Brasília (AE) Presidente da Frente Parlamentar por um Brasil sem Armas, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), encampou a batalha pela proibição da venda de armas, mas considera um equívoco vender a "ilusão" de que o fim desse comércio vai resolver o problema da criminalidade.
Ele acredita que se a população disser sim no referendo estará dando um passo para a queda da criminalidade. "Eu não acredito em paz armada", disse Renan, parafraseando o músico Marcelo Yuka ex-baterista do grupo O Rappa e integrante da banda F.U.R.T.O. A seguir os principais trechos da entrevista:
AE Um dos grandes problemas na área de segurança pública é o mercado clandestino de armas. Se a proibição da venda de armas for aprovada, a clandestinidade vai acabar?Renan Calheiros Não dá para vender a ilusão de que a proibição da venda de armas vai resolver o problema da criminalidade. Não vai. Mas, com certeza, será um passo significativo para conseguirmos reduzir o número dos chamados crimes "imotivados", aqueles praticados por causa de rixas e desavenças. Na maioria, a vítima e o agressor se conhecem. Muitas vezes o agressor não tem antecedentes criminais. O crime ocorre porque alguém resolve atirar. Os crimes "imotivados" significam quase 67% dos crimes no Brasil. Todo país que controlou a venda de armas teve a redução da criminalidade. Com a campanha do desarmamento, conseguimos retirar de circulação mais de 500 mil armas. Em 13 anos de crescimento de crime houve agora uma queda. Nos últimos 13 anos, os homicídios por arma de fogo cresceram, em média, 8,2%, ano ao ano. Depois da campanha do desarmamento, tivemos uma redução de 7,2%. Mais de 5 mil vidas foram salvas. Mas entendo que essa é uma questão complexa. Divide a população. Não vai ser fácil.
O senhor não acha que vai crescer o comércio clandestino de armas?A retirada das armas de circulação dificulta o uso de armas, muda a cabeça das pessoas. Ainda hoje as pessoas acham que só podem andar na rua armadas. Há homens que pensam que são mais machos andando armados. Isso vai acabar, não de uma hora para outra. Não vamos vender a ilusão de que a proibição vai acabar com o crime. O crime no Brasil tem múltiplas causas, são causas sociais, econômicas, dificuldades para investigação. Nos grandes centros urbanos menos de 2% dos crimes, cujos autores não se conhecem na hora dos fatos, são esclarecidos. As pessoas matam porque pensam que o crime compensa. Não há política digna na área de segurança pública. Não há sequer uma linha de financiamento. O fundo de segurança pública é insuficiente. Defendo que haja uma vinculação constitucional, a exemplo do que ocorre nas áreas da saúde e educação, para recursos da segurança pública.
O cidadão que vive num ambiente de medo é influenciado por argumentos de que precisa andar armado. Como convencê-lo?Tem muita gente que acha que, quando a polícia não faz a sua parte, o cidadão tem de fazer alguma coisa. É a visão de que arma protege. A arma não protege, a arma mata. No lançamento da frente parlamentar no Rio de Janeiro, o músico Marcelo Yuka disse uma frase que eu gravei: eu não acredito em paz armada. Andar armado não protege. As estatísticas demonstram o contrário. Em um assalto, por exemplo, é mais de três vezes maior a chance de um cidadão ser assassinado se reagir armado. Primeiro porque o bandido surpreende, ele não combina a hora do assalto. Segundo, ele sabe manejar a arma e a pessoa de bem não sabe. Terceiro, se o bandido pressentir que a vítima está armada ele prefere atirar.
Haverá desemprego nas indústrias de armamentos?As indústrias já exportam muito. Basta que elas priorizem a exportação. Elas continuarão vendendo armas e munição para as pessoas autorizadas a portar armas, na forma do estatuto.
Se por acaso a população disser não, o que vocês vão fazer?Seja qual for o resultado, a sociedade ganhará.