Para concorrer a uma vaga de trainee no Grupo SolPanamby, de São Paulo, Beatriz Martins Lopes Amorim, 23 anos, precisou fazer um vídeo contando alguma experiência que tivesse a ajudado a se desenvolver. Tendência entre as seleções de novos talentos, a utilização desse tipo de tecnologia permite ao candidato abusar da criatividade e, por substituir fases presenciais, facilita a vida de quem mora longe.
Forma X Conteúdo
Embora as empresas priorizem a análise do conteúdo do vídeo, alguns cuidados com a forma são indispensáveis. Segundo a gerente executiva da Page Talent, especializada no recrutamento de estagiários e trainees, Manoela Costa, é necessário buscar um ambiente bem iluminado e escolher uma câmera com áudio e vídeo razoáveis. Vale até celular. Prezar pelo bom enquadramento, de preferência em posição horizontal, é outro fator importante. A especialista acrescenta que um erro muito comum entre os candidatos é não seguir o roteiro previsto pela empresa. Cada companhia tem uma programação, com questões a serem respondidas e um tempo estipulado. Se a pessoa foge a esse script, de nada vale elaborar uma superprodução.
Beatriz, por exemplo, era de Minas Gerais e a novidade, que excluiu a apresentação pessoal das dinâmicas da empresa, reduziu o tempo que a candidata precisou dispender durante o processo. A Responsável pela área de treinamento e desenvolvimento da companhia, Eneida Moratto Lopes, explica que, dos 6 mil inscritos, 200 passaram para as atividades em grupo e tiveram que gravar um vídeo em casa. “Sempre havia gente agradecendo por termos feito a troca”, diz.
A trainee contou em seu vídeo que o maior desafio de sua vida foi ter saído de casa para estudar Ciências Contábeis, na Universidade Federal de Viçosa, em Minas Gerais, e detalhou esta vivência. Antes da gravação, estudou três dias, como se fosse apresentar um trabalho, escreveu suas ideias para ver se faziam sentido, e as repetiu em voz alta várias vezes. Em 44 segundos, deu uma amostra objetiva de sua competência e foi selecionada.
A quem se prepara para processos do tipo, a trainee dá a seguinte dica: fale sobre algo que você realmente domina. Não invente uma história. “Não é porque a maioria das pessoas fala de experiência internacional, por exemplo, que você precisa falar também”, aconselha.
O olhar do recrutador
Beatriz fez a coisa certa. Segundo a professora de gestão de pessoas da PUCPR, Daniella Forster, é necessário que o candidato se conheça para poder pontuar de que forma vai se destacar. “Não se pode criar um personagem. A companhia quer saber quem é você de verdade”, diz. Daniella destaca que, quando o candidato está pouco seguro,evidencia esse estado de espírito desviando o olhar e se perdendo na fala. Isso corrobora muito para uma desclassificação.
Estratégia de aproximação
Outra empresa que resolveu utilizar a tecnologia para dialogar com a nova geração de profissionais foi a Bunge. Embora ainda mantenha um recrutamento tradicional,a companhia promoveu este ano uma seleção de vídeos para a pré-campanha de lançamento de seu programa de trainee. O escolhido terá a oportunidade de passar um dia na empresa e entender como é o cotidiano dos selecionados. “A comunicação com jovens talentos nos desafia a entender a melhor forma de estar presente no dia a dia dos líderes do futuro”, explica a responsável pela atração, gestão de talentos e desenvolvimento organizacional da Bunge Brasil, Luiza Zequi.
Fazer um roteiro do que vai ser dito é uma excelente estratégia, segundo o coach Silvio Celestino. Mas em vez de decorar o conteúdo, o candidato precisa compreendê-lo ao ponto de transmiti-lo seguramente de forma clara e bem estruturada.
Valores em foco
A cadeia de valores do candidato é outro aspecto analisado. O processo seletivo do trainee do Citi Bank é um bom exemplo disso. A superintendente adjunta de RH, Andrea Aiwaka, explica que o recrutamento do banco prevê a gravação de um vídeo na hora e o candidato deve responder três perguntas sobre assuntos da atualidade. O componente mais avaliado é o conteúdo dito. Além de checar a capacidade de improviso do indivíduo e verificar se ele está antenado, o método examina se a forma como o jovem pensa está de acordo com o que a empresa espera.
Selecionado no ano passado pelo Citi, Eduardo Abreu Lopes Cançado, 25 anos, teve de sugerir soluções para a crise dos refugiados, o conflito entre Palestina e Israel e o aquecimento global. Por dominar o panorama entre palestinos e israelenses, conseguiu cunhar uma argumentação clara, mediante uma sequência lógica com introdução, argumentação e conclusão. O jovem acredita que essa receita o tenha colocado à frente de muitos concorrentes.
Reflexos da Era Digital
Processos seletivos por vídeos têm sido comuns em diversas áreas. De acordo com a consultora da companhia de talentos, Milie Haji, por conta da praticidade, a tendência é utilizada da indústria ao agroneócio.
Este ano, a Unilever vai lançar pela primeira vez um processo seletivo para trainees com uma das fases em vídeo. A implementação ocorre mundialmente como resposta ao avanço da tecnologia. A gerente de RH da Unilever Brasil, Joana Rudiger, explica que essa é uma forma de dialogar com uma geração de profissionais que já nasceu rodeada de aparatos tecnológicos e oferecer uma experiência inovadora que converse com esse perfil.
Um segundo aspecto que, segundo a especialista, impulsiona a mudança é a facilidade que ela traz não apenas ao candidato, que não precisa se deslocar até a empresa para uma entrevista, mas também a quem recruta. “A mesma apresentação pode ser vista por diferentes avaliadores em tempos distintos e isso ultrapassa as barreiras do julgamento do entrevistador comum, aprimorando o processo seletivo”, diz.
Luz, câmera, aprovação!
O passo a passo do vídeo ideal:
1 - Pesquise sobre a empresa e a vaga. Busque conhecer a si mesmo. Com isso, monte uma espécie de briefing do que será destacado em seu vídeo.
2 -Leia ou assista atentamente ao roteiro indicado pela empresa, pois você deve segui-lo à risca. Se pedem 3 minutos, não ultrapasse o tempo.
3 - Vista-se como se fosse a uma entrevista de emprego. Mas fuja de roupas que possam te deixar desconfortável.
4 - Procure uma câmera com áudio e vídeo de qualidade razoável. Vale até usar celular.
5 - Em frente à câmera, responda às questões previstas nas orientações. Fale sobre você, suas experiências, principais competências e explique por que você atende o perfil da empresa e da vaga. Mostre o quanto conhece a companhia.
6 - Seja sincero e tranquilo. Não monte um personagem. Forçar um discurso pode te deixar pouco à vontade e isso atrapalha até sua performance.
7 - Olhe bem para a câmera, como se conversasse com um entrevistador. Articule as palavras firmemente, não fale baixo demais e leve cada ideia até o fim.
8 - Verifique se o conteúdo está salvo no formato solicitado. Confira o tempo, veja se atendeu à proposta da empresa e envie. Em alguns processos seletivos, o vídeo é feito no momento da inscrição. Nestes casos, não há como voltar atrás e mudar o que foi dito. Por isso, entre preparado no site. Mas fique calmo e apenas seja você mesmo. A transparência não tem contra indicações. Boa sorte!