Ao chegar a uma entrevista de emprego na Quero Bolsa, em São Paulo, Manoela Zambroni, 29 anos, precisou preencher um formulário inusitado que pedia até uma estimativa do consumo de papel higiênico nos Estados Unidos. Na etapa seguinte, os recrutadores lançaram um desafio: “Você tem 30 segundos para nos surpreender da maneira que quiser”.
O que as empresas do Paraná mais procuram?
Um levantamento da Michael Page, multinacional especializada em recrutamento executivo de média e alta gerência, mostrou que as empresas sediadas no Paraná tendem a buscar profissionais que já vivem na região. Outro aspecto que chama a atenção de companhias paranaenses é domínio do alemão ou espanhol, competência também buscada por empresas catarinenses. O mesmo levantamento listou como diferenciais uma boa compreensão do cenário econômico e do setor onde opera a empresa e o bom relacionamento interpessoal.
A tática integrava uma estratégia comum entre empresas que buscam imprimir sua cultura em seu processo de recrutamento. O objetivo é encontrar funcionários que atendam os critérios que a companhia precisa. E atitude era o que a startup buscava. Renata Rebocho, diretora de RH da empresa, conta que a equipe de gestão de pessoas desenvolveu um método descontraído para atrair gente ousada e proativa. Até mesmo os anúncios das vagas ganharam um tom informal e arrojado.
Para Renata, o sucesso do método foi um exemplo de que a companhia deve transmitir sua cultura no processo seletivo. “Ele precisa ser um recorte elaborado da vaga e do cotidiano da empresa”.
Dicas
Como tornar-se um candidato de peso:
1) Conheça a empresa em que você quer atuar. Pesquise a história, os valores e a cultura até estar certo de que está mesmo alinhado ao contexto dela.
2) Faça cursos complementares. A graduação não é suficiente para uma carreira bem sucedida.
3) Atue em projetos voluntários. Muitas companhias valorizam esse aspecto no currículo.
4) Programe-se para ter uma vivência no exterior.
5) Potencialize seu inglês, com livros, sites, músicas, filmes e cursos. A maioria das grandes empresas busca candidatos com inglês fluente.
6) Não abra mão de estudar uma terceira língua, como espanhol, alemão e francês.
7) Conheça a si mesmo. Saiba quais são seus potenciais e fraquezas para nunca deixar de se aperfeiçoar.
8) Procure se manter informado sobre tudo o que acontece no mundo.
A professora da FAE e especialista em recrutamento e seleção, Cibele Bastos, reforça que ter uma política transparente é um bom caminho para verificar o potencial de adesão dos candidatos ao cargo oferecido. Segundo a profissional, é importante que a maneira de selecionar seja coerente com as práticas do grupo para não frustrar nem o funcionário, nem o recrutador. “Falar a verdade, exigir os requisitos certos diminui, inclusive, os índices de rotatividade”, diz.
Diante da missão de “se virar nos trinta”, Manoela começou a falar francês. Fez perguntas aos recrutadores, disse que estava um pouco nervosa, se apresentou, se despediu e agradeceu. Foi sua forma de ousar. Na etapa seguinte, uma dinâmica de grupo em um domingo de manhã, a candidata já estava bem mais à vontade. Chegou tranquila e de chinelo, confiante por reconhecer a proposta da empresa. Era uma das candidatas melhor alinhadas ao ambiente. Não por acaso, foi contratada. Hoje, a gestora de relacionamentos tem horários flexíveis e vivencia o mesmo clima despojado que conheceu na entrevista. “Eu adoro trabalhar aqui. Quis isso desde que cheguei e vi as pessoas felizes e uma mesa de ping-pongue”, brinca.
Busca ativa
Contratar profissionais que levem o DNA do grupo também está entre os propósitos de multinacionais, como a Ambev. Com um processo seletivo minucioso para trainees, que demora mais de quatro meses, a companhia busca candidatos com o maior potencial de adesão à sua cultura. Mas a caçada pelo funcionário ideal ultrapassa as salas de RH. Segundo a Gerente Regional de Gente e Gestão da empresa, Sylvia Amaral Ganzerli, mais de 90% das contratações acontecem diretamente nas universidades. A Ambev seleciona instituições onde realiza palestras e parcerias com empresas Junior. “Trabalhamos com estudantes do primeiro ao último ano para levar um pouco de quem somos e instigá-los desde cedo a trabalhar conosco”, explica.
Mudança de perfil
Este ano, o grupo Boticário também saiu à procura de candidatos e escolheu seus 12 trainees após convidar alunos de grande potencial nas universidades para participar de testes, entrevistas e painéis. Em dois meses, mais de 12 mil jovens foram avaliados. A nova forma de recrutar mudou também o perfil dos recrutados. A faixa etária média, por exemplo, aumentou para 25 anos, já que a pesquisa por gente com experiências pessoais diversas atraiu jovens que começaram ou terminaram a faculdade mais tarde. Além disso, 57% eram do sexo feminino e a maioria provinha dos estados de Minas Gerais e São Paulo. “Buscávamos um perfil que dificilmente encontraríamos por meio de processos convencionais”, explicou a diretora de Recursos Humanos do Grupo Boticário, Graziella D’Enfeldt.
A solução pode estar no recrutamento
Segundo especialistas, problemas comuns a várias empresas, como alta rotatividade e baixo engajamento, podem estar relacionados a falhas no recrutamento. De acordo com a coordenadora de Gestão de Recursos Humanos do Centro Tecnológico Positivo, Deise Hofmeister, uma boa forma de solucionar estas questões é conhecer onde elas nascem por meio de métodos, como o da Entrevista de desligamento. O sistema consiste em uma entrevista feita pelo setor de recursos humanos com quem está saindo da empresa. A ideia é entender até que ponto a companhia influenciou a saída do funcionário, seja errando na comunicação, na valorização ou no suporte oferecido ao trabalhador. “É possível que a raiz de alguns destes conflitos esteja na quebra de expectativas transmitidas erroneamente no momento da seleção. Saber isso pode ajudar a desenvolver maneiras mais eficazes de buscar pessoas”, destaca.
Tecnologia
É muito comum que companhias selecionem seus colaboradores por meio de cadastros e questionários online, entrevistas virtuais e análises de vídeos. É o caso do processo seletivo de trainees da Ambev. A primeira fase é um teste de inglês e raciocínio lógico realizado na internet e a segunda é a defesa de um case feita por Skype.
A gerente-executiva da Page Talent, especializada em atração, seleção e desenvolvimento de estagiários e trainees, Manoela Costa, destaca que a modernização é cada vez mais marcante nos processos seletivos. Um método muito utilizado é uma dinâmica de grupo na qual os candidatos são desafiados a montar jogos. A partir do suporte ou tecnologia que a pessoa escolhe, das estratégias, soluções e ações criativas que ela propõe, é possível colher informações referentes ao nível de proatividade, engajamento e liderança do indivíduo.
A gerente acrescenta que o mesmo exemplo aponta outra tendência bem comum: a de transformar uma seleção em uma etapa de aprendizagem. “Não é difícil encontrar companhias cujos recrutamentos passem por palestras, treinamentos e atividades lúdicas”, reforça.