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Eloi Zanetti

O dono do negócio

Localizada em bairro enorme, onde imperavam modernas e sofisticadas panificadoras, a antiga Padaria Santa Izabel não fazia feio para ninguém. Vivia abarrotada de clientes vendendo pãezinhos, bolos e brioches.

O proprietário, "seo" Joaquim, tinha um belo diferencial mercadológico sobre os concorrentes: as mãos entusiasmadas e mágicas do padeirinho Jonas.

"Mas...um trunfo instável", ponderava o velho Joaquim. O jovem padeiro, um belo dia, bem que poderia ir embora, seduzido pelo canto de sereia de uma dos concorrentes.

Jonas, o padeirinho esperto, começou sua carreira da mesma forma que todos os outros; ajudante de forno do Padeiro Paradigma, empregado da casa há muito tempo.

Rapaz simples, de boa vontade, Jonas, tão logo começou a trabalhar, botou na cabeça que um dia seria o dono do negócio e, para tanto, trabalharia como se fosse, hoje mesmo, o dono da padaria do "seo" Joaquim. Imprimiria em tudo que fizesse a sua marca pessoal. Só assim o duro trabalho de amassar e assar pães se tornaria mais interessante e a sua vida menos monótona e mais promissora.

Como todos os outros iniciantes, aprendeu a fazer pães varando madrugadas, junto à boca do forno em meio a dezenas de sacos de farinha. No início aprendeu o ofício de maneira não muito correta, pois seu professor, "seo" Paradigma, era padeiro por necessidade, não por vocação. Para ele, tanto fazia se o pão ficasse no ponto ou não.

"Pão que sai do forno passa a ser problema do dono da padaria, afinal é ele quem leva o lucro da venda. Eu aqui só sou pago para misturar farinha, amassar pão e tirar fornadas", pensava erroneamente o velho padeiro. (Talvez por pensar assim é que ficou um padeiro medíocre pelo resto da vida).

Desde que Jonas tomou a atitude de pensar e agir como se fosse o dono do negócio, passou a se inteirar melhor do dia-a-dia da padaria. Trabalhava de modo diferente dos outros, que já começavam a olhá-lo com certa desconfiança: "Lá vai o puxa saco do patrão." - diziam alguns. Jonas não dava bola para a maledicência dos colegas. Estava mesmo interessado em descobrir qual seria o tipo de pão que os clientes mais gostavam.

Para espanto e alegria do velho Joaquim, Jonas literalmente colocou a mão na massa, começando por prolongar o seu turno para poder ficar atrás do balcão ajudando as atendentes a vender os pães e aproveitando para fazer perguntas aos clientes. Eram questionamentos do tipo: – Se o produto do dia anterior esteve do agrado deles? Como havia ficado a consistência da massa, a textura, as cores e a fornada, o sabor e o gosto dos bolos estavam do agrado de todos?

Jonas era um perguntador simpático e a cada dia melhorava seus produtos. Todos percebiam isso. O velho Joaquim achava o procedimento do rapaz meio estranho Com mais de 40 anos de profissão nunca havia visto nenhum empregado querer ficar mais tempo no trabalho e ainda ficar perguntando aos fregueses se os pãezinhos estavam bons. Os padeiros simplesmente faziam o pão e iam embora, se o cliente gostasse ou não o problema não era deles.

Mas Jonas pensava diferente, tinha uma filosofia de vida e uma meta na cabeça – tratava seu emprego como se fôsse o dono do negócio, pois tinha absoluta certeza que um dia ainda iria ter o seu próprio estabelecimento.

Assim, passou a comparar o pão da Santa Izabel com o das outras padarias. Se um cliente dissesse, que o pão da panificadora tal era melhor, lá ia o Jonas na sua bicicleta comprar alguns para comparar. Se a comparação procedesse, ele achava um jeito de se aproximar do padeiro da concorrente, fazia amizade, perguntava e, às vezes, até acompanhava o mestre concorrente nas suas fornadas. Quem não gosta de um rapaz de boa vontade e perguntador para fazer companhia no trabalho noite adentro?

Aos poucos foi somando a maneira de fabricação de um e de outro padeiro e passou a ser reconhecido como o "especula", pois vivia fazendo pesquisas sobre a consistência das farinhas, o ponto das massas, os tipos de forno e tempos das fornadas. Chegou a criar até um pãozinho especial, só dele, que foi batizado de "pãozinho-especula".

Quando chegava um fornecedor na padaria, Jonas grudava no homem e ficava fazendo perguntas. E de tanto falar e trabalhar com pão tornou-se "doutor" no assunto.

Guardava enorme gratidão ao "seo" Joaquim que sempre lhe deu apoio e, lógico, tinha interesse que os produtos do seu estabelecimento fossem os melhores da cidade.

Um dia um cliente lhe abordou:- Jonas, já vi que você entende mesmo de pães, brioches e bolos. Observei que está sempre pesquisando massas diferentes e fica aí no balcão querendo saber se gostamos ou não dos produtos. Mas diga, por que você trabalha assim? O "seo" Joaquim paga a mais para você fazer isto?

A resposta veio de pronto: - Não ganho nada a mais para fazer o que faço e da maneira como faço, mas trabalhar pensando como se eu fosse mesmo o dono do negócio e não um mero empregado, me dá prazer e uma boa atitude perante a vida. A padaria do "seo" Joaquim, apesar de não ser a maior do bairro, é como se fosse uma boa vitrine para a minha carreira e para os produtos que faço. Tenho certeza que um dia essa maneira de trabalhar vai me recompensar. É claro que almejo ter o meu próprio negócio. Mas, enquanto isso não acontecer, tenho que ser muito responsável por aquilo que faço, assim não fica tão difícil trabalhar na frente dos fornos. Quero que cada cliente, ao pegar um dos nossos produtos, diga: o pão da Santa Izabel é sempre o melhor pão da cidade. A casa está sempre cheia, isto me enche de orgulho e um dia, com certeza, terei a minha própria panificadora.

"Seo" Joaquim que estava trabalhando num canto da loja, sem ser percebido pelos dois, pensou: - Vou segurar esse rapaz o máximo que puder. Se ele quiser ser dono de uma padaria que seja como meu sócio e não como concorrente.

Passado algum tempo, o "seo" Joaquim chamou Jonas e propôs-lhe parte do negócio. Ele passaria a ser sócio da Panificadora Santa Izabel, com contrato assinado e tudo. Sócio de verdade, com direito a comprar o restante da panificadora quando "seo" Joaquim se aposentasse.

Jonas agradeceu a confiança e viu que a sua atitude de "ser o dono do negócio" tinha dado certo. Passou a se dedicar com mais afinco ao trabalho e agora com mais força entre os outros empregados para colocar suas idéias de agradar aos clientes em prática.

Imediatamente começou a traçar um novo plano de vida, reforçando o "pé-de-meia" e gastando muito menos do que ganhava. Fazia economias porque, atento como era, estava de olho em um belo ponto comercial no bairro vizinho.

Passado algum tempo, quando viu que estava com o caixa pessoal reforçado e seguro dos investimentos que precisava, falou com o sócio-ex-patrão sobre as idéias de expansão. A confiança conquistada durante os últimos anos levou o velho padeiro a querer embarcar junto no novo negócio. Só que desta vez a situação se invertera: ele é que seria o sócio convidado do jovem empreendedor.

Terminados os planos do novo negócio e certos do que queriam, os dois foram em busca de mais parceiros para ajudar na empreitada, porque queriam fazer uma panificadora "das antigas com jeito de moderna".

Fornecedores de máquinas e equipamentos - a parte financeira mais pesada da empreitada - correram para lhes dar crédito e apoio. Um dos fornecedores chegou a dizer: fazemos questão de ajudá-los porque sempre estivemos de olho no trabalho do Jonas – que bom se todos os nossos clientes tivessem funcionários como ele. São profissionais assim que fazem a diferença no nosso setor. E eles terão sempre o nosso apoio.

Agora, Jonas tornara-se realmente dono do negócio. E como ele prosperava! No dia da inauguração trazia estampado no rosto a satisfação dos que gostam de sonhar, empreender e realizar, importando-se ou não se trabalham para alguém, porque sabem que estamos sempre trabalhando para nós mesmos.

Eloi Zanetti – assessor de marketing e comunicaçãoEloizanetti@terra.com.br

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