vigente, companhias dessa natureza já estão sujeitas ao regime jurídico próprio de empresas privadas e são autorizadas a contratar funcionários celetistas, assim como mão de obra terceirizada em atividades-meio.
Como a terceirização poderá ser estendida a qualquer atividade de uma empresa se a lei for sancionada, é possível que empresas públicas federais e estaduais como Petrobras, Eletrobras, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Copel e Sanepar, por exemplo, decidam ampliar o número de profissionais terceirizados ao invés de fazer concurso público para o provimento de vagas em áreas com demanda.
Embora o número de funcionários terceirizados em empresas públicas e sociedades de economia mista possa crescer com a nova lei, é pouco provável que elas deixem de abrir novos editais para a contratação de profissionais em áreas estratégicas ou decidam, por exemplo, optar apenas por trabalhadores terceirizados em todas os setores.
Concursos sob ameaça?
Há quem acredite, contudo, que a lei da terceirização é uma ameça real aos concursos, inclusive na administração pública direta. O argumento é o de que, da forma como foi aprovado, o projeto lei não específica que apenas as pessoas jurídicas de direito privado estão liberadas para contratar terceirizados em todas as atividades. Ao não fazer essa ressalva, a lei daria margem para que também as pessoas jurídicas de direito público (a administração pública direta) possam recorrer à terceirização, inclusive em áreas consideradas essenciais.
De acordo com o advogado trabalhista José Lucio Glomb, ex-presidente da Ordem dos Advogados do Paraná (OAB-PR), o texto da lei não faz qualquer menção ao serviço público, portanto, o que vai prevalecer é a adoção de terceirizados apenas nos casos já existentes, em atividades secundárias, e não em atividades fins do serviço público. Hoje, a súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) autoriza a terceirização de atividades secundárias na administração pública, com aplicação, principalmente, em serviços de limpeza e vigilância.
Segundo Glomb, mesmo que o projeto de lei fosse aprovado com a permissão para terceirizar todas as atividades do setor público, isso seria inconstitucional e alvo de questionamentos no Supremo Tribunal Federal (STF). “O provimento de cargos públicos por meio de concurso está previsto no artigo 37 da Constituição Federal e isso não pode ser modificado por uma lei ordinária. Neste caso, isso seria possível apenas por meio de uma emenda à Constituição”, diz o advogado.
Questão central
A principal mudança do projeto aprovado é a permissão de terceirizados em atividades-fim das empresas. Atualmente, a legislação trabalhista prevê que a terceirização pode ser adotada apenas em serviços que se enquadrarem como atividade-meio (funções de apoio), ou seja, trabalhos que não estejam diretamente ligados à atividade principal da empresa. Uma empresa de engenharia que antes não poderia terceirizar engenheiros, por exemplo, agora poderá fazê-lo. O mesmo ocorre nas escolas, que a partir da sanção da lei poderão terceirizar professores, ou em hospitais, que poderão recorrer a médicos terceirizados.