Afonso está acostumado às dificuldades impostas pela vida, pois desde pequeno precisou se esforçar mais do que seus amigos para compensar a discriminação racial da qual várias vezes foi alvo. Dessa forma, tornou-se um homem realista e determinado, com objetivos profissionais bem traçados e com disposição para fazer tudo para concretizá-los.
Estudante da melhor universidade de sua região, Afonso se formou em Administração com glórias. Seu desempenho exemplar lhe garantiu uma bolsa em um MBA renomado, concluído no tempo mínimo previsto. Simultaneamente aos afazeres acadêmicos, o jovem manteve aulas de inglês, espanhol, francês e alemão e desenvolveu técnicas de oratória. Além disso, dedicou-se a estudos sobre o relacionamento interpessoal, tema que lhe despertava muito interesse. Seu maior plano, desde menino, era fazer carreira em uma multinacional. Com ambições altas, pretendia ser um executivo importante, capaz de modificar a sociedade e motivar as pessoas à sua volta.
Nas primeiras empresas em que trabalhou, precisou mostrar sua capacidade e provar que, sendo negro, tinha condições de administrar tão bem quanto qualquer profissional de raça diferente. Mesmo as ocasiões em que se sentiu discriminado, vítima de um preconceito freqüentemente velado, não o impediram de conquistar o espaço desejado e o respeito merecido.
Aos 30 anos, Afonso ocupava o posto de gerente de uma grande empresa e era responsável por centenas de pessoas que se espelhavam nele para seguir em frente. Seu exemplo era citado costumeiramente pela diretoria quando era preciso incentivar outro executivo a melhorar o desempenho ou aumentar metas de produção. Afonso era um modelo para todos aqueles que passavam por momentos difíceis e que, muitas vezes, deixavam de acreditar em si mesmos.
O gestor era o retrato real de um brasileiro de origem humilde, que precisou arrancar de si o medo e as limitações que possuía a fim de conquistar um lugar ao sol. Sua condição étnica só agravava as dificuldades impostas a ele pelo mercado de trabalho. Ainda assim, Afonso superou todos os obstáculos, sem carregar amargura, ódio ou tristeza.
Porém, em certo episódio, precisou relembrar seu próprio valor para sair de uma situação que desafiou sua dignidade. Procurado por um headhunter, o executivo foi convidado a participar de uma seleção para uma vaga importante. O consultor, que havia estudado a trajetória de Afonso, dizia-se impressionado com os resultados deste e incapaz de pensar em melhor candidato para o cargo de diretor da renomada multinacional que faria a contratação.
A oportunidade empolgou o jovem profissional, que sempre sonhou com a posição oferecida. Depois de passar por diversos testes e entrevistas, Afonso foi chamado, por fim, para um encontro com o presidente da empresa. No dia da entrevista, Afonso foi recepcionado pelo headhunter e direcionado para uma sala reservada, onde esperou duas horas para ser chamado. Enquanto aguardava, imaginou que as entrevistas com cada candidato durariam cerca de uma hora.
Contudo, quando Afonso foi convidado a se apresentar, o presidente mostrou-se surpreso e avisou logo de início que a entrevista com ele giraria em torno de 15 minutos. Naquele momento, o candidato e o consultor souberam que o presidente da organização era preconceituoso. Afonso, então, passou a considerar suas chances de ingressar na empresa remotas, uma vez que, naquele caso, seriam avaliadas outras questões - não a competência de cada concorrente.
Ao final da breve entrevista, o headhunter e o presidente acompanharam Afonso até a saída e se despediram. Mas, antes mesmo que o profissional se afastasse, o presidente fez um comentário racista sobre Afonso, em francês. Ele não imaginou que o jovem executivo pudesse compreender aquelas palavras, uma vez que a vaga exigia somente fluência na língua inglesa. Afonso, no entanto, virou-se para o presidente e, enquanto se afastava, respondeu-lhe, em alemão. Assim, deixou a mensagem de que era, de fato, o candidato mais preparado para o cargo.
Mas a discriminação sofrida não abalou Afonso. Mais tarde, ele foi chamado pelo mesmo consultor, que, impressionado com a competência do profissional, inseriu-o em uma organização de porte ainda maior. Hoje, Afonso é diretor dessa empresa e o executivo mais cotado para assumir a presidência, num futuro próximo.
*****
O preconceito racial, como todas as outras formas de discriminação, é abominável. Sem embasamento real (o julgamento é feito com base na emoção e em pensamentos distorcidos), ele condiciona o indivíduo a rejeitar outras pessoas. Infelizmente, as leis que condenam essa atitude não são plenamente respeitadas. Além disso, algumas organizações tendem a ignorar casos de discriminação, acreditando que, assim, eles irão se dissipar sozinhos.
A verdade, todavia, é que sem o engajamento de todos os setores da sociedade o preconceito jamais será extinto. Por isso, cabe a cada um de nós divulgar a igualdade entre as pessoas, sejam elas brancas, negras, amarelas, vermelhas ou verdes, pois o valor delas não está vinculado à cor de sua pele.
SAIBA MAIS...
Aprendendo na Prática
Desde 2001, a Arno e a T-Fal, empresas do ramo de produtos domésticos, desenvolvem o programa Aprendendo na Prática. O objetivo é ensinar como melhor aproveitar cascas e talos de frutas, verduras e legumes. O trabalho envolve crianças de 6 a 12 anos de escolas públicas e particulares em São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ), Belo Horizonte (MG), Crato (CE), Recife, Olinda e Vicência (PE).
Os alunos recebem um gibi com jogos, brincadeiras e uma pesquisa para identificar as frutas e hortaliças mais consumidas por sua família. Com base nos resultados, o programa confecciona um livro de receitas com os alimentos preferidos em cada comunidade.
Os professores são responsáveis pelo envio de relatórios de atividades desenvolvidas à coordenação do projeto e por incentivar as crianças a seguir as receitas em casa. As empresas já investiram R$ 250 mil no Aprendendo na Prática. Desde o início do programa, foram atendidas 250 mil crianças em 550 escolas. Em 2006, a meta é atingir mais 200 mil meninos e meninas.
Bernt Entschev é presidente do Grupo De Bernt. Empresário com mais de 36 anos de experiência junto a empresas nacionais e internacionais. Fundador e presidente do grupo De Bernt, formado pelas empresas: De Bernt Entschev Human Capital, AIMS International Management Search e RH Center Gestão de Pessoas. Foi presidente da Manasa, empresa paranaense do segmento madeireiro de capital aberto, no período de 1991 a 1992, e executivo da Souza Cruz, no período de 1974 a 1986
Boicote do agro ameaça abastecimento do Carrefour; bares e restaurantes aderem ao protesto
Cidade dos ricos visitada por Elon Musk no Brasil aposta em locações residenciais
Doações dos EUA para o Fundo Amazônia frustram expectativas e afetam política ambiental de Lula
Painéis solares no telhado: distribuidoras recusam conexão de 25% dos novos sistemas